Esperamos dias em que não celebraremos mais "primeiras" mulheres, porque será comum elas estarem onde quiserem, mas, até lá, faremos alarde por cada novo espaço conquistado
Em mais de 130 anos de governos republicanos no Ceará, só agora, 2 de abril de 2022, uma mulher tem seu retrato no panteão de chefes do Executivo cearense: Maria Izolda Cela de Arruda Coelho, de 61 anos. Quantas gerações de mulheres no Estado viveram e morreram sem ter a chance de se verem representadas nesse cargo?
Izolda chega a ele no segundo mandato como vice-governadora de uma gestão com boa aprovação no Estado, atuando em áreas estratégicas, ao longo dos últimos sete anos, como a segurança e, principal e especialmente, a educação. A nova governadora do Ceará é uma mulher que fala com uma categoria historicamente reconhecida sob domínio delas: a do ensino.
O papel de educadora se estendeu como professora, como mãe, como avó, como secretária da Educação, como vice-governadora e, agora, como governadora. Ser e fazer mudança na política é também uma forma de educação. É um caminho ao longo do qual se ensina sobre respeito, sobre igualdade de direitos e sobre confiança.
Na política, temos baixos índices de representatividade, a única presidente eleita, Dilma Rousseff (PT), sofreu um impeachment num cenário político caótico, dominado por homens. Apenas 13 estados registram mulheres governadoras em sua história. A capital cearense, Fortaleza, teve, até hoje, apenas duas prefeitas: Maria Luiza Fontenele e Luizianne Lins. Tivemos duas senadoras em mais de um século no Ceará. Temos 16 câmaras municipais sem nenhuma mulher eleita no Ceará. Dos 184 municípios, só 30 são geridos por mulheres.
A maioria das mulheres memoráveis que foram pioneiras no Executivo, no Legislativo e no Judiciário cearense não tiveram a oportunidade de ter a convicção da legitimidade do espaço que ocupavam, independentemente da importância do caminhos que abriam, da audácia que demonstravam.
Elas foram constantemente diminuídas, ignoradas e, em alguns casos, quase excluídas da história política. Muitas ainda são, e não só na política, mas principalmente nela.
Essa confiança que uma professora, que uma mulher governadora inspira não é algo que as mulheres têm a chance de experimentar com frequência. Como poderíamos? Vivemos num país com altos índices de feminicídio, de abusos sexuais, de falta de acesso das mulheres a direitos básicos, como saúde, segurança e educação, principalmente quando se trata de uma mulher pobre e negra.
Uma mulher governadora mostra às meninas de hoje que, sim, há obstáculos que terão de enfrentar, como também que esses empecilhos não são insuperáveis. É possível não só encontrar um jeito de vencê-los como também de removê-los para aquelas que virão depois.
Que a primeira chefe do Executivo inspire as crianças, as adolescentes, as jovens, as adultas, as idosas, a lembrar, todos os dias, que temos o direito de ocupar o espaço que quisermos e sermos felizes com aquilos que escolher ser e fazer.
Nessas primeiras horas com Izolda governadora do Ceará, ainda sem entrarmos na seara das cobranças das promessas de governo (faz parte), tudo o que podemos sentir é esperança e entusiasmo pelo Ceará que pode continuar sendo construído para mulheres e por mulheres. Um Ceará onde gênero não defina o tamanho dos seus sonhos nem até onde você pode ir.