Air France-KLM pode encerrar parceria com a Gol e firmar acordo com a Latam no Brasil
A parceria da Air France-KLM com a Gol pode estar com os dias contados. Isso porque no próximo ano se encerra o acordo de compartilhamento de assentos, podendo ambas estenderem a parceria ou não.
Fontes do mercado de aviação têm perspectivas de que haverá encerramento do acordo e consequentemente a construção de uma nova parceria entre Air France-KLM e Latam na América do Sul.
A Gol atua na alimentação de voos da gigante europeia no Brasil pelo menos desde 2014. As empresas já haviam renovado o acordo em 2019, com validade até 2024.
Em nota, a Air France-KLM afirmou que está contente com a parceria com a Gol. "Juntos, oferecemos a melhor opção de conexão entre o Brasil e a Europa e buscamos melhorar continuamente os serviços para nossos clientes", acrescentou.
"A Latam informa que qualquer novo acordo de aliança será comunicado oportunamente pela companhia", informou a aérea.
A Gol também foi procurada pela coluna, mas até a publicação desta reportagem a empresa não se manifestou.
Segundo a imprensa internacional, o grupo Air France-KLM pode considerar outros rumos em relação à parceria com os brasileiros.
Mas por que se acredita que o grupo franco-holandês não renovará o acordo com a Gol e sim com a Latam?
Porque basicamente as grandes companhias globais Delta (Estados Unidos), Virgin Atlantic (Reino Unido) e Air France-KLM (França e Holanda) possuem entre si uma parceria muito solidificada.
Os três players globais de aviação reafirmaram e fortaleceram ainda mais suas ligações em 2020, antes da pandemia, permitindo grande integração de voos entre EUA, Europa e Reino Unido. Inclusive Delta – forte parceira da Air France-KLM – é atualmente uma das acionistas da Latam Airlines, o que corrobora para um futuro acordo entre o grupo franco-holandês e a Latam.
O contexto da aviação
A Delta deixou a parceria com a Gol em 2019, comprando parte e se associando a Latam.
Em 2020, a Latam deixou a associação de companhias aéreas Oneworld que reunia players como a inglesa British Airways e os espanhóis da Iberia, time concorrente de Virgin e Air France-KLM.
Em 2022, a Virgin Atlantic voltou com os planos pré-pandêmicos de ligar Londres a São Paulo.
Neste contexto, a britânica escolheu a Latam para alimentar voos no Brasil e encerrou a parceria que tinha com a Gol antes da pandemia.
Duas viradas de mesa da Latam em cima da Gol.
Em 2022, a American Airlines, concorrente da Delta, reforçou a sociedade com a Gol, tendo direito a assento no conselho de administração da companhia brasileira.
Também em 2022, no esforço de reestruturação, a Gol criou joint venture com a colombiana Avianca, se associando a um eixo de confronto à soberania da Latam na América do Sul.
Seria, portanto, Air France-KLM os próximos a deixarem a Gol? Outra publicação internacional cita expressamente o executivo do grupo considerando uma parceria de novos tempos com a Latam.
“Nós estamos estudando a melhor forma de nos posicionarmos para o médio e longo prazo na América do Sul. Nós temos parceria histórica com a Gol, e ainda temos uma pequena parte do capital deles (1,3%). Latam agora é parceira da nossa parceira Delta, então discussões e potenciais com a Latam agora estão disponíveis para se processarem num contexto diferente” disse, o executivo de Air France-KLM, Ben Smith.
Como mencionado pelo executivo, existe a chance da alimentação na América do Sul agora ser feita com a Latam: é a maior companhia aérea da América do Sul com subsidiárias no Brasil, Chile, Colômbia, Paraguai, Peru e Uruguai e, consequentemente, mais bem posicionada na região e com maior potencial local de alimentar aeronaves estrangeiras em voos internacionais.
Os planos de Air France-KLM são audaciosos de um jeito que consideram abertamente a coligação com a líder na ligação América do Sul - Europa, a portuguesa TAP. AF-KLM considera até mesmo comprar a companhia de Portugal. São tempos em que muita coisa pode mudar na aviação.
Uma sinergia de AF-KLM + TAP em Fortaleza seria benéfica para Fortaleza dada a pujança dos dois grupos localmente.
Air France-KLM em Fortaleza
Na semana passada, comentamos sobre o incerto retorno da KLM a Fortaleza.
Estranhamente, a Air France que sempre operou menos dias na semana em Fortaleza, voltou, mas a KLM não.
Entretanto, a chegada conjunta das duas europeias ao Ceará em 2018, não vingou ainda no pós-pandemia. Nem a KLM voltou, nem a Air France aumentou frequências por aqui.
Não é o acordo bilateral Brasil-França que trava a Air France de operar mais dias na semana em Fortaleza, se quisesse poderia voar diariamente, por exemplo. A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) informou que a capacidade máxima de operação de companhias francesas em direção ao Brasil é de até 36 frequências semanais: a Air France, única francesa entre os dois países, opera apenas 24 frequências semanais.
Resultado, a TAP retornou a ser o maior grupo europeu em movimentação de passageiros no Ceará, muito frequentemente, operando com o A330-900 para 300 passageiros, aumento de 30 assentos comparado com o histórico A330-200.
Na contramão desse upgrade da TAP, na baixa estação (abril a outubro), a Air France deixou de operar com o Boeing 787-900, voltando com o Airbus A330-220 de apenas 224 assentos, mais de 50 assentos a menos.
É um movimento conservador e que em nada lembra a avidez do grupo franco-holandês que, rapidamente, escalou de 5 para 7 frequências semanais em Fortaleza entre 2018 e 2019. Na ocasião, desbancaram 2 décadas de supremacia da portuguesa TAP.
Outro fator que torna difícil de entender o não retorno da KLM é que, a holandesa tinha, em média, melhor ocupação que a francesa, ainda que as duas tivessem ocupações excelentes.
De acordo com dados da Anac, a Air France tinha ocupações de 92,9% em 2018 e de 91% em 2019. Já a KLM tinha ocupações de 93,1% em 2018 e de 93,3% em 2019.
O retorno incerto da KLM
Como dito, nos últimos 10 anos, foi a Gol quem alimentou os voos de AF-KLM no Brasil, garantindo que milhões de brasileiros de qualquer estado pudessem embarcar nas aeronaves das companhias europeias em São Paulo, Rio de Janeiro e Fortaleza.
Certamente, as ocupações vistas em Fortaleza eram bonificadas com os voos domésticos da Gol na capital que vinham dos principais centros do país (Manaus, Belém, Natal, Recife, Salvador, Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília).
Como já dissemos, porém, é provável que a razão do não retorno da KLM seja mesmo a falta de alimentação doméstica da Gol em Fortaleza, dada a brutal redução de operações da companhia brasileira na capital do Ceará, já mencionada inúmeras vezes na coluna.
A queda de movimentação doméstica é fator muito claro que leva também à queda de movimentação internacional, que o diga o aeroporto internacional do Galeão.
Uma nova chance ao Ceará
Se a Latam alimentasse os voos de AF-KLM no Brasil, Fortaleza estará com uma melhor rede doméstica de alimentação para os franco-holandeses, dado que a Latam possui um hub regional em Fortaleza, segundo o entusiasta da área de aviação, Marcos Kelson.
Se a KLM (provavelmente) não voltou por falta de alimentação da Gol no Ceará, a lógica matemática infere que, com a Latam, a holandesa voltaria. A Latam possui a conectividade em Fortaleza que a Gol nunca teve.
São mais de 12 destinos ligados diretamente em banco de conexão e parceria emergente com a regional Voepass: banco de conexões no período de 13h as 16h muito mais relevante que os da Gol já teve e poderia perfeitamente alimentar os voos de ida para Paris e Amsterdã.
Nos últimos meses, ademais, vem se notando a criação de outro banco de conexões no início da madrugada, que pode ser alimentado com os voos de retorno da Europa para Fortaleza. A Voepass foi outra companhia que deixou parceria com a Gol para trás, para se coligar com a Latam. Com a regional, Latam passa a se ligar com destinos como Fernando de Noronha, Juazeiro do Norte e Feira de Santana.
Latam está em um patamar inédito de bases no Brasil, mais de 50, sem contar com a Voepass. Esse fortalecimento doméstico pode estar ligado ao desejo também de estreitar laços com AF-KLM.
E se a parceria da Air France-KLM for renovada com a Gol?
Uma vez que nada é certo na aviação, apenas podemos falar de probabilidades da Air France também deixar Fortaleza. Caso Gol e AF-KLM estendam novamente em 2024 a parceria, a chance continua existindo de Air France deixar o Ceará também.
Fontes do setor aéreo admitem que não haveria motivos para a francesa deixar Fortaleza, uma vez que a empresa enche aviões sem a necessidade de conexões domésticas.
Adicionalmente, o tempo de viagem entre Fortaleza e Paris (9h) é cerca de uma hora mais curto que um voo eventual entre algumas praças da região e Paris, de forma que a operação no Ceará é mais barata para os operadores. O Airbus A330-200 usado hoje, certamente é um avião amortizado com custo mais baixo para qualquer companhia.
Evidente que, se as ocupações em Fortaleza caem, é natural que qualquer companhia buscasse um local bem alimentado, como Salvador é pela Gol, em seu hub laranja do Nordeste. Em julho passado, a ocupação do voo para Paris foi superior a 96% ida e volta.
Fortaleza ainda receberá um upgrade inédito da Air France a partir de outubro próximo, como comentamos: operará o Airbus 350, maior aeronave regular a operar no Ceará.
É também a maior aeronave com que a Air France já operara em Fortaleza, 100 assentos a mais do que os 224 ofertados hoje (A330-200).
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*Este texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.