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Oposição se articula no Nordeste para 2022, mas evita embarcar no bolsonarismo

Diante da avaliação do presidente na região, opositores minimizam aproximação direta nos maiores estados nordestinos, apesar de acenos

Escrito por Igor Cavalcante , igor.cavalcante@svm.com.br
Bolsonaro no Rio Grande do Norte
Legenda: Na mais recente visita ao Nordeste, Bolsonaro esteve no Rio Grande do Norte na quinta (24)
Foto: Presidência da República

Ter um presidente da República como aliado pode ser o passe para que muitos políticos também consigam se eleger para outros cargos públicos. Em alguns dos maiores estados do Nordeste, porém, o cenário que se desenha para 2022, mesmo nos grupos políticos hoje na oposição, parece ser outro.

Opositores aos atuais governadores já discutem abertamente as chapas majoritárias para o próximo ano. Contudo, os pré-candidatos até agora mais competitivos evitam colar a própria imagem à do presidente, apesar das recentes investidas de Jair Bolsonaro (sem partido) em se aproximar dos nordestinos.

É na região que o presidente amarga o pior desempenho entre o eleitorado, seja em dados históricos, seja em números recentes. Em 2018, quando conquistou a cadeira no Palácio do Planalto, o Nordeste foi a única região em que ele perdeu em todos os estados.

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Levantamentos recentes de diversos institutos de pesquisa também apontam que, três anos depois, a região é onde ele é mais rejeitado. Para cientistas políticos, esse mau desempenho por ser uma pedra no sapato para aliados na região. 

“Além de não ter uma avaliação positiva no Nordeste, a popularidade dele oscila muito por aqui. Para um aliado dele na região, isso é arriscado, é uma oscilação grande”, avalia a cientista política e professora universitária Carla Michele Quaresma. 

De olho em 2022

Para amenizar as críticas à própria imagem e articular aliados – e palanque – para 2022, o chefe do Executivo nacional passou a fazer visitas mais frequentes à região. Em janeiro deste ano, esteve em Sergipe. Em fevereiro, visitou obras em uma rodovia federal no Ceará. À época, também esteve na Paraíba. No mesmo mês, ele havia desembarcado em Pernambuco. 

Em abril, esteve na Bahia inaugurando trecho de 22 km de uma estrada. Em maio, o presidente foi ao Maranhão e ao Piauí inaugurar uma ponte. Também em maio, esteve em Alagoas. Na última quinta-feira (24), Bolsonaro visitou obras de uma barragem no Rio Grande do Norte. 

Em uma região governada por nomes da esquerda e da centro-esquerda, mesmo a oposição evita a associação direta ao presidente. Apesar de algumas aproximações pragmáticas, o discurso bolsonarista é adotado apenas por um restrito grupo de aliados, apontam analistas políticos. 

Rejeição nordestina

No ano passado, a disputa pela Prefeitura de Fortaleza ilustrou essa situação. E para 2022 o mesmo cenário pode se repetir. O deputado federal Capitão Wagner (Pros) chegou a receber apoio nominal do presidente. Contudo, evitou usar a imagem do chefe do Executivo nacional na campanha.

O vídeo em que Bolsonaro enaltece o parlamentar foi usado, na verdade, por José Sarto (PDT), adversário de Wagner, para tentar minar a popularidade do concorrente. 

O deputado federal já anunciou que deve novamente concorrer a um cargo majoritário no próximo ano: ele almeja o Governo do Estado. Como parte das articulações, na última semana, Dayany Bittencourt, esposa do parlamentar, se filiou ao Republicanos, partido nacionalmente alinhado a Bolsonaro. 

Wagner-Dayanny
Legenda: Esposa de Capitão Wagner, Dayany Bittencourt se filiou ao Republicanos, partido aliado do presidente
Foto: Reprodução

Conforme projeta a cientista política Carla Michele Quaresma, a aproximação entre Wagner e o presidente pode ser, novamente, informal.

“Desde a campanha (de 2020) que ele oscila. Na época, ele assumia essa proximidade, mas se dizia independente. O mesmo discurso do senador (Eduardo) Girão. Eles dizem que concordam com algumas ações do Governo, mas discordam em outros momentos, mantendo uma independência”. 
Carla Michele Quaresma
Cientista política

“Essa oscilação, inclusive, é muito reveladora, porque talvez o apoio do Wagner traga mais benefício ao presidente, por ter um palanque no Ceará, do que para o próprio Wagner”, acrescenta.

Para a cientista política, um discurso alinhado a Bolsonaro é suficiente para atrair um eleitorado fiel no Nordeste em disputas para o Legislativo. No entanto, quando a corrida é por uma vaga no Executivo, é preciso suavizar o tom para atrair mais apoiadores. 

“Numa disputa majoritária, esse discurso truculento sozinho não elege. Tanto que o presidente, para ser eleito, precisou juntar o antipetismo, a insatisfação política, a linhagem liberal, a turma da igreja, os militares e outros grupos”, afirma. 

Oposição na Bahia

Análise semelhante faz o cientista político Cláudio André de Souza, professor da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab) na Bahia. Segundo ele, entre os baianos, os nomes de oposição até fazem acenos ao presidente, mas fogem de uma aproximação direta. 

“O ex-prefeito de Salvador, ACM Neto, é quem congrega a oposição por aqui. Eles tiveram (no ano passado) uma vitória importante em cidades da região, como Salvador, Camaçari, Vitória da Conquista e Feira de Santana, então esse avanço, somado à vitrine que foi a gestão do ACM em Salvador, dá competitividade à oposição”. 
Cláudio André de Souza
Cientista político

Desde a eleição para a Presidência da Câmara dos Deputados, o DEM vive um racha interno. Presidido por ACM Neto, o partido teve integrantes votando em Arthur Lira (PP-AL), nome apoiado pelo presidente Bolsonaro, mesmo com a candidatura de Baleia Rossi (MDB) tendo como principal cabo eleitoral o então presidente da Casa, Rodrigo Maia (à época, DEM).

Desde então, ACM Neto passou a ser acusado de se aliar a Bolsonaro. O ex-prefeito de Salvador nega e se diz independente. “Nem oposição, nem base de Bolsonaro”, reforça.

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Legenda: ACM Neto (à direita), que congrega a oposição na Bahia, nega aproximação com Bolsonaro e diz ser independente
Foto: Agência Brasil

“Essa postura não é à toa, ela decorre de pesquisas que apontam uma larga base de apoio ao petismo e ao ex-ministro Ciro Gomes (PDT) na Bahia. Bolsonaro não encontra terreno fértil por aqui”, avalia Cláudio de Souza.

Palanque duplo 

“Esse cenário leva o ACM Neto a ser muito cauteloso no diálogo com as bases bolsonaristas. E é interessante perceber como ele trabalha com o palanque duplo, com Bolsonaro e Ciro, já que ele fez muita questão de trazer o PDT para a base da Prefeitura”, acrescenta. 

Por outro lado, um antigo aliado do ex-prefeito tem usado a imagem de Bolsonaro para tentar se tornar mais competitivo na região. O ministro da Cidadania, João Roma (Republicanos), é apontado nos bastidores como possível candidato ao Governo do Estado.

Neste mês, em evento virtual com aliados da região, o presidente declarou que “João Roma é o futuro da Bahia”. O ministro não descarta enfrentar a disputa, mas nega que já tenha sido escolhido. 

“Ele tem circulado bastante, tem se reunido com prefeitos, vereadores e lideranças políticas. É uma figura na disputa, mas que ainda vem buscando, ainda é algo incipiente", avalia Souza.

“Outras figuras que se mostram mais próximas ao Bolsonaro são o deputado Elmar Nascimento (DEM) e o vereador Alexandre Aleluia (DEM), mas não vejo uma liderança bolsonarista com efetiva viabilidade eleitoral para ser posta como terceira via”, conclui o cientista político. 

Pernambuco

Em Pernambuco, o grupo de oposicionistas ao PSB parte da própria esquerda e chega a nomes alinhados ao Governo Federal.

“Podemos dizer que são duas linhas de oposição, uma mais à esquerda, que defende a deputada federal Marília Arraes (PT) como candidata, e outra mais à direita, formada por partidos que nacionalmente apoiam o presidente, mas ainda assim não têm um discurso fortemente bolsonarista”, explica a cientista política e professora universitária Priscila Lapa. 

Entre os mais cotados para disputar vaga no Governo do Estado estão os prefeitos de Petrolina e de Jaboatão dos Guararapes, Miguel Coelho (MDB) e Anderson Ferreira (PL), respectivamente. 

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Legenda: Miguel Coelho, com o pai, Fernando Bezerra, em reunião com Jair Bolsonaro
Foto: Reprodução

“Anderson é mais bolsonarista e tem a carreira política da família ligada a evangélicos. Ele é um dos poucos prefeitos que desfila com ministros do Governo Federal, assim como Coelho, que também tem um forte discurso de oposição ao PSB”.
Priscila Lapa
Cientista política

O emedebista é filho do senador Fernando Bezerra (MDB), líder do Governo no Senado. 

“O que percebo em Pernambuco é que ser bolsonarista e antipetista não é o que define a eleição. Apesar de ter havido um crescimento da direita aqui no Estado, ainda existe uma memória forte dos Governos Lula, e é comum haver a comparação. O que define mais a oposição é essa ideia de derrotar o PSB”, acrescenta.

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