Como fica o piso salarial da enfermagem após suspensão pelo ministro Roberto Barroso
Setembro deveria ser o primeiro mês de pagamento dos novos salários de enfermeiros, técnicos, auxiliares de enfermagem e parteiras
Na véspera da data que marcaria o primeiro pagamento do reajuste salarial do piso da enfermagem em 2022, o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), publicou decisão de caráter liminar suspendendo os efeitos da nova lei e dando prazo de 60 dias para que entidades públicas e privadas se manifestem sobre a viabilidade da aplicação do piso e a legalidade do processo legislativo que resultou na criação da lei.
Desde então, há uma crescente indignação da categoria e de entidades representantes com a suspensão do reajuste salarial.
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A nova lei prevê que enfermeiros de todo o país, contratados em regime de CLT, terão de receber, no mínimo, R$ 4.750 mensais. Já o piso de técnicos de enfermagem será de R$ 3.325; e o de auxiliares e de parteiras, R$ 2.375.
A decisão monocrática ainda será analisada pelo Pleno do STF, julgamento que deve começar na próxima sexta-feira (6). A votação no plenário virtual da corte deve se prolongar até quarta-feira (14). Na sexta, também está prevista uma manifestação em Fortaleza, na Avenida Beira-Mar contra a decisão no STF.
Nesta terça-feira (6), houve uma reunião entre Barroso e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD). Segundo o STF, o encontro teve como foco “buscar solução que viabilize a implementação do piso”. “Ambos se comprometeram a prosseguir os trabalhos e o diálogo em busca de consenso”, diz nota.
Quando entra em vigor o piso da enfermagem
Até que seja cumprido o julgamento no STF, a efetivação do piso não é obrigatória. Na decisão, o ministro pontua, no entanto, que, "naturalmente, as instituições privadas que tiverem condições de, desde logo, arcar com os ônus do piso constante da lei impugnada, não apenas não estão impedidas de fazê-lo, como são encorajadas".
Entenda a aprovação do piso
O piso salarial da enfermagem foi proposto pelo senador Fábio Contarato (PT) e teve tramitação finalizada no Congresso Nacional em maio deste ano.
Em 14 de julho, o Congresso promulgou a Emenda Constitucional (EC) 124 para possibilitar que o piso fosse instituído sem questionamentos na Justiça, já que não cabe ao Legislativo tratar de remunerações profissionais. Só em 4 de agosto foi sancionada a respectiva norma, a Lei 14.434, de 2022.
Logo depois, uma Ação Direta de Constitucionalidade foi apresentada ao STF pela Confederação Nacional de Saúde, Hospitais e Estabelecimentos e Serviços (CNSaúde) questionando a segurança jurídica da proposta.
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Na decisão liminar, o ministro afirmou ser plausível o argumento de que o Legislativo aprovou o projeto e o Executivo o sancionou sem cuidarem das providências que viabilizariam a sua execução, como, por exemplo, o aumento da tabela de reembolso do SUS à rede conveniada.
Barroso deu prazo de 60 dias para que entes públicos e privados informem o impacto financeiro do piso salarial, assim como os riscos para a empregabilidade na área e a possibilidade de eventual redução na qualidade dos serviços prestados na rede de saúde.
Desde o início da discussão, entidades do setor e do poder público alertaram para o efeito desse piso para o atendimento de saúde. A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) calcula uma despesa de R$ 9,4 bilhões para as prefeituras.
Quem votou contra o piso da enfermagem
A suspensão pelo ministro trouxe de volta a discussão sobre os votos a favor e contra a proposta. De forma geral, a proposta que criou o piso teve amplo apoio de parlamentares. Os votos contrários foram dos deputados:
Adriana Ventura (Novo-SP)
Alexis Fonteyne (Novo-SP)
Gilson Marques (Novo-SC)
Lucas Gonzalez (Novo-MG)
Marcel van Hattem (Novo-RS)
Paulo Ganime (Novo-RJ)
Tiago Mitraud (Novo-MG)
Vinicius Poit (Novo-SP)
Eduardo Bolsonaro (PL-SP)
José Medeiros (PL-MT)
Kim Kataguiri (União Brasil-SP)
Ricardo Barros (PP-PR)
Fonte de financiamento do piso da enfermagem
Desde que começaram as discussões sobre a criação do piso, deputados e senadores tentam achar uma saída para a fonte de financiamento dos novos salários. Entre eles, está o projeto que legaliza os jogos de azar no Brasil, como cassinos, bingos e jogo do bicho.
O projeto original de legalização tem mais de 30 anos, foi aprovado pela Câmara dos Deputados em fevereiro deste ano e está parado no Senado. Há resistência de parte da oposição e da bancada evangélica, e atrelar a aprovação ao piso é vista com desconfiança pelos opositores.
Outras propostas envolvem desonerações de folhas de pagamento de instituições filantrópicas e empresas privadas do setor de saúde, tributação de lucros e dividendos, uso de recursos de fundos públicos da União que estejam parados, de recursos dos royalties da exploração de petróleo, de recursos arrecadados com a eventual nova "Loteria da Saúde", dentre outros.
Um dos pontos importantes é a discussão sobre a ampliação do financiamento do SUS, com o aumento da tabela de reembolso do SUS à rede conveniada.
Manifestações de entidades
A decisão no STF gerou uma série de manifestações principalmente contrárias. Diante da pressão da categoria, diferentes entes públicos e privados se manifestaram sobre a decisão.
A Federação das Misericórdias e Entidades Filantrópicas do Ceará divulgou nota para esclarecer que não se manifestou contra a aplicação do piso, mas sobre a ausência de fonte de custeio.
"Não questionamos em momento algum o mérito do piso pleiteado pela categoria e sim a origem da fonte de custeio para podermos pagar esta diferença salarial, cientes que estamos há décadas com a tabela do SUS totalmente defasada", diz o texto.
A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) divulgou nota "em comemoração". "A Confederação destaca que a medida é fundamental para corrigir a situação atual, tendo em vista que, passados 31 dias desde a promulgação da medida que implementou o piso, o Congresso Nacional não resolveu, até o momento, qual será a fonte de custeio para o mesmo, apesar de haver se comprometido com isso no momento da votação", diz a nota.