Quem sabe mais? A guerra de vaidades no ambiente corporativo

Escrito por
Delania Santos ds@delaniasantos.com
Legenda: As pessoas se sentem ameaçadas, pois não têm certeza sobre como serão avaliadas e recompensadas.
Foto: Shutterstock

No universo corporativo, onde metas, resultados e reconhecimento coexistem, há uma força silenciosa, mas poderosa, que pode minar o progresso coletivo: a guerra de vaidades.

Presentes nos bastidores ou escancaradas nos corredores, essas disputas muitas vezes determinam mais o destino de uma empresa do que os indicadores financeiros.

A pergunta de um milhão de dólares é: por que poucas empresas se preocupam com isso? 

O início de uma guerra de vaidades ocorre geralmente de maneira sutil. À medida que indivíduos buscam reconhecimento por suas ideias, projetos ou cargos, o desejo saudável por destaque pode se transformar em obstinação por protagonismo.

Promove-se, então, um ambiente onde a valorização do “eu” suplanta a visão do “nós”. Não se trata de condenar metas ou a busca por reconhecimento, ambos são legítimos. O alerta aqui é sobre o nível tóxico que essa corrida pode atingir, deixando marcas na saúde mental das pessoas, na marca empregadora e nos números da empresa. 

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Qual a medida? Até quanto vale a pena? E como reter talentos em ambientes assim? Todas estas perguntas podem ser respondidas entendendo como essa dinâmica costuma aflorar. Vamos entender? 

Quando há pouca clareza sobre papéis e responsabilidades, disputas por território e reconhecimento se tornam frequentes. As pessoas se sentem ameaçadas, pois não têm certeza sobre como serão avaliadas e recompensadas.

O sistema de recompensas, por sua vez, também pode estimular ambientes assim quando valoriza mais o individual do que o coletivo. Prêmios e promoções baseados apenas em entregas isoladas, além de incentivar a competição interna, pode prejudicar a retenção de talentos. 

Dentre outros estimuladores, encontramos a falta de comunicação transparente! Ruídos e omissões criam terreno fértil para interpretações distorcidas e rivalidades pessoais. Sabe aquela máxima que orienta: elogie em público e corrija em particular?

Pois é! A primeira parte, depende! Quando as regras e os critérios de avaliação são claros, o elogio pode ser em público. Quando não, pode parecer favoritismo ou qualquer outra coisa. Por fim, lideranças que cultivam favoritismos estimulam a formação de “panelinhas” que acabam endossando disputas veladas.

Guerra de vaidades impacta negativamente a empresa? 

Sim, claro! Quando a vaidade ocupa o centro do palco, todo o ambiente de trabalho é impactado. Os reflexos se manifestam tanto nos resultados concretos quanto no clima subjetivo da organização.

Funções importantes acabam invisibilizadas quando não recebem o devido reconhecimento ou recompensa. Em muitos casos, a justificativa para essa omissão é a suposta dificuldade de estabelecer metas para determinados setores.

Como resultado, profissionais dessas áreas ficam à margem de premiações e bonificações, o que compromete a motivação e o senso de justiça interna.

Dentre os impactos gerados, destacamos: 

  • Fragmentação das equipes: a colaboração dá lugar à competição desmedida, enfraquecendo projetos que dependem da cooperação. Alguns setores ficam em pé de guerra, medindo forças e priorizando interesses pessoais em detrimento do que realmente importa. 
  • Desperdício de energia: o foco se desloca das metas do negócio para a autopromoção. Tempo e criatividade são consumidos em disputas de ego, não em soluções inovadoras. Além disso, cria-se a cultura de que o resultado a ‘qualquer custo’ é o mais importante e as pessoas começam a almejar estar ‘nesse lugar de destaque’. O exemplo disseminado, neste caso, é o pior possível. 
  • Perda de talentos: profissionais competentes, mas avessos a disputas fúteis, buscam novos horizontes, provocando rotatividade e perda de conhecimento. Saem levando parte da vantagem competitiva da empresa, visto que selecionar profissionais qualificados está cada vez mais difícil. 
  • Decisões prejudicadas: a vaidade pode levar a escolhas fundamentadas em interesses pessoais, não no que é melhor para a organização. Pessoas vaidosas podem inclusive prejudicar profissionais que representem uma ameaça ao seu ‘posto de destaque.’
  • Queda da reputação: conflitos públicos e comportamentos vaidosos podem transbordar para o mercado, manchando a imagem da empresa perante clientes, parceiros e sociedade.

Existe um caminho para manter o equilíbrio? 

Reconhecer a existência da guerra de vaidades independentemente do nível hierárquico é o primeiro passo, pois é inadmissível que gestores estimulem essa guerra internamente.

O desafio seguinte é construir uma cultura organizacional que valorize a colaboração, o diálogo aberto e o reconhecimento coletivo, sem criar ‘deuses’ corporativos. Nesse sentido, os líderes têm papel fundamental como exemplos de humildade e incentivo ao crescimento mútuo.

Empresas que conseguem transformar egos em motores de criatividade, sem permitir que se tornem barreiras ao progresso, colhem resultados duradouros e sustentáveis. 
Algumas medidas podem ajudar nesse processo:

Definir critérios claros de reconhecimento e recompensa: transparência nas regras evita a percepção de injustiça. Ao reconhecer publicamente os esforços, garanta que todos saibam exatamente o que foi valorizado.

Fomentar metas coletivas: equilibrar objetivos individuais com metas de equipe estimula a cooperação e reforça a noção de interdependência entre os times. Reconhecer quem faz o trabalho silencioso e estrutural é sinal de maturidade organizacional e amplia o senso de pertencimento.

Investir na formação das lideranças: nem todo gestor está preparado para lidar com os efeitos da vaidade corporativa. Promover treinamentos sobre liderança ética, comunicação não violenta e inteligência emocional pode ser decisivo.

Incentivar a cultura do feedback construtivo: em vez de deixar que as tensões cresçam nos bastidores, criar espaços seguros para conversas honestas ajuda a ressignificar conflitos e alinhar expectativas.

Além disso, criar canais de denúncia bem estruturados ajudam a identificar focos de rivalidade antes que se tornem crises.

Em tempos de protagonismo exacerbado, o verdadeiro diferencial competitivo está na capacidade de cultivar ambientes onde todos possam crescer e não apenas alguns aparecer.

A vaidade sempre existirá, mas quando colocada a serviço do coletivo, pode ser convertida em energia criativa. O papel das empresas é canalizar essa energia, transformando disputas em propósito e palco em parceria.

Nesta coluna, trarei reflexões sobre carreira, liderança, coaching e tendências que impactam o mundo do trabalho.

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