Jaguaretama: a terra do medo

Escrito por Redação ,
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A menos de 300 quilômetros de Fortaleza, um Município do Vale do Jaguaribe tornou-se refém dos pistoleiros

Um assassinato ocorrido na tarde do último domingo, na localidade de Aroeiras, zona rural de Jaguaretama, deu seqüência a um ‘rosário’ de crimes que vem desafiando as autoridades policiais e da Justiça ao longo dos últimos anos, além de deixar a população na condição de permanente refém da violência e do medo. O juiz de Direito, o promotor de Justiça e o comandante do destacamento policial militar da cidade estão jurados de morte pelos criminosos.

A impunidade de que desfruta um grupo de assassinos provocou um rastro de mortes em Jaguaretama (a 284 quilômetros de Fortaleza), e transformou o Município num dos mais violentos do Estado.

Eram 16 horas de domingo passado quando um homem, identificado por Inácio Edmilson Lemos Paulo, 24, foi fuzilado por pistoleiros em uma motocicleta. A vítima recebeu cinco tiros de pistola, a queima-roupa, sem chances de defesa. A Polícia investiga o crime, mas já sabe que foi mais uma ‘obra’ dos pistoleiros que atuam ali.

Fuzilamentos

A seqüência de assassinatos em Jaguaretama remonta ao ano de 1996, quando um dos matadores de aluguel mais temidos naquela região, deu início à sua ‘carreira’ criminosa. Lucivano Saraiva Diógenes, o ‘Gordo’, matou Francisco de Assis Peixoto, o ‘Assis Cariri’, simplesmente pelo fato de um cão latir sempre que ‘Gordo’ passava em frente à casa da vítima.

Daí em diante, ‘Gordo’ e seus irmãos, que passaram a ser conhecidos na região como ‘os filhos de Senhorzinho’, iniciaram a longa e, ao que parece, interminável, onda de mortes em Jaguaretama e região circunvizinha. ‘Senhorzinho’, que, na verdade, chamava-se Manoel Diógenes, também foi executado em Jaguaretama.

Segundo relatórios da Polícia, nos últimos 12 anos, pelo menos, 30 pessoas foram assassinadas. Depois de ser preso por várias vezes, sempre bem armado, ‘Gordo’ e um de seus irmãos, Ricardo Sérgio Saraiva Diógenes, foram detidos e trazidos para Fortaleza. Meses depois, de forma ainda não explicada, receberam autorização para serem transferidos de volta ao Interior. Foram parar na cadeia pública de Quixadá (a 158Km da Capital), onde acabaram fugindo, em 2006.

Desde então, a população de Jaguaretama voltou a respirar um clima de pavor.

Em fevereiro do ano passado, em pleno começo da manhã de sexta-feira de Carnaval, os filhos de ‘Senhorzinho’ cometeram mais um de seus crimes, fuzilando a comerciante e fazendeira Ana Mônica Saldanha Barreto. Antes, a família de Mônica já tinha sido, praticamente dizimada pelos assassinos. O pai dela, agropecuarista Jeová Barreto; e o irmão, Jairo Barreto Sobrinho, haviam sido também assassinados covardemente pelo bando.

No rol dos crimes que assustaram Jaguaretama nos últimos anos, uma ‘baixa’ foi registrada entre os ‘filhos de Senhorzinho’. Aconteceu no dia 15 de julho de 2005, quando o pistoleiro Luciano Saraiva Diógenes - que comandava a quadrilha de irmãos e era tido como o terror da região - foi morto, a tiros de escopeta na cabeça, quando dormia em casa, em pleno Centro de Jaguaretama.

A morte de Luciano não arrefeceu os ânimos na região. Pelo contrário, agora, sob o comando de Lucivano, o ‘Gordo’; e de seu irmão Ricardo, os filhos de ‘Senhorzinho’ juntaram-se a outros bandidos da região e deram prosseguimento aos assassinatos cruéis.

Para o delegado-regional de Polícia Civil de Jaguaribe, Edmar Beserra Granja, a região jaguaribana só terá tranqüilidade quando a Polícia por as mãos na quadrilha e, em especial, em ‘Gordo’ e seu irmão, Ricardo Saraiva Diógenes.

Caçada

“Estamos trabalhando diuturnamente para chegarmos a estes bandidos, mas há um fator complicador em tudo isso. As pessoas têm medo de denunciar onde eles estão. Têm medo de serem mortas, e eles matam mesmo”, disse Granja.

Além de ‘Gordo’ e Ricardo Diógenes, outros irmãos deles também estão sendo procurados pela Polícia. Everton Saraiva Diógenes, Regianilson Saraiva Diógenes, o ‘Melado’, e Luiz Sérgio Saraiva Diógenes. Este último, conforme os levantamentos policiais, estaria refugiado em São Paulo, mas também tem mandado de prisão, em aberto, no Ceará. Ao grupo não são atribuídos somente crimes de pistolagens ou de ‘acerto de contas’. “Também estão envolvidos em assaltos na região”, diz o delegado.

Dois integrantes da quadrilha morreram nos últimos dias. Um deles era muito temido na região. Chamava-se Benaías Alves de Brito, o ‘Véio de Judite’, executado pelos comparsas, há uma semana, em Cipoaba, Morada Nova. Também morreu, em tiroteio com a Polícia, em Jaguaretama, o bandido Inácio de Morais Paulo, o ‘Cego’.

SEM LIMITES
Autoridades estão ameaçadas de morte

Na terra onde os criminosos implantaram um regime de mortes, medo e silêncio, nem mesmo as ´autoridades constituídas´ escapam das ameaças do bando. “Eles matam porque gostam de matar”, afirma o sargento PM Herbênio Almeida Bezerra, que está à frente do destacamento da Polícia Militar de Jaguaretama e acumula a chefia da unidade da Polícia Civil local.

Assim como promotor de Justiça e o próprio Juiz da Comarca, o sargento Herbênio é um dos nomes da ‘lista negra’ dos pistoleiros, ou seja, um dos ‘marcados’ para morrer. Ele conta que Jaguaretama tornou-se um dos Municípios mais violentos do Ceará. “Aqui é assim. Tem tempo que fica calmo demais, não registramos nem empurrão. Mas, logo, eles (os pistoleiros) voltam a matar.”

Assalto

Também foi em Jaguaretama que a Polícia registrou um violento assalto a banco no dia 27 de novembro do ano passado, quando a cidade foi invadida por um grupo criminoso oriundo da Capital. A quadrilha portava armas de grosso calibre, entre elas, duas metralhadoras, além de pistolas. Invadiu a agência do Banco do Brasil e roubou R$ 17 mil. Mas, mesmo com todas as deficiências de efetivo e armamento, o destacamento policial, sob o comando de Herbênio, travou um cerrado tiroteio com os ladrões em pleno centro comercial e, depois, numa perseguição pela estrada em direção ao vizinho Município de Solonópole, onde houve novo tiroteio. Nas horas seguintes, a Polícia cercou a área com reforços, prendeu todos os assaltantes, apreendeu as armas deles e recuperou o dinheiro do BB.

No dia 18 de dezembro, mais um assassinato. Antônio Rufino Neto, um ancião de 73 anos, foi fuzilado por dois homens após ter denunciado à Polícia o furto de seu gado e conseguido recuperar parte dele. Pela sua ‘ousadia’ em denunciar o caso à Polícia, pagou com a vida. Os pistoleiros Ricardo e ‘Gordo’ (irmãos), são os suspeitos do brutal assassinato.

Um mês depois, em pleno Centro de Jaguaretama, uma nova execução, e desta vez, dupla. Dois pistoleiros em uma moto preta e usando capacetes também pretos (a característica comum em todos os assassinatos), fuzilaram Francisco Antônio Moura, o ‘Antônio de Isaías’, e Francisco Gomes de Oliveira. O primeiro tinha antecedentes criminais. O segundo teria morrido inocente. ‘Gordo’ e um parceiro adolescente (tido como um dos matadores do bando) são os principais suspeitos da Polícia, que investiga o caso sob a hipótese de um ‘acerto de contas’.

Seis dias depois do duplo homicídio, outro crime de morte na cidade: Antônio de Oliveira Silva, o ‘Boró’, foi eliminado dentro de casa.

TEMIDO
Adolescente juntou-se aos bandidos e virou matador cruel

Um menor de 17 anos (que completará 18, em julho próximo) é apontado pela Polícia como um dos mais perigosos integrantes da quadrilha chefiada pelo bandido Lucivano Saraiva Diógenes, o ‘Gordo’. Seu nome não pode ser citado na matéria. Mas, segundo as autoridades, ele é o responsável por, pelo menos, seis assassinatos ocorridos nos últimos meses em Jaguaretama.

O adolescente chegou a ser detido, no ano passado, mas acabou sendo novamente colocado em liberdade. Ao lado dos pistoleiros adultos, tornou-se um dos mais temidos na região. “Ele gosta de matar e não esconde isso de ninguém”, diz o comandante do destacamento da PM de Jaguaretama.

Secreto

Um relatório historiando a seqüência de assassinatos e outros crimes naquela região do Interior cearense já está nas mãos das autoridades cearenses e o Diário do Nordeste teve acesso, exclusivo, a ao documento. Cerca de 30 mortes estão detalhadas.

Fernando Ribeiro
Editor

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