Eleições no Ceará: construir pontes e não muros
Em referência à necessidade de buscarmos nos relacionar de forma harmoniosa, o Papa Francisco tem reiterado que a humanidade precisa derrubar muros e, em seu lugar, construir pontes. Trata-se de um ensinamento valiosíssimo não apenas para a vida, mas também de grande serventia para as eleições que se avizinham.
A nível nacional, vemos um país dividido e as hostilidades deixando o âmbito das discussões de ideias e passando a criar desavenças, conflitos e, ao final, até mesmo ódio entre as pessoas. Um país dividido e cheio de ódio certamente não nos inspira ou dá muitas esperanças de dias melhores. Contudo, penso que um outro cenário onde essas palavras se encaixam muito bem é a presente eleição para governador do Ceará, nesse caso, não como uma lição moral, mas, de fato, como uma estratégia obrigatória para ganhar a eleição.
Nos últimos dias, tivemos a divulgação das primeiras pesquisas de intenção de voto para governador após a definição das candidaturas, quadro que mudou consideravelmente com o rompimento da aliança PDT-PT que governou o estado nos últimos anos. Com a nova configuração de forças e com dados já confirmados pelas primeiras pesquisas, devemos ter três candidaturas competitivas: Capitão Wagner do lado oposicionista e as duas candidaturas geradas no ventre do grupo governista, Elmano de Freitas e Roberto Cláudio.
Fato interessante é que as duas pesquisas divulgadas recentemente testaram a intenção de voto para governador de maneiras diferentes (os questionários na íntegra podem ser acessados no site do TSE, onde são registradas as informações das pesquisas eleitorais divulgadas), o que nos permite uma maior riqueza de dados para analisar.
Num primeiro cenário, a pesquisa Ipespe apresentou aos eleitores apenas os nomes dos candidatos, sem referência a seus partidos ou apoiadores. Nesse cenário, vemos a liderança de Wagner com 38% das intenções de voto, seguido de Roberto Cláudio com 28% e Elmano com 13%. Já na pesquisa Real Time, no primeiro cenário investigado, além dos nomes dos candidatos, apresentou-se também o partido de cada um, quando podemos perceber já uma pequena diferença: Wagner tem 35%, Roberto Cláudio 26% e Elmano 20%.
É bastante provável que a menção de que Elmano de Freitas, um nome pouco conhecido, é um candidato do PT já o faça ganhar votos, enquanto a menção dos partidos de Wagner e Roberto Cláudio não mude suas condições. No frigir dos ovos, o PT é o único partido no Brasil que possui uma imagem, boa para alguns e ruim para outros. Partidos como União Brasil e PDT são relevantes no cenário político, mas praticamente desconhecidos do eleitorado em geral.
A pesquisa Real Time trouxe ainda um terceiro cenário, onde, aos nomes dos candidatos, são indicados também os seus principais apoiadores: Wagner com apoio de Bolsonaro, Roberto Cláudio com Ciro Gomes e Elmano com Lula. Nesse caso, temos uma mudança ainda mais significativa, onde Capitão Wagner tem 34%, Elmano 30% e Roberto Cláudio 25%. Considerando a margem de erro, Wagner pode oscilar entre 37 e 31, Elmano entre 33 e 27 e Roberto entre 28 e 22, assim, neste último cenário, temos um empate técnico entre Wagner e Elmano e também entre Elmano e Roberto Cláudio.
Importante reiterar que, embora os resultados das duas pesquisas sejam muito diferentes, ambas estão metodologicamente corretas, apenas acontece que abordaram uma mesma questão com perguntas diferentes e, em cada uma delas, são apresentadas ao eleitor informações em menor grau (somente os nomes dos candidatos) ou maior grau (seus partidos e apoiadores).
Ainda que a pesquisa retrate apenas o momento atual, quando muito da intenção de voto deriva do nível de conhecimento dos candidatos, e tenhamos uma campanha pela frente, é difícil imaginar um cenário onde qualquer um dos três candidatos, que hoje representam fortes grupos políticos do Ceará, tenha um desempenho muito abaixo do que vemos hoje, assim, há forte tendência de um segundo turno no estado.
Voltando à questão dos conflitos na política, numa campanha eleitoral, onde o trabalho de convencimento do eleitor passa por apontar as falhas dos adversários, a linha entre a crítica ao candidato enquanto homem público e os ataques pessoais é muito tênue e será um dos grandes desafios não apenas para os candidatos, mas também para seus estrategistas de campanha e, principalmente, para o seu grupo, o exército de políticos e apoiadores que os defendem nas tribunas, palanques e nas discussões presenciais e virtuais.
Atacar o adversário é necessário, mas ao mesmo tempo perigoso. Necessário porque eleição é uma comparação, uma escolha entre um ou outro e, para se diferenciar, nem sempre basta apontar suas qualidades, é preciso fazer com que o eleitor enxergue também o defeito do adversário. Perigoso porque, dependendo do conteúdo do ataque, ofende-se não só o candidato, mas também seu eleitor.
Analisando os dados que temos hoje, teremos 2º turno no Ceará e esse 2º turno deverá ser decidido pelos eleitores do candidato que ficar em 3º lugar. É aí que se torna imperativa a lição dada pelo Papa Francisco e muito bem traduzida para o mundo político nas palavras de Ulysses Guimarães: tenha adversários, mas jamais faça inimigos e nunca esteja tão distante que amanhã não possa se reaproximar.
Pedro Barbosa é cientista político e diretor técnico do Instituto Opnus de Pesquisa