Haiti pede tropas militares dos EUA e da ONU após assassinato do presidente
O assassinato desestabilizou ainda mais o país mais pobre da América
O Haiti pediu aos Estados Unidos e à Organização das Nações Unidas (ONU) que enviem tropas para proteger seus portos, aeroportos e outros locais estratégicos após o assassinato do presidente Jovenel Moise, declarou um ministro do governo haitiano nesta sexta-feira (9).
O ministro de eleições, Mathias Pierre, disse que “os mercenários [acusados do crime] poderiam destruir alguma infraestrutura para criar o caos no país”.
“Durante uma conversa com o secretário de Estado dos Estados Unidos e a ONU, fizemos esse pedido”, acrescentou.
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O Departamento de Estado e o Pentágono confirmaram ter recebido um pedido de "assistência de segurança e investigação" e disseram que estavam em contato com Porto Príncipe, mas não especificaram se tropas militares seriam enviadas.
Uma fonte diplomática da ONU disse ter recebido o pedido, mas que uma resolução do Conselho de Segurança é necessária para enviar um contingente.
Washington já disse que enviará o FBI (polícia federal) e outros agentes ao Haiti o mais rápido possível, onde o assassinato de Moise deixou um vácuo de poder na conturbada e empobrecida nação caribenha.
A busca pelos culpados
Enquanto isso, o Haiti tenta determinar quem ordenou o ataque supostamente executado por um esquadrão armado de 28 pessoas: 26 colombianos e dois americanos de origem haitiana.
Destes, 15 colombianos e dois americanos foram presos, enquanto três colombianos foram mortos pela polícia e outros oito permanecem foragidos, disse a polícia haitiana. Há alguma discrepância nos números com relatórios de outras fontes oficiais.
Altos funcionários do exército e da polícia colombianos relataram que pelo menos 17 ex-militares colombianos estariam supostamente envolvidos no assassinato.
Depois de se comunicar com o primeiro-ministro haitiano, Claude Joseph, o presidente colombiano, Iván Duque, disse que seu país oferecerá "toda a colaboração", inclusive enviando uma missão de inteligência ao Haiti para encontrar "os autores materiais e intelectuais do assassinato".
Por sua vez, Taipei disse que 11 dos suspeitos foram detidos no complexo da embaixada taiwanesa em Porto Príncipe.
Haiti vive dias de tensão e medo
A capital haitiana, paralisada há vários dias, retomou gradativamente suas atividades nesta sexta-feira, com um maior número de pessoas nas ruas e o transporte público reativando gradativamente seu serviço, ainda que sob o manto da apreensão.
As pessoas correram para abastecer os supermercados e fazer fila nos postos de gasolina para comprar o propano que usam para cozinhar, na expectativa de mais dias de instabilidade.
"Não sei o que vai acontecer amanhã ou depois de amanhã no país, então estou me preparando para os dias ruins que virão", declarou Marjory, moradora de Porto Príncipe, à AFP.
O aeroporto da capital, fechado após o ataque, parecia ter reaberto nesta sexta-feira, segundo informações da Flightradar.
Falta de informação assusta a população haitiana
Neste país de 11 milhões de habitantes, onde mais da metade da população tem menos de 20 anos, todos se perguntam como pode ter acontecido um ataque fatal ao chefe de Estado.
“São estrangeiros que vieram ao país para perpetrar este crime. Nós, os haitianos, estamos consternados”, disse à AFP um morador da capital.
"Precisamos saber quem está por trás disso, seus nomes, seus antecedentes para que a justiça possa fazer seu trabalho."
Vários oficiais da polícia, diretamente responsáveis pela segurança do presidente haitiano, estão na corda bamba e foram convocados ao tribunal, anunciou na quinta-feira o promotor-chefe de Porto Príncipe, Bed-Ford Claude.
"Se você é o responsável pela segurança do presidente, onde estava? O que você fez para evitar esse destino para o presidente?", perguntou Bed-Ford Claude.
Outros até sustentam a possível implicação desses policiais, o que aumentou a confusão.
"Moise foi assassinado por seus agentes de segurança. Não foram os colombianos que o assassinaram. Eles foram contratados pelo Estado haitiano", acusou o ex-senador Steven Benoit à rádio nesta sexta-feira.
COMO O PRESIDENTE DO HAITI FOI ASSASSINADO
Moise foi morto por um comando armado, em sua casa, na madrugada de quarta-feira. Citando o juiz encarregado do caso, a imprensa local informou que o corpo de Moise foi encontrado com 12 balas e que seu escritório e quarto foram saqueados.
A filha do presidente, Jomarlie, estava em casa durante o ataque, mas conseguiu se esconder, disse o juiz Carl Henry Destin ao jornal Le Nouvelliste.
"O escritório e o quarto foram saqueados. Nós o encontramos deitado de costas, calça azul, camisa branca manchada de sangue, boca aberta, olho esquerdo perfurado", descreveu o magistrado.
A esposa do presidente, Martine Moise, foi ferida e transferida de avião para Miami. Segundo o primeiro-ministro, ela está fora de perigo e em situação "estável".
ENTENDA A CRISE POR TRÁS DA MORTE DO PRESIDENTE DO HAITI
O assassinato ameaça desestabilizar ainda mais o país mais pobre das Américas, que já enfrenta uma profunda crise política e de segurança.
O Departamento de Estado americano pediu que o processo continue para a organização de eleições legislativas e presidencial - programadas, em princípio, para 26 de setembro, com um segundo turno em 21 de novembro.
O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, transmitiu a Claude Joseph "o compromisso" de Washington de "trabalhar com o governo do Haiti para apoiar o povo haitiano, a governança democrática, a paz e a segurança", disse seu porta-voz Ned Price.
O Haiti está mergulhado em uma espiral de violência. Os sequestros praticados por grupos criminosos se tornaram rotina. Moise foi criticado por sua inércia em face da crise e sofria com a desconfiança de grande parte da sociedade civil.
Durante seu mandato, o presidente nomeou sete primeiros-ministros. O último foi Ariel Henry, que deveria tomar posse em breve.
Governando por decreto desde janeiro de 2020, sem Parlamento e com a duração de seu mandato em xeque, Moise implantou uma reforma institucional para reforçar as prerrogativas do Executivo.
Um referendo constitucional deveria ter sido realizado em abril, mas foi adiado para 27 de junho e, mais uma vez, para setembro.