Editorial: O caminho do meio

Vai longe o tempo que as telas eletrônicas eram um tipo de oferta moderada, do televisor único nas casas a ser dividido por todos em uma família. Nas últimas três décadas, seu uso se transformou drasticamente. As telas tornaram-se quase onipresentes, proporcionando um estímulo contínuo e, por vezes, atordoante. Videogames, computadores pessoais, modelos portáveis, smartphones, tablets e outros gadgets multiplicaram-se e se massificaram numa sequência de produtos inovadores.

Não é raro ver adultos às voltas com a indagação: o uso que se faz das telas e, por meio delas, do acesso à internet e das redes sociais é excessivo? A resposta não é inequívoca, mas, nesta faixa etária, uma mudança exige apenas decisão e empenho próprios. Quando envolve crianças e adolescentes, as dúvidas são ainda maiores – assim como a angústia de pais e responsáveis, pois cabe a eles a decisão e a ação.

Tendo em vista estas questões, que motivam embates acalorados, mas por vezes podres de referências e reflexão especializada, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) lançou um manual de orientação sobre a exposição às telas de crianças e adolescentes às telas eletrônicas, à internet e às redes sociais. O documento foi elaborado pelo Grupo de Trabalho Saúde na Era Digital, do triênio 2019-2021. Já no título, deixa expressa sua inequívoca tese. Para os pediatras que elaboraram o manual, a fórmula almejada é “#Menos Telas #Mais Saúde”.

“A aceleração das redes sociais pela Internet com a multiplicação do acesso aos vários aplicativos e jogos online direcionados às crianças e adolescentes, requer cada vez mais o alerta e a atenção de todos que lidam com as tarefas de responsabilidade dos cuidados de saúde durante a infância e a adolescência, principalmente dos pediatras”, alerta o texto do documento.

A questão tem exigido revisões constantes das respostas por parte dos especialistas. Integra uma linha de orientações sobre a temática editada pela SBP, começando pelo “Manual de orientação: saúde de crianças e adolescentes na era digital” (2016) e seguido de “A criança de 0 a 3 anos e o mundo digital” (2017) e “Benefícios da Natureza no Desenvolvimento de Crianças e Adolescentes” (2019).

O manual “#Menos Telas #Mais Saúde” passa a largo de qualquer radicalismo, como o de quem propõe uma abolição do uso de dispositivos digitais. Afinal, em si, não há problemas com estes recursos. O prejudicial, entendem os especialistas médicos, é seu uso imoderado. Recomenda-se evitar a exposição de crianças menores de 2 anos às telas, sobretudo de forma passiva. Entre os 2 e 5 anos, o limite máximo recomendável é de uma horas por dia uso; de duas horas, para crianças de 6 a 10 anos; e de três horas para os adolescentes até 18 anos. É desencorajada a prática de virar a noite em jogos eletrônicos. 

Não se deve, contudo, vilanizar a tecnologia, nem tratar o abuso destes recursos de forma descontextualizada. A família – e o documento da SBP endossa esta ideia – é determinante quanto ao uso desregrado das telas. Há problemas sociais, e este é um deles, que é impulsionado pela negligência em relação dos filhos, que recorrem a fugas e compensações. A solução, afinal, passa pelo afeto e pela atenção.