Entregador de água e servente de pedreiro viralizam no TikTok ao criar sucesso 'Passinho do Jamal'

Há mais de 160 mil vídeos na rede social tentando reproduzir a dança que ficou entre os topos das plataformas de áudio.

Escrito por
Geovana Almeida* geovana.almeida@svm.com.br
(Atualizado às 15:06)

Fenômeno nas redes sociais, o chamado 'Passinho do Jamal', é reproduzido por milhares de usuários. A dança, que viralizou ao som da música 'Toma Botada', foi criada por dois jovens, Jamal da Capital, de 25 anos, e Eo Chapa, de 21. Amigos desde a infância, a dupla nasceu na comunidade de Santo Amaro, no Recife, e trabalhavam como servente de pedreiro e entregador de água. A música esteve entre as mais ouvidas nas plataformas de áudio, como Spotify.

Até essa quarta-feira (29), existem mais de 160 mil vídeos de usuários do TikTok tentando dançar o 'Passinho do Jamal'. A coreografia de "dois pra lá e dois pra cá" vem sempre acompanhada da música 'Toma Botada', de Eo Chapa e Mc Rogê, que atingiu o primeiro lugar entre as canções em alta no Tiktok Brasil. 

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'Eo Chapa' é o nome artístico do cantor Pedro Henrique. Já o nome 'Jamal da Capital' foi escolhido pelo dançarino Romero Silva, em homenagem ao protagonista do filme "Dois doidões em Harvard", de 2001. 

Pedro Henrique e Romero, revelações do Brega Funk, concederam entrevista ao Diário do Nordeste.

Dois homens em um passeio de lancha no mar, usando coletes salva-vidas laranja, sorrindo e fazendo gestos de diversão, com a água e o céu ao fundo.
Legenda: Eo Chapa e Jamal da Capital, respectivamente.
Foto: Reprodução/Instagram.

Amigos de escola

Eo Chapa e Jamal se conheceram quando ainda estudavam, eles tinham 12 e 16 anos, respectivamente. "O primeiro contato da gente, foi na diretoria da escola. Daí a gente foi se falando e ficou amigo porque nós não tínhamos muita condição financeira. Então começamos a trabalhar juntos", contou Eo Chapa ao Diário do Nordeste.

Na época que se conheceram, os dois passavam por dificuldades financeiras e precisaram abandonar os estudos para aumentar a renda em casa. "A gente começou a trabalhar no sinal, limpando vidro de carro no semáforo", informou o cantor da música 'Toma Botada'.

Eo Chapa conseguiu retornar à escola para finalizar os estudos, enquanto Jamal parou na sétima série. "Ou a gente escolhia trabalhar ou a gente escolhia estudar", contou Jamal.

Aos 18 anos de idade, Eo Chapa começou a trabalhar como entregador de água e Jamal como servente de pedreiro, ocupações em que se mantiveram até a viralização recente da música e do passinho.

Dois catadores de lixoapós concluírem uma corrida beneficente, carregando sacos de lixo reciclável, em um parque urbano com árvores e prédios ao fundo.
Legenda: Jamal e Eo Chapa trabalharam também recolhendo lixo.
Foto: Reprodução/Instagram.

O 'Passinho do Jamal'

Apesar da coreografia ter se espalhado rapidamente no último mês, Jamal postou a dança pela primeira vez em 2019, na tentativa de viralizar e mudar de vida. "Eu via que muitos dançarinos daqui estouravam no brega funk dançando, aí eu comecei a fazer o passinho dos caras. Esse passinho do 'pé pro lado e pro outro' é antigo no Brega Funk. Eu só acrescentei as mãos, que acompanham os pés".

Segundo Jamal, no início, ele tinha vergonha de ser gravado dançando a coreografia, mas Pedro Henrique o estimulava. Ao lado dele e de outros amigos, Jamal passou a fazer vários vídeos repetindo o passinho. Mas o sucesso só veio recentemente, quando o passinho foi somado à música 'Toma Botada' de Eo Chapa e Mc Rogê. 

Como surgiu o hit 'Toma Botada'

A carreira musical de Eo Chapa começou em agosto de 2023, com a música 'Funk da Fúria', mas o sucesso só veio com 'Toma Botada, lançada em 2025. O cantor contou que a ideia da canção surgiu por acaso, enquanto ele estava tomando banho e escutando uma playlist musical de funks do Rio de Janeiro.

"Eu estava tomando banho, escutando playlist no YouTube. Até chegar uma com aquela batida mais envolvente. A música era do FP do Trembala - funkeiro carioca - e tinha uma participação do MC Rogê - cantor parceiro de 'Toma Botada' -. Aí eu pensei, meu irmão, dá pra sair alguma coisa dessa parte e levei para o estúdio no mesmo dia".

No dia que o hit surgiu, Eo Chapa tinha marcado de ir a um estúdio no Morro do Córrego do Abacaxi, em Olinda, para fazer uma participação em uma música de um colega. O cantor aproveitou a oportunidade e contou a ideia ao produtor do estúdio: "Naquele momento que ele escutou aquela parte, ele disse, vamos criar aqui na hora. A gente escreveu juntos e fomos brincando até finalizar a letra".

O hit já foi ouvido mais de 7 milhões de vezes somente no Spotify e chegou a ocupar o terceiro lugar no ranking de virais nacionais da plataforma. Eo Chapa e Jamal afirmaram que muita coisa mudou após o sucesso: "A gente pode dizer que a gente venceu, né? Superamos um obstáculo juntos. Agora conseguimos uma renda através da internet, através da música, através da vida certa".

Grupo de amigos comemorando e dançando na rua durante evento no Recife, usando camisetas amarelas e shorts com estampas, com prédios históricos ao fundo.
Legenda: Jamal e Eo Chapa gravam vídeos no Centro de Recife.
Foto: Reprodução/Instagram.

"Fizemos história no Brega Funk"

As primeiras composições e passinhos do Brega Funk surgiram em Recife, por volta de 2011. "Não é a toa que aqui é a 'capital do Brega Funk'", afirmou Jamal ao Diário do Nordeste.

"O preconceito é o que mais rola com a gente, sendo que essas músicas e danças são cultura da nossa comunidade. Na verdade, é cultura de Recife como um todo"

Jamal e Eo Chapa pontuaram que sofrem muitos ataques nas redes sociais: "Não dão respeito a gente, ao nosso trabalho, falam coisas estúpidas pra gente. É muito de difícil ver". Mas ainda segundo os dois, o mesmo estilo que a sociedade julga, ela agora tenta imitar. "Todo esse preconceito só mostra que o Brega Funk chegou lá e agora quebrou mais uma bolha".

Entre convites para shows e para publicidade de estabelecimentos locais, Eo Chapa afirma que o tempo foi generoso com ele e o amigo: "A gente tinha tudo nas mãos pra correr pro lado errado e como muitos daqui se envolver com coisa errada, mas a gente provou pra sociedade e até pra nossa própria comunidade que a gente pode fazer diferente através da cultura".

E se a gente um dia voltar a fazer o que a gente fazia antes, nosso trabalho de pedreiro e entregador. A gente volta de cabeça erguida e sabendo que nós fizemos história na cultura do brega funk
Romero Silva
Criador do Passinho do Jamal

*Estagiária supervisionada pela editora Geovana Rodrigues. 

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