Município de Sobral é condenado a indenizar advogada obrigada a servir café e lavar louça; entenda

Decisão do TJCE reconheceu que a profissional foi vítima se assédio moral por superior hierárquica, fixando indenização em mais R$ 68 mil

Legenda: A autora alegou que foi obrigada a servir café, limpar sobras e lavar louças, entre outras atividades compatíveis com a função de serviços gerais, o que a fez ser conhecida na região como a "advogada do cafezinho"
Foto: Shutterstock

O município de Sobral, no Norte do Ceará, foi condenado a indenizar uma advogada contratada para exercer as funções de assessora jurídica, mas que, na prática, foi obrigada a exercer funções de serviços gerais. Segundo o processo, a profissional tinha que servir café, limpar sobras e lavar a louça, além de atuar como recepcionista, a depender do dia da semana. A prefeitura nega as irregularidades.

A decisão da 2ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) reformou parcialmente a sentença da primeira instância. O valor estipulado para a indenização foi de R$ 68.167,40, sendo R$ 30 mil por danos morais, R$ 1.855,40 por reparação material (emergentes) e mais R$ 36.312 por danos materiais (lucros cessantes), fixados pelo Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Sobral.

De acordo com o processo, a advogada passou em 1º lugar na seleção para assessora jurídica do município de Sobral, em 2017, sendo lotada no Centro de Referência Especializado para Pessoas em Situação de Rua (Centro POP).

"Advogada do cafezinho"

Ao assumir o cargo, contudo, a autora alega que foi direcionada a servir café, limpar sobras e lavar louças, entre outras atividades compatíveis com a função de serviços gerais. A reclamante disse que chegou a ser conhecida na região como a "advogada do cafezinho"

Além disso, ela alegou na ação que sofreu com tratamento degradante e humilhante, sendo exposta ao ridículo por parte de uma das coordenadoras do órgão administrativo em que permaneceu lotada, caracterizando, além do desvio de funções, assédio moral e todo tipo de pressão psicológica. 

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Ela disse ainda que foi forçada a trabalhar em um prédio que se encontrava em reforma, o que a levou a adquirir pneumonia, bronquite e asma. A situação, ainda conforme o apontado nos autos, levou a advogada a desenvolver um distúrbio depressivo, levando-a a rescindir o contrato de trabalho.

Recurso ao TJCE

Objetivando aumentar o valor da reparação por danos morais, a autora ingressou com apelação no TJCE, ao entender ser desproporcional a indenização para as alegadas agressões que causaram sequelas permanentes e danos psicológicos.

O relator do processo no TJCE, desembargador Raimundo Nonato Silva Santos, considerou robustas as provas apresentadas pela autora, reconhecendo como fato a alegação de que ela serviu ao município e foi vítima se assédio moral por parte de sua superior hierárquica imediata. Além disso, o magistrado dobrou o valor da indenização por danos morais estipulado na primeira instância.

Reconhece-se que os fatos ocorridos ensejaram notórios danos morais à parte autora, todavia, o arbitramento do quantum indenizatório referente aos danos extrapatrimoniais não traduz numerário apto a reparar as adversidades suportadas pela requerente, ora apelante, merecendo a sua majoração para a quantia de R$ 30.000,00 (trinta mil reais)"
Desembargador Raimundo Nonato Silva Santos
Relator do processo no TJCE

Segundo ele, o novo valor se adequa melhor "aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, de modo a repreender o ofensor e coibir a prática de novos atos abusivos", explicou.

Prefeitura de Sobral nega irregularidades

Procurada pela coluna, a Prefeitura de Sobral informou "que não foi intimada do acórdão objeto da matéria do site do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará e que, desde já, repudia e discorda da decisão".

A gestão municipal também afirmou que "nunca houve eventual desvio de função da então servidora temporária enquanto esta prestava serviços ao município, tampouco assédio moral", mesma alegação da defesa no processo, acrescentando que "as atividades de acolhimento tinham como fim promover maior interação com o público atendido".

Ainda na ação, a defesa do município alegou não haver relação entre as doenças da autora e suas atividades profissionais. "Assim, tão logo seja intimada da decisão proferida, a Procuradoria Geral do Município (PGM) apresentará recurso e demonstrará a inexistência do fato", disse a prefeitura em nota.