Confrontos em Lima deixam um morto após recusa do Congresso a antecipar eleições
Os mandatos atuais seriam abreviados e terminaram no fim de dezembro, com os novos ocupantes dos cargos empossados no dia 1.º de janeiro de 2024
Os confrontos violentos com a polícia nos protestos de sábado (28) em Lima provocaram a morte de um manifestante, a primeira vítima fatal na capital após semanas de revolta em vários pontos do sul andino do Peru para exigir a renúncia da presidente Dina Boluarte.
Com a vítima de sábado, o país registra 48 mortes - incluindo um policial - nas manifestações que começaram na segunda semana de dezembro, tiveram uma trégua de fim de ano e foram retomadas em 4 de janeiro em Puno, sul fronteiriço com a Bolívia.
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"Lamentamos o falecimento de Víctor Santisteban Yacsavilca nas manifestações violentas de hoje (sábado)", anunciou a Defensoria do Povo no Twitter, sem revelar como aconteceu a morte do manifestante durante uma tarde de confrontos que terminaram com feridos e detidos.
Esta é a primeira morte nos protestos em Lima, depois que o Congresso rejeitou a proposta de antecipação das eleições presidenciais para dezembro deste ano - um projeto apresentado na sexta-feira por Dina Boluarte.
Protestos violentos
Durante a semana, Boluarte havia declarado à imprensa que os grupos por trás dos protestas violentos "buscam uma morte em Lima".
"Dizem que uma morte em Lima vale por 100 na província", disse a presidente na terça-feira.
Com chutes e empurrões no gradil que protege o Congresso em Lima, centenas de manifestantes encapuzados e com escudos improvisados enfrentaram a polícia no sábado, em um novo episódio de violência paralelo às marchas pacíficas que pedem a renúncia da presidente e a antecipação das eleições.
O centro da capital peruana voltou a ser palco de uma batalha campal com o ruído incessante de bombas de gás lacrimogêneo ao fundo. O país vive uma convulsão social que, após 52 dias de governo de Boluarte, não dá sinais de apaziguamento.
"Nem um morto mais, Dina assassina", "Queremos dignidade, Dina renúncia já": estas foram as palavras de ordem da passeata deste sábado, que começou como uma festa popular com bandas de música dos Andes e artistas até que um grupo de encapuzados avançou aos arredores do Congresso, fortemente resguardados por policiais da tropa de choque, resultando em intensos confrontos.
A presidente lamentou a votação contrária do Legislativo em antecipar as eleições gerais - que aconteceu na madrugada de sábado - e pediu que os interesses pessoais e partidários sejam postos de lado para "encontrar uma saída para a crise política" no país.
"Exortamos as bancadas a deixarem de lado os seus interesses partidários e a priorizarem os interesses do Peru", escreveu Dina Boluarte no Twitter.
Manifestação
Antes da explosão de violência, centenas de pessoas de Lima e das províncias, a maioria indígena, se concentraram na Praça San Martin, atendendo à convocação da 'Marcha pela renúncia de Dina Boluarte e eleições antecipadas'.
"Sem justiça a paz é uma hipocrisia", dizia um cartaz levado por um grupo de 'palhaços de luto', que desfilaram com música andina ao fundo, e a poucos quarteirões do Concerto pela Paz, outra manifestação contra a violência organizada por grupos civis que apoiam o trabalho das forças de ordem.
Há sete semanas, o Peru tem sido palco de manifestações pedindo a renúncia de Boluarte, que assumiu a Presidência enquanto vice após a destituição do então chefe de Estado, Pedro Castillo (esquerda), em 7 de dezembro, por ter tentado dissolver o Parlamento.
Os confrontos entre manifestantes e forças de ordem deixaram desde então 48 mortos, entre eles um policial que foi queimado vivo, além de dez civis mortos em eventos relacionados com os bloqueios, segundo a Defensoria do Povo.
O sul andino do Peru, onde vivem comunidades quéchuas e aimaras historicamente relegadas, se mantém em pé de guerra exigindo a renúncia de Boluarte e a realização de eleições.
Disputa no Congresso
Após uma sessão de mais de sete horas, o Congresso rejeitou, na madrugada deste sábado, a antecipação das eleições gerais para 2023, como havia pedido a presidente Boluarte, diante da piora da situação e em uma tentativa de buscar uma saída para a grave crise que o país atravessa.
A proposta apresentada pelo congressista fujimorista Hernando Guerra García, do partido de direita Força Popular (FP), foi derrotada por 65 votos a 45 e, por isso, está mantido o projeto de celebrar as eleições gerais em abril de 2024.
A proposta, inclusive, antecipava as eleições para outubro de forma que a presidente, os congressistas e as autoridades eletivas entregassem o poder em dezembro de 2023.
A esquerda, no entanto, insistiu em que a proposta também deveria incluir um referendo sobre a Assembleia Constituinte, que é rechaçada por um amplo espectro da política peruana. Outros partidos denunciaram uma suposta manobra para tirar proveito eleitoral por parte do Força Popular, legenda da ex-candidata presidencial Keiko Fujimori.