Quando uma mulher se empodera e liberta, quais os medos que ela aciona em você?

Foto: Shutterstock

A Organização Mundial de Saúde aponta que os maiores índices de depressão e tentativa de suicídio encontram-se nas mulheres. Apesar das mulheres possuírem maior rede de apoio, e geralmente terem mais recursos para falar sobre suas emoções (que muitas vezes, restringe-se entretanto em poder expor somente entre as próprias mulheres, não encontrando muito espaço para expor o que sentem com os homens) são cotidianamente impactadas pelo massacre de padrões culturais e sociais o que pode levar a uma rigidez entre o que deveria ser uma mulher: santa, mãe ou esposa, mantendo dissociadas todas as outras possibilidades.

Para todas as outras, que não se encaixem nesse perfil que envolve sutis e também brutais jogos de poder e sanções, resta a liberação do ódio e julgamento social: bruxas, putas, vadias e todas as demais nomenclaturas que possam autorizar o escárnio,  a violência e a discriminação por fugirem do estereótipo do que deve ser uma mulher dentro de expectativas que não são naturais e sim, construções históricas e culturais

Veja também

Muitas mulheres se sentem identificadas, confortáveis e respeitadas no lugar de esposa e mãe. Entretanto,  para muitas, a submissão na rigidez de se sacrificar pela família,  não dispor de recursos próprios, não ser ouvida, ser alvo constante de desqualificação e abandono, fingir risos complacentes enquanto o coração sangra de desrespeito, ser colocada eternamente em papel de coadjuvante, ouvir assédios sem poder confrontar, não poder trabalhar nem estudar, mesmo desejando; ocupando postos de trabalho com salários menores mesmo com competências maiores, assumindo a responsabilidade de sustentar o casamento a despeito de traições e violências,  pode ser devastador para a sensação de respeito e conforto consigo. 

Quando essas vivências passam a ser constantes na vida das mulheres, a sensação de insegurança,  dúvida sobre suas capacidades,  desconhecimento de suas ideias e desejos, culpa em relação ao corpo e suas escolhas, podem produzir sofrimentos, que acumulados, aumentam a probabilidade de adoecer.

As mulheres, que existem em pluralidade e diversidade, incomodam, principalmente quando confrontam, quando pensam; quando ocupam lugares que fogem da tradição (que muitas vezes encontra-se aliada a um discurso de poder e dominação), quando desejam, quando tomam posse do seu corpo, quando se permitem a sexualidade, quando revelam a impotência e o desamparo que nos constituem, quando expõem a fragilidade dos que não sabem amar nem cuidar, elas podem ser assustadoras. Talvez por isso sejam contidas (química, discursiva, simbólica, econômica, política, socialmente) com discursos, medicações, ameaças,  violências. 

Nascida em uma estrutura patriarcal, a educação de muitas mulheres é a de preparo para o silêncio, para a obediência, para a invisibilidade, ou para a fala do que é permitido, para mostrar o que for autorizado. Muitas mulheres rompem com o que lhe seria destinado enquanto estrutura e alcançam lugares de fala e visibilidade. Mas para muitas, a realidade é de medo, silêncio e submissão que se expressam em dores no corpo e na alma. 

Existem produções discursivas sutis, que envolvem produções de “marketing”, lógica de consumo e de poder, que cobram muito caro pelo lugar de produto e objeto posto a uma mulher. E que muitas vezes, sem nem perceber, são internalizados e tornam-se parte das identificações,  tornando-se estas defensoras da lógica patriarcal e da violência e silenciamento destinados a outras mulheres e a si mesmas.

Sem se darem conta, começam a adoecer, deprimir, ficarem ansiosas, por se perderem na miragem impossível de estarem atreladas a quererem ser aquilo que fantasiam que desejam dela: o chefe, o esposo, os filhos, as instituições, as outras mulheres, distanciando-se da possibilidade de apropriarem-se de sua própria voz e desejo. 

Por muito tempo não tínhamos direito a voto, direitos, orgasmos, a fala. Quando uma mulher se expressa com sua própria voz, quebra o uníssono e aponta a riqueza e complexidade da diferença, rompe estruturas de milênios,  pode denunciar opressões e injustiças, e revela que desejo tem que ser conquistado e não imposto, demarcando o poder do não para o narcisismo.   

Embora possa parecer uma questão que importa somente às mulheres, não o é. Essa discussão envolver a boa parceria entre todos que compõem o laço social, diz sobre a forma como equacionamos respeito, ética, justiça social e qual a distância e altura com a qual olhamos uns para os outros.

Quando uma mulher se  empodera e liberta, quais os medos que ela aciona em você?



Assuntos Relacionados