Crise diplomática dos deportados entre Brasil e EUA vira dor de cabeça para o Ceará

Se Fortaleza se tornar a porta de entrada para esses imigrantes, um problema social e econômico se impõe para o Estado

Escrito por
Inácio Aguiar inacio.aguiar@svm.com.br
(Atualizado às 09:20)
Legenda: Deportados podem fazer o Ceará ter que resolver um problema que não é seu
Foto: Divulgação/ Governo do Amazonas

A crise procedente da imigração entre Brasil e Estados Unidos ganhou contornos diplomáticos e práticos que recaem diretamente sobre o Ceará. Com a intensificação das deportações em massa sob o governo de Donald Trump, o Aeroporto Internacional de Fortaleza se tornou, sem planejamento prévio, a porta de entrada dos brasileiros devolvidos ao país, o que é bastante preocupante. 

A mudança ocorreu após a polêmica cena do primeiro voo com deportados, que pousou em Manaus no fim de janeiro, quando imagens de brasileiros algemados e acorrentados nos pés repercutiram negativamente em todo o País. A prática, criticada por especialistas como uma violação da dignidade humana, levou o governo brasileiro a um ajuste estratégico: direcionar os voos para Fortaleza, ponto mais próximo dos EUA no território nacional, o que minimizaria o tempo de sobrevoo de cidadãos brasileiros nessa condição. 

A decisão, no entanto, não foi negociada com o governo cearense, conforme apurou esta coluna nos bastidores. O Estado foi informado oficialmente apenas na última segunda-feira (3), com menos de uma semana para a chegada do primeiro voo. A falta de tempo hábil para estruturar um plano de recepção gerou a primeira dor de cabeça para as autoridades locais. 

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Falta de informações e logística incerta 

O primeiro voo com deportados sob a nova política de Trump traz 135 brasileiros, sendo 80% de Minas Gerais. As poucas informações repassadas pelo governo americano dificultam o planejamento da recepção. O que se sabe até agora é que não se trata de um grupo em situação de vulnerabilidade social, o que significa que os deportados terão que arcar com seus próprios custos de deslocamento para seus estados de origem. 

O Estado do Ceará deve disponibilizar apoio psicológico e assistência social, mas não oferecerá passagens nem hospedagem. Esse modelo de recepção pode funcionar para um voo isolado, mas se a frequência aumentar, como tudo indica, será inevitável a criação de uma estrutura fixa para lidar com a situação ou uma cobrança mais incisiva ao governo federal para assumir a responsabilidade. 

Impacto na economia e no turismo 

Além do desafio social e diplomático, há um problema econômico relevante. Fortaleza é um dos principais destinos turísticos do Brasil e recebe vários voos internacionais diariamente, especialmente da Europa e dos Estados Unidos. 

O Aeroporto Pinto Martins tem estrutura limitada, com policiamento federal reduzido e alta demanda operacional. Se a chegada de deportados se tornar frequente, a pergunta que se impõe é: quem será priorizado – turistas estrangeiros legais ou deportados brasileiros? 

A sobrecarga pode comprometer a eficiência do atendimento, gerar atrasos e manchar a imagem da cidade como um destino turístico, impactando a economia local. A questão precisa ser discutida com urgência entre as autoridades cearenses, o governo federal e o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva, para que Fortaleza não se transforme, de forma improvisada, na principal porta de retorno dos deportados do governo Trump. 

A crise dos deportados é um problema diplomático entre Brasília e Washington, mas que agora aterrissa diretamente na capital cearense, trazendo desafios que vão muito além do desembarque de um grupo específico de passageiros.