Homem morre em presídio no Ceará, mas família e advogado só descobrem seis dias depois

A SAP alega que tentou contato com a família do interno várias vezes, mas as ligações não foram atendidas nem retornadas

Escrito por Messias Borges , messias.borges@svm.com.br
Detento morreu no dia 12 de junho de 2021 e familiares e advogado tiveram conhecimento apenas no dia 18 seguinte
Legenda: Detento morreu no dia 12 de junho de 2021 e familiares e advogado tiveram conhecimento apenas no dia 18 seguinte
Foto: Arquivo Diário

A família e o advogado de um homem só descobriram que ele morreu em um presídio em Aquiraz, na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), seis dias depois do fato. A Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) alega que tentou contato com a família várias vezes, por um número de telefone fornecido pelo interno, mas as ligações não foram atendidas nem retornadas.

O advogado Diego Henrique Lima do Nascimento contou que costuma ver o processo dos clientes quase todos os dias. Quando, na tarde da última sexta-feira (18), ele foi surpreendido com um ofício enviado pela direção do Centro de Triagem e Observação Criminológica (CTOC), no dia anterior (17), para comunicar à Justiça Estadual que o detento Osmar Bezerra de Oliveira, de 36 anos, havia morrido no último dia 12 de junho.

Tanto eu como a família só tomamos conhecimento no dia 18, porque eu olhei no processo dele e vi, no ofício da unidade prisional ao juiz, que esse meu cliente tinha falecido. Peguei meu carro e fui no presídio. Chegando lá, só souberam me informar que ele passou mal e veio a óbito.
Diego Henrique Lima do Nascimento
Advogado

Segundo o advogado, os agentes penitenciários justificaram que o interno não havia deixado nenhum contato pessoal. Mas ele estranha não terem entrado em contato ao menos com ele, defensor constituído nos processos criminais. "Um descaso", pontua.

Na versão da SAP, Osmar Bezerra sentiu indisposição e mal estar, na noite de 12 de junho e os policiais penais do CTOC o levaram ao posto de enfermagem do presídio, onde ele foi atendido. Enfermeiras iniciaram as técnicas de primeiros socorros no detento, à espera da ambulância do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu).

"A ambulância chegou após 25 minutos e os médicos detectaram o óbito do interno com comunicação imediata ao Ciops (Coordenadoria Integrada de Operações de Segurança) para a devida remoção do corpo para exames e laudos definitivos da Pefoce (Perícia Forense do Ceará)", informa a SAP, em nota.

Por fim, a SAP esclarece que tentou o contato reiteradas vezes no telefone fornecido pelo interno no dia de sua entrada no sistema, mas as ligações não foram atendidas e nem retornadas. Paralelo a isso, a unidade prisional fez atualização imediata sobre o óbito do interno nos autos do processo a qual ele responde junto ao Poder Judiciário.
Secretaria da Administração Penitenciária
Em nota

'Fiquei desesperada', diz esposa de Osmar

A morte e a falta de informação sobre a condição do marido revoltaram a dona de casa Ana Cristina Ribeiro, com quem Osmar teve um filho, que tem apenas 3 anos. A mulher teve acesso ao corpo do esposo somente no último sábado (19), na Perícia Forense do Ceará (Pefoce). "Fiquei desesperada. Não tenho força para superar isso. Eu vou falar para todo mundo isso. Espero que não aconteça uma injustiça dessas com outra pessoa".

Osmar respondia a um crime de roubo ocorrido em 2006, no regime semiaberto, mas deixou de cumprir as obrigações processuais, segundo o advogado Diego Henrique. Então, foi aberto um mandado de prisão contra ele, que terminou cumprido no dia 25 de maio deste ano, em uma abordagem policial no bairro Antônio Bezerra, em Fortaleza. De acordo com o advogado e a esposa, Osmar não cometeu novos crimes. 

Ele era uma pessoa trabalhadora, honesta. Ele errou há muito tempo, mas se reabilitou, vivia para trabalhar e para a família. Trabalhava como mestre de obra. Era pastor (evangélico) e pregava justamente a palavra da 'nova criatura'.
Ana Cristina Ribeiro
Dona de casa

Defesa tentou extinção da punibilidade

O advogado Diego Henrique Lima do Nascimento pediu a extinção da punibilidade do crime cometido por Osmar Bezerra de Oliveira, em 24 de julho de 2020, na Justiça Estadual. Quase 13 meses depois, o pedido não foi julgado pela 1ª Vara de Execuções Penais de Fortaleza. "A morte dele poderia ter sido evitada", afirma o defensor.

Diego Henrique também ingressou com pedido de habeas corpus no Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE). O magistrado não concedeu a ordem, mas determinou que o juiz da Execução Penal julgasse o pedido de extinção de punibilidade, no dia 3 de março deste ano.

[Atualização: 16h05 de 22/06/2021]: O TJCE enviou nota depois da publicação da matéria. Confira a nota na íntegra:

Osmar Bezerra de Oliveira foi condenado em três processos criminais que somaram, ao todo,12 anos de reclusão.  Em 11/01/2008 foi transferido para a Colônia do Amanarí, tendo se evadido em 20/01/2008, quando havia cumprido 3 anos, 4 meses e 19 dias de sua pena, restando cumprir 08 anos, 7 meses e 11 dias de reclusão. Por decisão do Juízo da 1ª Vara de Execuções Penais de Fortaleza o regime dele foi regredido para fechado e, com isso, expedido mandado de prisão em 17/05/2017, com validade até 20/01/2024, data da prescrição da pena que seria em 16 anos.

O pedido da defesa dele seguiu  procedimento na unidade, uma vez que são necessárias, muitas vezes, diversas movimentações antes da análise do mérito pelo magistrado que, inclusive, logo no dia  seguinte, expediu despacho para parecer do Mistério Público (MP). Neste caso específico, houve ainda, por exemplo, requerimento de pesquisa nos sistemas Sistema de Consulta de Antecedentes Criminais (CANCUN) e Banco Nacional de Mandados de Prisão (BNMP) por parte do MP; juntadas de informações e antecedentes criminais; entrega de documentos e vistas ao Órgão Ministerial.

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