Quando e como a Ceará Filmes, projeto de desenvolvimento audiovisual lançado em 2017, será efetivada

Governo prevê construir instituição dedicada ao fomento do cinema cearense com previsão de lançamento para 2026

Legenda: 2024 marca centenário do cinema cearense
Foto: Guilherme Silva / Divulgação

São mais de sete anos desde que o então governador Camilo Santana anunciou de forma oficial um projeto dedicado ao desenvolvimento do audiovisual cearense. Entre burocracias, pandemia e outras demoras, a Ceará Filmes chega a 2024 como uma promessa ainda não entregue, mas com novos passos importantes rumo à concretização.

Em entrevista à coluna, a secretária da Cultura do Ceará Luisa Cela adianta que a previsão de ter a Ceará Filmes “operando”, em formato ainda a ser determinado, é 2026. Em entrevista por telefone, a gestora destrincha os próximos passos e o cenário “positivo” para a concretização deste “sonho muito antigo” do setor audiovisual cearense.

Ceará Filmes foi lançada oficialmente em evento em maio de 2017 com a presença de autoridades e nomes do setor audiovisual
Legenda: Ceará Filmes foi lançada oficialmente em evento em maio de 2017 com a presença de autoridades e nomes do setor audiovisual
Foto: Carlos Gibaja / Divulgação

Consultoria, seminário e pesquisa entre próximos passos

Trabalhos mais intensos e deliberativos acerca da Ceará Filmes têm ocorrido desde o início do ano e devem seguir nos próximos meses. Uma consultoria de implantação será efetivada com Alfredo Manevy, que foi da Agência Nacional do Cinema (Ancine) e contribuiu com a criação das empresas públicas Spcine (SP) e Bahia Filmes (BA), referências para a experiência cearense. 

Em paralelo, haverá um seminário de escuta — das demandas do campo no Estado, das experiências exitosas do tipo no Brasil e na América Latina e, ainda, da estrutura interna do Governo — e o aprofundamento de uma pesquisa sobre o aspecto econômico do setor — que deve traçar, conforme Luisa, “o tamanho, a quantidade de profissionais, de empresas e recursos que ele movimenta no Estado”.

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O investimento para os três passos — a consultoria, o seminário e a pesquisa — será de R$ 1,5 milhão, valor advindo de parte dos rendimentos dos recursos repassados ao Estado para o audiovisual pela Lei Paulo Gustavo.

O total de rendimentos dos recursos da LPG, segundo a secretária, está em torno de R$ 5 milhões. R$ 1,5 milhão será utilizado para o processo de construção da Ceará Filmes e o restante, adianta ela, será utilizado para convocar artistas e projetos entre os classificáveis dos editais da LPG, conforme pactuado no Conselho Estadual de Políticas Culturais

Tramitação em 2025, operação em 2026

A definição da consultoria e das próximas fases foi fruto de ações realizadas ao longo de 2024. Desde o início do ano, Grupos de Trabalho (GT) com representantes do setor, da Secult e dos institutos Dragão do Mar e Mirante — Organizações Sociais que fazem gestão de equipamentos da rede pública — têm se reunido para estabelecer as prioridades de ação.

O cronograma definitivo de cada uma das fases futuras será fechado após reuniões entre o consultor, os GTs formados e a pasta. A meta da Secult é entregar os resultados destes movimentos ao governador Elmano de Freitas até o final do ano

“Nosso desejo é que a gente tenha o ano de 2025 para as tramitações — para criar essa instituição, tem uma tramitação na Assembleia Legislativa — e (para) iniciar o processo de implantação, para que a gente em 2026 esteja — seja com agência, seja com empresa pública — operando e fortalecendo as políticas para o audiovisual no nosso estado”
Luisa Cela
secretária da Cultura do Ceará

Agência ou empresa?

O momento que se abre para a Ceará Filmes a partir de agora, define Luisa, será para “ouvir o campo cultural” e “se debruçar sobre o programa, investimentos, para definir qual é o formato dessa instituição”. 

Entre as possibilidades citadas pela gestora, estão o de uma empresa pública e de uma agência. A escolha de modelo será debatida a partir de “aspectos que precisam ser compreendidos dentro da dinâmica específica do Ceará”.  

“Uma agência se vincula a um papel regulador, seria esse o caso? Ou é o caso de fomentar o mercado e a indústria do audiovisual do Ceará criando mecanismos mais ágeis, que se conectem de uma forma mais precisa às exigências do mercado?”, pondera a gestora.

As respostas devem vir com a realização do seminário previsto. “É uma expectativa muito grande no setor esse momento, porque a gente — apesar de estar com esse grupo de trabalho que tem representações — precisa ampliar esse processo de escuta”, destaca.

“O seminário vai ser um momento importante tanto para a gente ouvir as experiências que existem no Brasil e no mundo, como para a gente também ouvir ali as expectativas de forma mais ampliada das pessoas que fazem o audiovisual cearense”, avança.

Cenário positivo da política à produção

O momento pujante do cinema cearense — com sucessivas estreias nas últimas semanas e um provável recorde de lançamentos neste ano — é destacado pela secretária como exemplo da força do audiovisual.

São filmes, ressalta, que “foram premiados em importantes festivais no Brasil e fora, com cineastas cearenses, boa parte deles frutos de capacidade de trabalho e articulação de criatividade do campo cearense e contando com apoio de políticas públicas”.

“Isso nos dá uma leitura política da importância desses apoios para que os profissionais do setor audiovisual possam se destacar e trazer para o nosso estado uma visibilidade muito importante e, claro, também contribuir para abrir outras frentes de desenvolvimento econômico
Luisa Cela
secretária da Cultura do Ceará

“A gente acredita que o Ceará pode fortalecer ainda mais essa importância do audiovisual do Brasil e nos apresentar de forma honrosa para o Brasil e o mundo inteiro, como a gente tem visto já com o que  nossos cineastas têm feito”, segue.

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Para tanto, Luisa reforça um entendimento necessário — e cada vez mais fortalecido — do potencial econômico não só do audiovisual, mas da economia criativa.

“Para o investimento para o funcionamento da empresa, nós imaginamos que, além da fonte do tesouro estadual, nós teremos também parcerias”, ressalta a secretária, citando, além da Ancine, o Banco do Nordeste (BNB) e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

“Assim como o BNB e o BNDES fomentam outros tipos de indústria, acreditamos que vamos conseguir linhas de financiamento para a indústria e o mercado audiovisual do Ceará”, confia a gestora.

“Não resta dúvida que os setores criativos, e dentro deles o audiovisual, são uma via em que o Brasil e o Ceará têm potencial imenso de crescimento. Estamos apostando muito nisso e, claro, com uma conjuntura política da força do setor audiovisual e dessas instituições favoráveis para a gente concretizar isso”
Luisa Cela
secretária da Cultura do Ceará

Investimento indefinido  

Em relação a valores futuros de investimento para a concretização de fato da Ceará Filmes, a secretária prefere esperar definições necessárias, como a do formato. 

“Qual o tamanho dessa empresa, o custo de funcionamento, as políticas que vai desenvolver? Tudo isso precisa ser respondido para que a gente possa estimar um valor de investimento”, argumenta. Além disso, Luisa também lembra da necessidade de definir se o futuro programa centralizará ou não determinados investimentos.

“O governo tem uma média, sem considerar os recursos federais, de investimento de R$ 15 milhões através do edital, que é a principal forma de fomento, mas tem programas que a Porto Iracema, o Centro Cultural Bom Jardim, o Museu da Imagem e do Som desenvolvem”, aponta. “Vai ser avaliado em que medida isso permanece nessas instituições, em que medida isso será centralizado. Isso tudo é objeto da consultoria”, explica.

Histórico da Ceará Filmes

“O desejo de se constituir uma instituição que estivesse dedicada ao fomento e à valorização do audiovisual no estado do Ceará é um sonho muito antigo. Lembro logo do Rosemberg (Cariry) como um cineasta que capitaneou, junto de outras pessoas do campo cultural, esse desejo e essa luta”, reconhece Luisa Cela.

O primeiro esboço apresentado ao público do projeto data de maio de 2017, quando Camilo apresentou a Ceará Filmes como o “Programa Estadual de Desenvolvimento do Audiovisual e da Arte e Cultura Digital”. 

Contextos de crise na Agência Nacional do Cinema (Ancine) — que seria parceira inclusive financeira do programa —, no entanto, impactaram à época na viabilização do projeto.

Assinatura da mensagem de lei que instituiu a Ceará Filmes foi assinada pelo então governador Camilo Santana (à direita) em dezembro de 2021, no encerramento do Cine Ceará
Legenda: Assinatura da mensagem de lei que instituiu a Ceará Filmes foi assinada pelo então governador Camilo Santana (à direita) em dezembro de 2021, no encerramento do Cine Ceará
Foto: Salvino Lobo / Divulgação

A atual titular da Secult, que compunha a gestão como secretária executiva, lembra de falas públicas do então governador “se comprometendo” com a criação da Ceará Filmes novamente em 2019. 

Os impactos da chegada da pandemia “associada ao desmonte das políticas culturais” a nível federal, como define Luisa, adiaram a concretização. “Realmente foi muito desafiador e a gente não conseguiu cumprir, fazer essa entrega da instituição. Focamos, então, na formulação da lei”, explica.

A sanção da lei que criou a Ceará Filmes, então, ocorreu em dezembro de 2021. O texto da ocasião, aponta Luisa, “estabelece linhas, responsabilidades e diretrizes para essa política”.