Dia difícil para os gordofóbicos

Simplesmente não dá pra ser simplista com a saúde de ninguém, e com pessoas gordas não seria diferente

Escrito por
Elaine Quinderé verso@svm.com.br
Legenda: Confiar apenas no cálculo do IMC para diagnóstico da obesidade é extremamente problemático
Foto: Freepik

Para quem já lê a minha coluna que, em breve, completa um ano, já me viu escrever e falar sobre esse assunto uma pá de vezes. Se você é novo por aqui, seja bem-vindo e repare bem a bagunça, pode começar pelos textos “Parem de romantizar a obesidade!” e “O estigma do peso nos impede de salvar e sermos salvos” para ter uma introdução perfeita do que vou falar hoje. 

Sim, é sobre ela: a obesidade. Mais precisamente sobre como essa semana foi uma semana difícil para os gordofóbicos de plantão. Todas as vezes que escrevi aqui “será se o IMC é a métrica correta e ideal para medir a saúde de uma pessoa?” eu sabia que um dia os humilhados seriam exaltados.  

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O ponto é que em pleno 2025 a medicina evoluiu ao ponto de fazer a gente se perguntar se vale a pena sofrer tanto preconceito por causa de um cálculo matemático. Afinal de contas, quando resolveram definir a obesidade como uma doença crônica e multifatorial lá nos anos 1970, mais ou menos, a “intenção” era que pessoas maiores tivessem um melhor atendimento no ambiente clínico. Mas como de boas intenções o inferno tá cheio, nada disso aconteceu.

Corta pra janeiro de 2025, e o The Lancet lançou um artigo científico para falar de uma reformulação de cuidado com pessoas gordas. Isso mesmo, meus caros, uma luz no fim do túnel. O The Lancet, só a título de informação, é uma revista semanal da área das ciências médicas, que se diferencia por não veicular apenas testes clínicos e artigos sobre resultados de pesquisa.

Por ser a publicação com mais credibilidade na área, e também a mais antiga, ela tem um peso maior por organizar comissões para produzir grandes relatórios, o que a permite influenciar e intervir na área política.

Pessoas com obesidade, sejam elas gordas ou magras, precisam de um cuidado holístico e é isso o que propões a Comissão sobre Obesidade Clínica, formada por 56 especialistas de todo o mundo nessa nova publicação na revista.

Para cuidar de alguém, é preciso sair da piscininha rasa e ir além do IMC, pois ele é um dos fatores que mais afastou e estigmatizou a saúde de pessoas maiores, especialmente.

De acordo com Robert Eckel, professor de medicina da Universidade do Colorado, confiar apenas no cálculo do IMC para diagnóstico da obesidade é extremamente problemático. Pessoas sem o IMC alto, que seria o indicativo para a doença, ainda podem armazenar excesso de gordura em torno dos órgãos, como fígado e coração.

Como já falei aqui em uma outra coluna, o IMC foi criado há muitos anos e serve muito bem para um cálculo de amostragem, para entender o índice de uma doença a nível populacional; mas quando falamos do um a um, ele não é suficiente para avaliar a saúde de um paciente.

Por isso, a reformulação propõe que existam categorias da obesidade, ou seja, para o diagnóstico existem dois tipos de obesidade: a clínica, que inclui pacientes com prejuízos no funcionamento dos órgãos e redução da sua capacidade de realizar atividades diárias comuns; e a pré-clínica, que é quando o quadro se caracteriza pela função normal do corpo, ou seja, pessoas vivendo com esse tipo não apresentam nenhuma doença, mas necessitam de acompanhamento médico mesmo assim.

Não, a obesidade não deixou de ser doença mas, pelo menos, com essa reformulação já podemos ver que todas as pessoas podem estar incluídas nessas categorias, independentemente do corpo que tem.

*Este texto reflete, exclusivamente, a opinião da autora

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