Governo recua na reforma da Previdência e espera votos da oposição

Apesar da mudança apresentada pelo relator ao texto da Previdência, o Planalto continua sem a garantia de que terá votos suficientes para aprovar a matéria na Câmara. A oposição segue criticando a proposta do Governo

Escrito por Wagner Mendes ,
Legenda: O relator da reforma começou a leitura do parecer às 12h59 e concluiu às 15h36
Foto: Foto: Agência Câmara

Fragilizado pela ausência de uma base parlamentar sólida no Congresso Nacional, o Governo Jair Bolsonaro (PSL) recuou e retirou trechos que integravam o texto original da reforma da Previdência. O relator da proposta, deputado federal Samuel Moreira (PSDB-SP), apresentou ontem na Comissão Especial, na Câmara dos Deputados, uma nova versão das intenções do Palácio do Planalto.

O relatório começará a ser debatido na comissão especial na próxima terça-feira (18). A data de votação na comissão ainda não está definida. A edição de parte do texto teve a contribuição direta dos governadores do Nordeste, que na última terça (11) se reuniram com integrantes do Planalto, em Brasília, para discutir a retirada de pontos específicos. A articulação foi costurada pelo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o presidente da Comissão Especial, Marcelo Ramos (PL-AM), além do relator.

Entre os pontos mais reivindicados, se destacaram a manutenção nas regras do Benefício de Prestação Continuada (BPC) para idosos pobres e ajustes no texto da aposentadoria rural. O Governo buscou diálogo com a região no intuito de receber em votos o apoio necessário para aprovar a reforma no Congresso.

Professor da Universidade de Fortaleza (Unifor), o cientista político Clésio Arruda acredita que as mudanças no texto "aumentam significativamente" a probabilidade da aprovação da reforma, já que a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) pode contar com parte dos votos da oposição.

O pesquisador ressalta que os recuos do Governo já eram esperados, considerando a pouca força política do Palácio do Planalto nas casas legislativas e a necessidade de acenar ao mercado com as reformas. "Essa reforma, logo que o Governo tomou posse, se apresentou como carro-chefe. Todas as fichas do Governo foram colocadas ali. Por isso, aprovar, mesmo com ajustes, é fundamental politicamente para o Governo", avalia.

Parlamento

Apesar da edição em parte do texto, algumas bancadas continuam contrárias à matéria. Líder do PDT na Câmara, o deputado André Figueiredo comemorou o fato de a oposição conseguir alterar pontos que prejudicariam "cruelmente" o trabalhador, como o Benefício de Prestação Continuada (BPC), a aposentadoria rural e o magistério.

André manteve, no entanto, críticas às regras de transição. "Iremos discutir exaustivamente esse relatório. Alguns pontos polêmicos foram retirados, mas continua com uma regra de transição muito dura para os beneficiários do Regime Geral".

O deputado José Guimarães (PT) disse que a versão apresentada ontem "não altera em nada a posição" da bancada. Ele não acredita que o "acordo" com os governadores reverta votos para a matéria. "Os governadores topavam defender a PEC se incluíssem os servidores dos estados, mas retiraram. Passaram o dia reunidos com governadores, assumiram que iam incluir os estados e não fizeram".

O Governo chegou a sugerir que os deputados apresentassem destaques para incluir o tema após a aprovação de mérito da proposta. A oposição recusou. "Nem morto que vamos apresentar o destaque", encerrou Guimarães.

Na avaliação do deputado Júnior Mano (PL), a reforma é importante para o crescimento econômico do País, mas ele entende que as mudanças precisam ser viáveis para todos. "Estou analisando os textos minuciosamente para que a reforma possa ser a mais justa e igualitária possível", disse.

O deputado Heitor Freire (PSL), embora tenha prometido estudar a edição do texto, afirmou que seguirá a orientação do Governo. "Eu seguirei a recomendação do Executivo, mas vamos seguir para aprovação da melhor forma possível. A reforma é uma solução para tirar o Brasil da crise econômica e reequilibrar as contas públicas", sustentou.

Retirada prolonga o desequilíbrio fiscal

A exclusão de estados e municípios da proposta da reforma da Previdência é vista por economistas como uma “bomba de efeito retardado”. “Os governadores e prefeitos vão ficar com essa bomba no colo e terão que fazer suas próprias reformas, um desgaste que poderia ser evitado se fizessem agora”, explica o economista Ricardo Eleutério, vice-presidente do Conselho Regional de Economia do Ceará (Corecon-CE). 

Além disso, a economia nacional pode continuar a sofrer com os efeitos do desequilíbrio dos caixas dos estados e municípios, conforme aponta o economista e consultor internacional Alcântara Macêdo, uma vez que faltariam recursos disponíveis para a realização de investimentos públicos.

Ele alerta ainda que a contínua redução da economia prevista com a reforma, que caiu de R$ 1,2 trilhão para R$ 915 bilhões em dez anos, pode pôr em risco a sustentabilidade econômica. “Se baixar mais, daqui a três ou quatro anos vamos ter que fazer outra reforma, com ainda mais desgaste”, destaca Macêdo.

Por outro lado, Eleutério avalia que já se esperava a possibilidade de se atingir um valor menor por conta das negociações da matéria. “É melhor alguma reforma do que nenhuma. Chegamos ao ponto de que a reforma se tornou inevitável. Depois dos juros da dívida pública, a Previdência é o que mais compromete o nosso Orçamento”.

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