Fiz um comentário, há poucos dias, ressaltando que os ingleses, além de inventarem o futebol, deram a esta modalidade, desde sua infância, a maioria dos modelos táticos para jogá-la.
Não se trata de ufanismo afirmar que o brasileiro, com a sua habilidade, ginga e memória corporal adquirida, deu à prática futebolística uma plasticidade bem particular.
Com o tempo, o nosso futebol teve que se amoldar à organização de jogo determinada pelas mudanças esquemáticas, fato perfeitamente normal, sem ter que abrir mão do jeito de jogar diferente, criado naturalmente.
A isso chamamos de essência brasileira, naquilo que Chico Buarque bem definiu no ensaio “os donos do campo e os donos da bola”.
Quando conquistamos o bicampeonato mundial, os europeus, em particular, chegaram à seguinte conclusão: “para superar os brasileiros, somente com preparo físico que nos permita correr o dobro deles”.
Em campo, a partir daí, o debate que se tornou eterno entre futebol-força e futebol-espetáculo.
Se valendo de métodos científicos e tecnologias que permitiram a melhora da saúde, os europeus tiraram da prancheta traços do nosso modelo e amoleceram as cinturas.
A tecnologia sempre mudou o homem e suas práticas.
O jogo se tornou mais rápido, os jogadores mais lentos ganharam velocidade, os campos de jogo passaram a parecer menores e o “jogar bonito” foi sendo secundarizado, em nome do protagonismo coletivo.
Mesmo assim, é possível ver beleza no futebol.
Acontece que as novas gerações da crônica esportiva (com exceções) cismaram em dizer que não existe “resgate da essência” do futebol brasileiro porque ela sempre foi uma mentira, um papo de tradição.
Aí, é para encerrar a conversa.
É que, nesses tempos de algoritmos, likes e outras “cositas” modernas, a palavra tradição deixou de significar cultura, ética, costumes, hábitos, memória.