Pessoas magras, nem tudo é sobre vocês

Eu sei que estar sempre no auge mexe com a nossa autopercepção de tal forma que, quando não estamos mais no topo, temos a sensação de que perdemos alguma coisa; pelo menos é o que eu acho, eu nunca estive no topo.

Legenda: Ashley Graham no desfile Victoria's Secret Fashion Show deste ano
Foto: ANGELA WEISS / AFP

Essa semana ocorreu o desfile da marca Victoria's Secrets, que passou por um hiato de seis anos e, na última terça-feira, reuniu os nomes mais icônicos da passarela: de Kate Mossa à Adriana Lima - além de outras figurinhas carimbadas da marca.

Nesse retorno, a marca trouxe uma cara diferente para o desfile. Não foram só as típicas angels que desfilaram, a Victoria's Secrets tentou trazer diversidade para a passarela. Mulheres mais velhas, mulheres de corpos maiores… pequenos atos que fazem com que a gente quase sinta o gosto da mudança. Uma quase sensação de frescor. Corpos que anos atrás jamais vestiriam sequer uma meia da marca.

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Mas a verdade é que se olhar de perto a gente percebe que essa mudança vem com um limite, onde você pode até ser diferente, mas sempre dentro de uma régua muito específica. Colocando um limite nesse limite a gente continua vendo o inalcançável.

Ser uma angel da Victoria's Secrets ainda é inalcançável

Vamos começar pelo mais sintomático: mulheres jovens e magras vestem uma roupa (normalmente, as roupas de baixo mais interessantes, reveladoras e sensuais da marca), enquanto que as mulheres de corpo maior vestem uma outra roupa (muito mais coberta, disfarçando possíveis imperfeições e desconfortos visuais que um corpo grande pode causar). Nas entrelinhas, eu leio: você pode até vestir a minha roupa e desfilar na minha passarela, mas o seu corpo não será o destaque.

A brasileira Adriana Lima voltou a desfilar pela marca
Legenda: A brasileira Adriana Lima voltou a desfilar pela marca
Foto: ANGELA WEISS / AFP

A famosa modelo e apresentadora Tyra Banks também participou nesse desfile de retorno, dessa vez, mais velha e habitando um corpo curvilíneo. Para quem não lembra, ela foi apresentadora durante anos do reality show chamado America's Next Top Model. Eu amava, mas ela foi o meu terror durante a adolescência com seus comentários gordofóbicos sobre as modelos participantes.

No desfile, ela foi vestida da cabeça aos pés, com direito até à capa, para que este novo corpo não tivesse tanta visibilidade. Eu, particularmente, tenho dificuldade de sentir compaixão mesmo que hoje ela sofra do mesmo algoz que eu.

Tyra Banks também participou do evento
Legenda: Tyra Banks também participou do evento
Foto: ANGELA WEISS / AFP

Em tempos de ozempic e mounjaro, a gente precisa se questionar: quem cabe dentro dessa pseudo diversidade? De que adianta aderir às pautas das minorias se for pra continuar moldando pessoas? Não sendo propósito, é só mercantilização das dores de alguém.

E você aí pode me perguntar: então, a intenção é fazer um desfile só com pessoas fora do padrão? Sim.

 

*Este texto reflete, exclusivamente, a opinião da autora

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