Motorista de aplicativo solto após 45 dias afirma ser inocente; Polícia diz que ele integra facção
Investigação policial aponta que homem dirigia veículo utilizado em homicídio em Fortaleza. Preso pela primeira vez, o motorista diz que passou por constrangimento grande
O motorista de aplicativo Francisco Wellington da Silva Freitas foi solto pela 2ª Vara do Júri de Fortaleza, da Justiça Estadual, cerca de 45 dias após ser preso por um homicídio, o qual ele garante que não cometeu. Entretanto, para a Polícia Civil do Ceará (PCCE), ele presta serviços de motorista para uma facção criminosa e tem conhecimento dos crimes.
O juiz revogou a prisão de Francisco Wellington no dia 5 de abril deste ano. Na decisão, o magistrado justifica que “a manutenção da prisão preventiva do requerente tornou-se desnecessária, vez que ele sequer está sendo processado nos autos do feito principal”.
O Ministério Público do Ceará (MPCE) se posicionou a favor da soltura, no pedido de liberdade, e justificou que não denunciou o motorista pelo homicídio por falta de indícios de participação do mesmo no crime.
Aos 36 anos, Wellington conheceu a prisão pela primeira vez. Um mês depois de ser solto, ele conta que ainda não se recuperou do cárcere: “Eu tenho muitos pensamentos na minha cabeça do que eu passei lá dentro. Uma pessoa ficar presa, o nome já está dizendo, fica presa direto, não tem nada. Ainda tenho umas imagens na cabeça, a saudade dos meus filhos aqui fora. Pedi muito à Deus para que eu provasse ao pessoal que eu não tive participação nisso aí. E, graças a Deus, deu certo”.
O pedido de liberdade, formulado pelo advogado de defesa Ítalo Ramos, alegou que Francisco Wellington estava em casa no dia do crime e que ele utiliza um veículo Fiat Mobi para trabalhar (enquanto o veículo utilizado no homicídio foi um Chevrolet Onix) e ainda rebateu a eficácia da prova policial baseada em reconhecimento fotográfico, feito por testemunhas.
“Atualmente temos visto nos jornais a divulgação de diversos erros judiciários relatando a prisão injusta de pessoas que foram reconhecidas somente por meio fotográfico, transformando a vida destes presos em um verdadeiro inferno, pois são pessoas inocentes acusadas de cometerem crimes, pior ainda ser acusado de um crime tão bárbaro como o de homicídio”, pontuou a defesa.
Wellington afirma que passou por um “constrangimento grande”:
A pessoa é cidadão, aí de uma hora para outra vai preso por uma coisa que não fez. É muito constrangedor. Eu não esperava essa prisão. É muito ruim o que eu passei, a questão da prisão, o local.
Prisão em operação contra homicidas
Francisco Wellington Freitas foi detido por força de mandado de prisão preventiva, na 3ª fase da Operação 5º Mandamento, deflagrada pelo Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), em 26 de fevereiro deste ano.
A investigação policial identificou que Wellington dirigia um veículo utilizado no assassinato de Lucas Soares da Costa, o ‘LK’, na Rua Amâncio Filomeno, bairro Cais do Porto, em Fortaleza, na tarde de 14 de outubro de 2020. A vítima segurava a filha, de apenas 6 meses, no colo, quando foi executada a tiros.
O crime tem relação com a guerra entre facções criminosas, segundo a Polícia Civil. Líderes de uma facção cearense teriam “rasgado a camisa” e mudado para uma facção carioca, naquela região. ‘LK’ estaria na dúvida se seguiria o mesmo rumo e ainda devia dinheiro pela compra de droga, o que levou ao crime, cometido por membros da facção cearense. Quatro pessoas foram denunciadas pelo homicídio, pelo MPCE, em 3 de março último.
Uma das acusadas pelo crime é Alessandra Gomes Dias de Souza, 20. Ela foi presa em flagrante pela Polícia Militar do Ceará (PMCE), no dia seguinte ao assassinato, na posse de três armas de fogo, munições e dinheiro em espécie. Junto dela, estavam Francisco Wellington e uma adolescente de 17 anos.
O motorista alegou na delegacia que estava trabalhando e que não tinha conhecimento dos ilícitos que estavam dentro ao automóvel, os quais Alessandra assumiu a propriedade. O homem, então, foi liberado.
A defesa de Wellington acredita que o fato de o cliente estar fazendo uma corrida para uma suposta criminosa tenha levado a Polícia Civil a confundi-lo com um integrante de uma facção criminosa.
“O drama que ele vive é o mesmo de diversos motoristas de aplicativos do Brasil. No momento que você recebe uma pessoa no seu carro, você não sabe quem é a pessoa, quais os antecedentes criminais. O drama que o Wellington viveu foi por ter feito uma corrida para pessoas que, em um momento anterior, teriam cometido um delito”, afirma o advogado Ítalo Ramos.
Questionada sobre a versão do suspeito, a Polícia Civil do Ceará mantém, em nota, a versão de “que as investigações relacionadas a um homicídio ocorrido em outubro de 2020 indicaram o envolvimento de Francisco Wellington da Silva Freitas como partícipe da ação criminosa”.
Segundo a Polícia Civil, o investigado foi ouvido, em dezembro de 2020, meses antes da prisão, na sede do DHPP, ainda durante as investigações do crime. O caso foi concluído e encaminhado ao Poder Judiciário, acrescenta.
Por fim, vale salientar que a prisão cautelar não colide com o princípio da presunção de inocência. Visto que a prisão cautelar é um instrumento processual disponível para a Polícia Judiciária, sob o crivo do Poder Judiciário, investigar. A representação pela prisão do indiciado foi feita com base nos indícios de autoria encontrados no curso das investigações. A ordem judicial foi deferida e cumprida dentro da lei.