Mulher trans cearense é presa em Dubai

Maquiadora de 27 anos foi absolvida da acusação de tráfico de drogas, mas ainda espera decisão sobre exame toxicológico

Escrito por Beatriz Irineu , beatriz.irineu@svm.com.br
Maquiadora fortalezense foi presa em Dubai, há quase oito meses
Legenda: Maquiadora fortalezense foi presa em Dubai, há quase oito meses
Foto: Shutterstock

Uma mulher trans natural de Fortaleza completa 27 anos nesta sexta-feira (21), mas não possui muitos motivos para celebrar o aniversário. A maquiadora, cujo nome será preservado a pedido da família, foi presa em Dubai, suspeita de tráfico de drogas. Ela chegou a ficar quatro meses na cadeia, tendo saído em janeiro deste ano. Até agora, porém, ela aguarda julgamento da última apelação do processo. 

Segundo uma familiar da maquiadora, a sobrinha foi revistada, mas nenhum ilícito foi encontrado. A detenção da cearense ocorreu em 7 de setembro de 2022, quando ela falava supostamente com um colega, que havia sido preso com drogas horas antes. Ela estava no país para um aniversário acompanhada de uma amiga, que a deixou sozinha para outra viagem. Enquanto o esperava, ela foi surpreendida por policiais. 

"Quatro policiais [bateram na porta dela]. E aí, foram abordando ela e fazendo revirando tudo que era no hotel atrás de droga. O amigo dela, o contato dela, tinha sido tinha sido pegue, né?", narrou ao Diário do Nordeste a familiar.

EXAME DE URINA

De acordo com os parentes, a maquiadora não havia conseguido executar um dos exames solicitados pela polícia no momento da prisão. "Eles querem fazer logo uns exames, tanto de sangue quanto de urina. Você tem 48h para fazer esses exames. O de sangue foi feito, mas o de urina ela não conseguiu fazer", contou. 

A jovem não conseguiu fazer o exame toxicológico por supostamente ter sofrido constrangimento transfóbico dos agentes de segurança. "Os policiais ficavam humilhando ela, chamando ela de 'homem'. Ela foi se 'acocar' (ficar sentada) para ver se conseguia fazer o exame, porque ela é mulher, mas eles diziam: 'não você tem que levantar'", descreveu. 

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Nesse período, além de enviar quinzenalmente cerca de R$ 1700 para o sustento da cearense, a família contratou um advogado que tinha uma parceria com um escritório em Dubai. "A advogada (do escritório no país asiático) era a pessoa que fazia o depósito via prisão, que conseguia alguma coisa de saber como ela tava, mas nunca uma visita pessoal. Havia muita dificuldade porque ela também era mulher", esclareceu. 

A ABSOLVIÇÃO

No dia 9 de janeiro deste ano, a maquiadora passou por uma audiência e foi absolvida da acusação de tráfico de drogas, segundo os familiares. Ela foi recambiada da Prisão Central para a Delegacia em Dubai. Contudo, havia a necessidade de alguém acompanha-lá por causa de uma pendência no Ministério Público do local.

Apesar de ter sido absolvida e levada a uma pousada, onde está até agora, a maquiadora ainda passaria por um novo julgamento, já que ela não havia conseguido fazer o exame de urina, disse um familiar. 

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O SEGUNDO JULGAMENTO

Sem dinheiro e sem aparato, ela resolveu ir sozinha a audiência, no dia 12 de fevereiro. O juiz mencionou que a mulher havia se recusado a fazer o exame de urina. "É só isso que eles têm no processo contra ela. Ela disse que tinha explicado, explicou novamente o que tinha acontecido", continuou. 

Após uma semana, no dia 27 de fevereiro, ela foi condenada a pagar 100 mil Dirham, que equivalem a cerca R$ 145 mil, e a dois anos de prisão por não ter conseguido fazer o exame de urina. 

A advogada da Organização Só Sim É Sim, Anna Carolina d'Ávila, que presta apoio jurídico e suporte emocional à cearense, confirmou que a maquiadora recebeu sentença desfarovável  porque deixou de realizar o exame toxicológico para verificação de uso de drogas.

APELAÇÃO JUDICIAL

A Organização entrou com uma apelação no dia 21 de março, na tentativa de reverter a decisão, mas o pedido ainda segue sem resposta da Justiça de Dubai. Neste momento, a equipe jurídica diz estar concentrada em novas estratégias para mudar a situação da maquiadora. 

A família relata que está endividada e está buscando apoio com autoridades estaduais e nacionais para recuperar a cearense. Os parentes a sustentam nos Emirados Árabes enviando cerca de R$ 1.800 por semana. "Nós não temos apoio de ninguém. Estou desempregada, só minha irma que é enfermeira e não tem mais como tirar", relatou. 

"A minha sobrinha está com depressão, eu estou adoentada, minha mãe, todo mundo... A família vendeu o carro, não tem mais nada. A nossa preocupação atual é que semana que vem a gente não tem um centavo". 

Atualmente, a maquiadora aguarda em liberdade, em um hotel, esperando os próximos passos dos procedimentos jurídicos, e não poderá sair do país. 

O QUE DIZ A EMBAIXADA

A reportagem procurou o Ministério das Relações Exteriores, que respondeu acompanhar o caso e presta assistência consular à vítima. Veja abaixo a nota na íntegra:

"O Ministério das Relações Exteriores, por meio da Embaixada do Brasil em Abu Dhabi, mantém contatos frequentes com as autoridades emiráticas sobre o caso e vem prestando assistência consular à nacional brasileira.

Em observância ao direito à privacidade e ao disposto na Lei de Acesso à Informação e no decreto 7.724/2012, informações detalhadas poderão ser repassadas somente mediante autorização dos envolvidos. Assim, o MRE não poderá fornecer dados específicos sobre casos individuais de assistência a cidadãos brasileiros". 

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