No Brasil que santifica meninas estupradas, não nos sentimos seguras nem mesmo em um elevador monitorado por câmeras. O caso mais recente veio a público nesta semana, quando uma mulher denunciou o empresário Emanoel Gurgel por importunação sexual. Segundo ela, Gurgel teria apalpado seus seios no elevador de um prédio residencial em Fortaleza. Ele nega e diz que a abordou para alertá-la sobre os riscos do tabagismo.
A situação é bizarra, mas infelizmente não é raro de acontecer com as mulheres, dentro e fora dos elevadores. Quem não lembra quando um homem apalpou as nádegas de uma nutricionista em um elevador na capital cearense, no último mês de março? Nas imagens da câmera de segurança, uma vítima aparentemente chocada. O homem simplesmente se apressa na fuga, quando ela enfim consegue reagir. Depois disso, outras denúncias contra este mesmo homem.
Acontece nos elevadores, nos ônibus, no cinema, no trabalho, em todo lugar. Homens tocam partes íntimas de mulheres sem permissão, como se fossem autorizados a fazê-lo pelo patriarcado. E são?
É preciso multiplicar as feministas e educar muito meninos e meninas para mover estruturas e mudar essa realidade. Não aceitamos a barbárie do estupro e tampouco estamos dispostas a calar diante da importunação sexual. Queremos andar na rua sem olhar abruptamente para os lados, buscando luz e mudando de calçada a cada movimento suspeito.
Queremos decidir sobre nossos corpos e parar de sentir que temos um alvo na testa pela simples condição de ser mulher. Dentro e fora das igrejas, muitas de nós já não aceitam as narrativas simplistas de crianças estupradas e assassinadas, cultuadas popularmente como santas. Suas histórias, na verdade, podem ser força motriz para transformar realidades.
O caso mais emblemático é o de Benigna, que a igreja conta ter dado a vida e virado mártir para proteger sua honra e manter-se casta. Uma vítima de estupro, perseguida por um conhecido da escola e assassinada cruelmente virou símbolo da castidade. Mas Benigna não teve escolha nem decidiu morrer.
Como ela, há muitas outras dando nomes de capelas e rituais pelo país - e também no interior do Ceará. De Maria de Bil à Mártir Francisca, são meninas estupradas cultuadas como santas desde o século passado porque há homens que, protegidos pelo patriarcado, se acham inatingíveis.
Todos os dias, temos que agir e mostrar que não são. A luta das mulheres ainda é muito básica: pelo direito de existir. Pouco a pouco, temos avançado. Multiplicar as narrativas e denunciar é um grito, mas só pela educação profunda vamos encontrar caminhos mais prósperos. Um dia, no país que santifica meninas estupradas e assassinadas, vamos nos sentir seguras para viver? Trocamos o culto pela proteção. Obrigada.
*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.