Celebrar conquistas que deveriam ser convencionais e ocupar espaços que poderiam ser nossos há muito tempo é comum para mulheres que lutam por equidade em todos os sentidos. Por isso, a cada passo avançado, celebra-se uma vitória em uma estrada em que ainda temos muito a percorrer.
No esporte não é diferente: além de espaço, muitas vezes, se luta por integridade, segurança, remuneração igual. Por isso, cada avanço deve ser celebrado. E nesta semana, a ex-nadadora Joanna Maranhão fez parte disso ao se tornar a primeira mulher eleita para o Conselho de Ética do Comitê Olímpico Brasileiro. Em entrevista à coluna, ela falou sobre a nova missão e os desafios que estão por vir.
Hoje aos 34 anos, Joanna fez história na natação e foi finalista olímpica nos Jogos de Atenas, em 2004. Mas de pronto fez questão de destacar que não continuou no esporte pensando nisso (fazer história), mas por se sentir bem, apesar de ter vivido experiências que não deveria: “ Eu não desisti desse ambiente, justamente por acreditar que pode ser um ambiente seguro, saudável, em que experiências positivas se sobressaiam às negativas”.
E pensando em colaborar para que esse ambiente seja ainda mais propício, a ex-nadadora envereda pelo caminho da gestão, mas não esquece dos obstáculos e relembra
“Gestão esportiva no Brasil é complicado para mim, porque a relação com o status quo e as instituições esportivas foi muito conturbada. Eu não fui tratada como deveria ter sido tratada pela gestão da CBDA (Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos) e, consequentemente, pelas outras instituições esportivas que nada fizeram mesmo tendo conhecimento de todas as retaliações e boicotes que sofri ao longo de todos esses anos.”
É justamente por se colocar nesse lugar que Joanna destaca a importância de fazer um bom trabalho no Conselho de Ética e reforça que procura estudar para ter embasamento e fazer a diferença para que histórias como a dela tenham um desfecho diferente: “Não precisa passar pelo que eu passei para se fazer ouvir, então é esse o meu mote, o que me motiva para estar nesse lugar”.
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Após deixar as piscinas, em 2018, e dar à luz a Caetano, em 2019, Joanna, atualmente, mora na Alemanha, onde finaliza o mestrado em Ética Esportiva e Integridade, com tema de dissertação sobre a incidência de violências interpessoais que atletas de rendimento sofrem no Brasil.
Ela conta que chegou a números alarmantes a partir de 1.083 respostas de um questionário, se mostra bem esclarecida quanto a essa quantidade não representar a totalidade do cenário, mas entende que pode ser um passo importante para entender o que vem acontecendo no esporte brasileiro: “Definitivamente, acho que acende um alerta e pode ser uma porta de entrada pra outros estudos que a gente pode fazer aí para frente”.
Um dos pontos importantes a serem trabalhados, defende a ex-nadadora, é a igualdade. Para os próximos Jogos, que acontecerão em Paris, em 2024, a expectativa é que sejam as primeiras Olimpíadas com a mesma quantidade de mulheres e homens. Mas é importante compreender que o igual vai muito além só de números. Requer uma reformulação de pensamento e estrutura, em que é preciso pensar em ceder.
Quando isso não acontece, Joanna defende que as decisões devem vir ‘de cima para baixo’ e explica: “Para medidas urgentes e reparação histórica, aí serve para qualquer recorte de gênero, de raça, de orientação sexual, enfim, só funciona de cima para baixo”. Por exemplo: “Só compete se tiver uma política, código de conduta, de ética, programa educativo e tudo”.
Além de Joanna, como membro não independente, Sami Arap Sobrinho foi o eleito para o Comitê. Entre os independentes, foram eleitos Humberto Aparecido Panzetti, Ney de Barros Bello Filho e Guilherme Faria da Silva.
A entidade tem ainda como competência fomentar programas educativos que visem atender o patamar ético e, ao iniciar uma nova gestão, renova-se também a esperança de um caminhar por um novo rumo. Como Joanna reforça, é preciso uma mudança de cultura, o que leva tempo e requer um projeto estruturado.