Queda de braço na saída de Evandro Leitão do PDT é prova de que a crise eleitoral de 2022 não acabou

Para além do "não acabou", fica a dúvida sobre até onde ela vai

Legenda: Evandro Leitão, ao centro, no palanque de comemoração pela vitória de Elmano de Freitas em primeiro turno, em 2022
Foto: Thiago Gadelha

Em março de 2022, quando o prefeito de Fortaleza, José Sarto (PDT), foi às redes sociais defender o nome do ex-prefeito Roberto Cláudio (PDT) como candidato do partido ao Governo do Ceará, certamente não imaginava que a crise que se tornava pública ali se estenderia para além dos meses que antecederam o início da campanha daquele ano. Quase um ano e meio depois, o PDT segue sofrendo desgaste público, numa disputa na qual, até agora, não somou vitórias.

O episódio recente é a tentativa de desfiliação do presidente da Assembleia Legislativa, Evandro Leitão, do partido. Em 2022, Evandro foi um dos quatro nomes entre os pré-candidatos do PDT ao Governo. Deixou a disputa em julho, diante do acirramento entre os nomes de Roberto Cláudio e da então governadora, Izolda Cela. 

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Os dois nomes racharam o PDT. De um lado, com Izolda Cela, estava ampla base governista, inclusive Evandro, além de apoiadores externos como o ex-governador Camilo Santana (PT) e o senador Cid Gomes (PDT) - que só meses depois tornou público o apoio a Izolda, afirmado na época através de aliados, como o irmão prefeito de Sobral, Ivo Gomes (PDT). 

Com Roberto Cláudio, estavam o presidente estadual do PDT, André Figueiredo, o presidente nacional, Carlos Lupi, o então pré-candidato a presidente, Ciro Gomes, o prefeito Sarto e a maior parte do Diretório Estadual, que deu vitória a Roberto Cláudio em uma inédita votação de prévias no partido.

Izolda deixou o PDT. Roberto Cláudio terminou em terceiro lugar na disputa pelo Governo. E o nome da vez é o de Evandro Leitão. Os lados, no entanto, continuam os mesmos. 

Evandro saiu desgastado do processo eleitoral. Não fez campanha para Roberto Cláudio e Ciro Gomes. Não recebeu recursos do partido. E o desgaste foi evidente na comemoração do pedetista no palanque da vitória de Elmano. 'Não pude fazer campanha para o Elmano, mas torci', disse Evandro, em entrevista ao PontoPoder, acrescentando que pediu desculpas a Roberto Cláudio pela efusividade no palanque.

Não parece que funcionou. Nesta quarta-feira (30), Roberto Cláudio foi às redes sociais repercutir a saída de Evandro do partido, a qual chamou de "teatro montado"."Humildade, verdade e 'caldo de galinha' fazem bem à vida, à convivência sadia e à boa política", disse o ex-prefeito. Evandro não deixou barato e revidou: "Lamento muito que o ex-prefeito Roberto Cláudio ainda não tenha aceitado o resultado democrático da última eleição". "Me ataca gratuitamente. Triste comportamento".

Camilo Santana e Evandro Leitão em evento na última segunda-feira (28), em Fortaleza
Legenda: Camilo Santana e Evandro Leitão em evento na última segunda-feira (28), em Fortaleza
Foto: Fabiane de Paula

A ala governista, hoje no entorno do governador Elmano de Freitas (PT) e de Camilo Santana, quer Evandro como candidato à Prefeitura de Fortaleza. A ala derrotada no PDT em 2022 vê o mesmo grupo como algozes nessa saída de Evandro.

Não há acordo com o grupo governista do Estado. Desde o início do ano, algumas figuras no PDT tentam uma reaproximação entre PT e PDT. Cid Gomes, presidente estadual interino desde julho, é o principal entusiasta do lado pedetista. Até poucas semanas, parecia possível vislumbrar algum acordo, talvez a permanência de Evandro, a sugestão de prévias internas para 2024... Foi tudo cortina de fumaça.

Na presidência, Cid colocou para votação a carta de anuência para Evandro deixar o partido. Foi aprovada. Agora, a Executiva Nacional tenta derrotar os governistas na Justiça, ainda sem sucesso.

"É uma perseguição desde o ano passado", diz Evandro. André Figueiredo, presidente nacional interino, nega. “A quem interessa tudo isso que ocorre no nosso PDT?”, questiona o deputado federal.

A saída de Evandro Leitão do PDT, neste agosto de 2023, bem poderia ser o capítulo final da crise eleitoral de 2022. O desgaste político que se segue publicamente no PDT, com o PT no entorno, é ainda desdobramento da crise interna que o partido vive há mais de um ano. O racha da então base governista no Ceará não se encerrou na disputa pelo Governo do Estado. Pelo contrário, já tem conexão direta com a disputa de 2024 pela Prefeitura de Fortaleza. 

A desfiliação de Evandro do PDT, no entanto, pode encerrar a sensação de déjà-vu na política local e dar ares novos, de fato, a uma disputa eleitoral que é outra. 

É preciso virar essa página e deixar cada lado com os seus. O PDT chegou a ter Prefeitura de Fortaleza e Governo do Estado. Hoje, tem a Prefeitura, mas com um entorno que se prepara com força para tentar derrotá-lo lá. Sarto, que, despretensiosamente, quem sabe, fez o primeiro movimento público da crise, tem estado recluso na confusão atual, mas isso não significa que os prejuízos não sigam respingando sobre ele. 

"É uma das maiores frustrações ao longo da minha vida toda", já chegou a dizer Sarto.

Evandro é pré-candidato declarado, ainda que não se saiba se por PT, por PSB ou por outra sigla. Afinal, se não o fosse, enfrentaria tamanho desgaste? Seja como for, o eleitorado de 2024 não merece o peso das mágoas internas e dos desgastes pessoais que a política gera. O racha de 2022 teve seus prejuízos para o debate público da campanha eleitoral no ano passado. Extrapola o razoável que os partidos e suas lideranças permitam que isso se estenda às discussões do próximo ano.