Quais efeitos as apostas de Bolsonaro no Ceará podem ter na reta final da campanha

Em Fortaleza, ele dobrou as investidas em pautas já conhecidas do eleitorado e teve palanque mais expressivo em âmbito local

Legenda: Além da aposta na religião, Bolsonaro também buscou modular o discurso eleitoral ao Nordeste
Foto: Camila Lima

Nas palavras de aliados no Ceará, ficou clara a missão que trouxe o presidente Jair Bolsonaro (PL) ao Estado a duas semanas da definição das eleições presidenciais: "furar a bolha".

Após terminar o primeiro turno em segundo lugar em território cearense, com 25,38% dos sufrágios, ele dobrou as apostas em estratégias já conhecidas do eleitorado para disputar espaço diretamente com o ex-presidente Lula (PT), que somou 65,91% dos votos no Ceará no dia 2 de outubro.

Estratégica já foi, por si só, a decisão de visitar Fortaleza neste sábado (15). Bolsonaro não cumpriu nenhuma agenda no Estado desde o início da campanha, em 16 de agosto, e assim foi até o fim do primeiro turno. Ele havia estado na Capital pela última vez em 16 de julho, quando participou de uma motociata e da Marcha para Jesus.

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Àquela altura, a viagem já tinha tom de pré-campanha, mas agora, após ter visto aumentar a bancada de apoiadores eleitos para a Assembleia Legislativa e para a Câmara dos Deputados, o presidente teve palanque mais expressivo para tentar demonstrar força no Ceará.

Religião

A estratégia mais evidente, que surtiu efeito no público presente no comício realizado no Polo de Lazer do Conjunto Ceará, foi a de colar o seu projeto político à religião. A multidão reagia efusivamente às investidas direcionadas ao eleitorado religioso, com direito não apenas às palavras de Bolsonaro, mas também aos efeitos sonoros que dramatizaram o discurso em momentos como o da convocação aos que compareceram: "vamos, o bem, derrotar o mal".

"Hoje, com a graça de Deus, temos um capitão com o povo brasileiro. Um capitão que respeita a família brasileira, que não vai deixar, juntamente com o Parlamento, liberar as drogas no Brasil", afirmou, ao trazer, ainda durante sua fala, uma sequência de pautas com ressonância no eleitorado conservador. "Um capitão que respeita a vida desde a sua concepção, que não vai permitir o aborto no Brasil", continuou.

Em outro trecho do pronunciamento, Bolsonaro foi mais direto ao mobilizar os apoiadores: "aos cristãos, vamos falar de política hoje para, amanhã, continuarmos falando do nosso Deus".

Cumprindo à risca a cartilha de sua campanha, o presidente se apegou ao peso de igrejas na sustentação do Governo, acompanhado por nomes como o do senador eleito pelo Espírito Santo, Magno Malta (PL), que fez coro à tentativa de fazer do pleito uma "guerra espiritual". Bolsonaro pregou para os seus sem se preocupar com o que corresponde à realidade ou não. Ainda assim, esperando que estes multipliquem. 

Nordeste

A abordagem da religião não difere da que vem sendo aplicada em outros cantos do País, mas foi preciso também modular o discurso ao Nordeste. Nos destaques de tal aposta, não houve tanta novidade: o primeiro apelo, repetido em todas as vezes em que esteve no Estado, é o de ressaltar suas ligações familiares com o Ceará. O candidato voltou a dizer que sua filha mais nova "tem sangue de cabra da peste", pois é neta de um cearense de Crateús. 

Ele foi recebido aos gritos ao dar "boa tarde ao meu Ceará" e, na sequência, afirmar: "o PT diz que eu não gosto de nordestinos. Eu sou apaixonado por uma filha de cearense". Bolsonaro, que durante o Governo reivindicou para si a chegada das águas do Rio São Francisco ao Estado, com a inauguração do Eixo Leste da Transposição, não se aprofundou no tema, mas também fez questão de se justificar dizendo que, "quem muito fez, tem pouco para falar porque as obras falam por si".

Se a primeira-dama, Michelle Bolsonaro, e a senadora eleita pelo Distrito Federal, Damares Alves (Republicanos), vieram ao Ceará na sexta (14) para dialogar diretamente com o eleitorado feminino, a agenda do presidente aqui, nas atuais circunstâncias, também buscou reduzir os efeitos negativos de declarações dadas por ele mesmo após o primeiro turno, quando associou a derrota no Nordeste a um suposto "analfabetismo" da população.

Kamila Cardoso e Capitão Wagner
Legenda: A chapa de oposição que disputou o Governo do Estado não declarou voto no primeiro turno, mas ganhou protagonismo no comício
Foto: Camila Lima

Capitão Wagner

Nesta tarefa, ele não contou apenas com lideranças nacionais, mas também com aliados locais que mergulharam de vez na campanha presidencial.

A chapa de oposição que disputou o Governo do Estado, composta por Capitão Wagner (União Brasil) e Kamila Cardoso (Avante), não declarou voto no primeiro turno, mas ganhou protagonismo no comício deste sábado: Kamila, em mais de um momento, mostrou estar emocionada com as falas no evento; enquanto Wagner, em discurso enérgico de apoio, explicou o porquê da escolha do Conjunto Ceará para receber o presidente.

O deputado federal ressaltou que o bairro lhe garantiu maioria de votos nas eleições municipais de 2016 e 2020, quando disputou a Prefeitura de Fortaleza, e também no pleito deste ano, quando venceu na Capital.

Juntas, tais estratégias deram a Bolsonaro um ato de campanha em Fortaleza com mais peso do que o realizado por ele em Recife na mesma semana. O efeito das apostas nas urnas, porém, está em aberto: deve levar em consideração que, embora Lula não tenha estado em Fortaleza ainda neste segundo turno, a campanha do petista também vem ganhando - e em maior número - adesão de políticos locais.

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