Vara que julga homicídios de facções em Fortaleza concentra 30% das denúncias do MPCE
A intensificação do conflito entre facções motivou o Poder Judiciário a criar uma unidade, em Fortaleza, voltada para julgar crimes contra a vida cometidos por organizações criminosas. No primeiro ano de funcionamento, a 6ª Vara do Júri já concentra cerca de 30% das denúncias formuladas pelo Ministério Público do Ceará (MPCE), entre as seis Varas do Júri da Capital.
As seis unidades judiciárias julgam crimes dolosos contra a vida em geral - homicídios, tentativas de homicídio, infanticídios, abortos e instigações ao suicídio - ocorridos em Fortaleza.
Segundo o promotor de justiça do MPCE e secretário executivo das Promotorias de Justiça do Júri de Fortaleza, Ythalo Loureiro, "a demanda maior está indo para a 6ª Vara do Júri, cerca de 30% (das denúncias). Os outros 70% ficam nas outras cinco varas do Júri".
"O próprio computador faz o sorteio (de processos) de maneira equitativa entre as cinco varas do júri, mas exclui a competência exclusiva da 6ª Vara, de toda demanda que tenha o crime conexo de organização criminosa", explicou o promotor de justiça.
A juíza da 3ª Vara do Júri da Comarca de Fortaleza, Daniela Rocha, detalhou que, para o Ministério Público denunciar uma pessoa tanto por um crime contra a vida como por integrar organização criminosa, "é necessário ter realmente elementos que denotem a participação daquele indivíduo que cometeu o crime da organização criminosa".
"Muitas vezes, a motivação tem alguma ligação com organização criminosa, mas não fica bem claro, e eles (promotores de justiça) denunciam sem o conexo. Vai sempre haver casos, mesmo se tratando desse contexto de organização criminosa, em que não vai ter o conexo", ponderou a magistrada.
ações penais, aproximadamente, tramitam na 6ª Vara do Júri de Fortaleza, segundo o promotor de justiça Ythalo Loureiro. A Unidade conta com um colegiado de três promotores de justiça, para denunciar os crimes em conjunto; e com três juízes, que também tomam as decisões em colegiado.
Para Loureiro, o número de denúncias do Ministério Público do Ceará contra faccionados, por crimes contra a vida, em Fortaleza, irá se multiplicar nos próximos anos. "Talvez seja uma Vara que, daqui a 2 ou 3 anos, tenha um número de processos suficientes, inclusive, para se criar uma segunda vara de homicídio e organização criminosa, ou transformar uma das cinco varas numa vara especializada nessa matéria", projetou.
A percepção é corroborada pela juíza Daniela Rocha: "Vai ser uma demanda cada vez mais crescente. E deve chegar algum momento de ter a necessidade de criação de uma outra Unidade com essa mesma competência ou, talvez, que se pense em fazer como se fez com a Vara de Organizações Criminosas, que atualmente tem cinco magistrados e se revezam para formarem o colegiado".
A magistrada, que atua nas Varas do Júri desde 2015, lembrou que, naquela época, "a configuração do crime era diferente. A gente tinha aquelas disputas de território de tráfico, mas tinha muito aquela configuração das gangues de bairros. Não era essa configuração das facções criminosas".
"Havia feminicídios, que eram tratados como homicídios, e aqueles crimes comuns, como briga de bar. Esses casos, hoje, são raros aqui. A grande maioria dos processos que chega é por disputa entre organizações criminosas", completou a juíza.
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Primeiros julgamentos em novembro
O trabalho dos colegiados de promotores de justiça e juízes, em 9 meses de funcionamento da 6ª Vara do Júri de Fortaleza, já levou à marcação dos primeiros julgamentos da Unidade.
A primeira sessão de julgamento está marcada para novembro deste ano. Quatro acusados de integrar uma facção criminosa vão a julgamento por matar um ex-comparsa, que manifestou o desejo de abandonar a organização criminosa. A vítima foi morta 12 dias após sair do presídio, onde cumpriu 5 anos de pena por um crime contra o patrimônio.
A reportagem solicitou mais informações ao Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) sobre o caso, mas não recebeu retorno até o fechamento desta matéria.
Talvez seja uma Vara que, daqui a 2 ou 3 anos, tenha um número de processos suficientes, inclusive, para se criar uma segunda vara de homicídio e organização criminosa, ou transformar uma das cinco varas numa vara especializada nessa matéria."
Outro julgamento foi marcado pela 6ª Vara do Júri para o dia 18 de novembro deste ano, às 9h. O réu Klayver Silvino Dias, conhecido como 'Espanha', deve sentar no banco dos réus para ser julgado pela morte de Boniekson Cauan dos Santos Alves, no bairro Jangurussu, em Fortaleza, na noite de 11 de fevereiro de 2024.
Conforme a denúncia do Ministério Público do Ceará, cerca de cinco homens chegaram a um bar, localizado na Rua C do Conjunto Habitacional Euclides da Cunha, e efetuaram vários disparos contra os clientes. A vítima foi atingida e morreu no local.
A investigação da Polícia Civil do Ceará (PCCE) apontou que os criminosos eram ligados à facção cearense Massa Carcerária, que teria o objetivo de atacar e tomar uma região dominada pela facção rival Guardiões do Estado (GDE).