Os investimentos em hidrogênio verde no mundo e no Ceará poderão ser acelerados como consequência do conflito entre a Rússia e a Ucrânia. Segundo economistas consultados pela reportagem do Diário do Nordeste, a tensão geopolítica deve forçar países a antecipar os planos relacionados à transição energética, o que pode beneficiar o Estado.
Conforme o economista Alex Araújo, os efeitos da guerra fizeram com que vários países da Europa revissem planos para depender menos do fornecimento de petróleo e gás natural vindo da Rússia. A União Europeia vem aplicando sanções diretas à Rússia, envolvendo até mesmo o bloqueio de compra dessas fontes de energia.
Para tentar se adaptar às novas demandas internas e à discussão ambiental crescente no mercado global, países europeus deverão impulsionar investimentos em hidrogênio verde.
"Há duas discussões que a guerra antecipou, como o processo de transição energética, e olhando a Europa, que depende da Rússia e a inflação do custo do petróleo, que já teve uma crise nos anos 1970 onde houve uma perturbação de preços, mas quase 50 anos depois não houve mudança da matriz. Mas com essa fragilidade exposta, a arma da Rússia é usar a dependência da Europa para petróleo e gás e aí o hidrogênio verde ganha força", explicou Araújo.
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A perspectiva foi corroborada por Ricardo Coimbra, economista e conselheiro do Conselho Regional de Economia (Corecon) Ceará, que destacou a existência de um projeto na Europa para eliminar o uso de veículos movidos à combustão, o que deve potencializar a busca por novas fontes de energia, como o hidrogênio verde.
E a busca por mercados fornecedores poderá favorecer os projetos no Ceará, já que o Governo do Estado já vem trabalhando iniciativas para favorecer o crescimento do setor de energias renováveis.
"Esse processo de aceleração de energias alternativas deve crescer significativa não só pela questão do petróleo e gás russos, mas porque na Europa já temos um programa de encerrar a comercialização de carros movidos a combustíveis fósseis. A tendência é que tenhamos energias renováveis e hidrogênio verde tanto nas unidades produtivas quanto nos veículos. Isso pode acelerar investimentos e pode ser benefício para o Ceará que vem trabalhando esses setores da economia", disse Coimbra.
Contudo, apesar da perspectiva otimista, Araújo comentou que o Estado ainda precisaria focar em algumas agendas para garantir capacidade de atendimento da demanda global por hidrogênio verde e questões internas do mercado produtor.
Ele destacou a necessidade de se investir em programas de capacitação de mão de obra, infraestrutura de exportação no Porto do Pecém, adaptação da matriz energética e do uso de água. Contudo, o Ceará já estaria "saindo na frente" de outros estados por já ter montado planos para essas questões.
Esses investimentos, além de garantir a viabilidade do mercado interno do lado produtivo, ainda seriam importantes para reduzir os custos do hidrogênio verde, que ainda precisa competir com o hidrogênio marrom (produzido a partir de carvão vegetal), 20% mais barato atualmente.
"Há uma série de agendas que precisam ser pensadas, mas há uma questão de equalização de preços do hidrogênio verde. O marrom custa 20% menos e isso gera uma preponderância, porque se usa carvão mineral. Mas temos essas agendas por capacitação de pessoas, adequação de infraestrutura porque nenhum porto brasileiro está preparado para isso, equalizar a matriz elétrica, e o uso de água. Temos agendas de pontos críticos, mas isso já está planejado para o Ceará, diferente do outros estados. Já sabemos o caminho a percorrer", explicou.
Araújo ainda ressaltou que essas questões de mercado, focadas no fornecimento e geração de energia limpa, já está causando mudanças nas relações diplomáticas no mundo, fortalecendo a posição do Brasil nas negociações com Estados Unidos e União Europeia. Essas mudanças de acordos comerciais deverão ainda enfraquecer as relações com a China.
Contudo, essas perspectivas podem fortalecer o Ceará nas cadeias internacionais, por já estar se preparando para receber investimentos em hidrogênio verde. O Estado já confirmou 16 acordos de entendimento para investimentos no setor.
"Eu acho que isso faz parte dessa agenda de reaproximação. O Brasil já negocia com o Canadá por fertilizantes, e a diplomacia europeia está próxima da brasileira para criar canais de comércio. Temos um movimento para engrossar essa relação com a América Latina por conta do posicionamento do Brasil, e isso pode fortalecer o mercado de hidrogênio, dependendo, claro, da demanda global", explicou.