Na disputa pelos Datacenters, Brasil pode criar Novo Colonialismo Digital

De um lado, o PBIA que prega IA para o bem de todos, de outro, o Regime Especial de Tributação para Serviço de Datacenter

Escrito por
Egídio Serpa egidio.serpa@svm.com.br
(Atualizado às 14:10)
Legenda: Os Datacenters são consumidores intensivos de energia elétrica renovável. E estão sendo disputados pelo mundo todo.
Foto: SVM
Esta página é patrocinada por:

O texto a seguir foi elaborado para esta coluna por um especialista na área da Tecnologia da Informação, o professor Mauro Oliveira, PhD em Informática (Sorbonne University) e mestre em Engenharia Elétrica (PUC-Rio), tendo sido secretário de Telecomunicações do Ministério das Comunicações. Pela atualidade do tema, pelo seu qualificado conteúdo e pela oportunidade, esta coluna o divulga a seguir porque o considera de interesse público:   

“O espírito original do Plano Brasileiro de Inteligência Artificial (PBIA), concebido como uma política de “IA para o bem de todos”, parece ter se perdido nos corredores do Ministério da Fazenda.   

“Ao lançar o Regime Especial de Tributação para Serviços de Data Center (Redata), o Ministro Hadad adota uma rota contrária àquela traçada pelo PBIA: em vez de fortalecer a autonomia tecnológica, o desenvolvimento nacional e a soberania digital, opta por um modelo de incentivo que amplia nossa dependência das bigtechs e terceiriza o futuro da inteligência brasileira.   

“No livro ‘Soberania Digital – Colonização & Letramento’, já alertávamos: o atraso na política de Ciência & Tecnologia e no letramento digital pode custar caro uma nova colonização digital, silenciosa, sedutora e de difícil retorno.   

“O Redata, apresentado nos EUA como “oportunidade fiscal”, transforma o Brasil em paraíso para as bigtechs, ao oferecer isenção de PIS, Cofins e IPI em troca de contrapartidas tímidas: 2% em P&D e 10% da capacidade de uso nacional.     

“Enquanto isso, o PBIA propõe o fortalecimento de uma nuvem soberana e a proteção de dados estratégicos sob jurisdição brasileira. O Redata caminha na direção oposta: atua como atalho colonial high-tech, transferindo soberania e benefícios para o exterior, entregando território, energia e futuro.   

“Os data centers de IA generativa consomem energia em escala de usina e atraem big techs ao Sul Global em busca de em busca de energia limpa, impostos baixos e uma sociedade distraída. Enquanto isso ameaça transformar o Brasil em refúgio do colonialismo digital, o PBIA propõe o caminho oposto: ampliar a infraestrutura nacional, criar centros de supercomputação e desenvolver uma IA ética e soberana, voltada ao bem comum.   

“O contraste é gritante: o PBIA sonha com um Brasil protagonista; o Redata o reduz a colônia digital. Se viesse de um governo liberal, seria chamado de entreguismo.    

“Para apimentar o quadro de especulações, o vice-presidente Alkimin declarou ontem (27/out/25) ao jornal O Globo a respeito das negociações com o Trump sobre o Tarifaço: ‘O diálogo sempre envolve também questões não tarifárias, datacenter. Importante aprovar a MP no Congresso porque isso estabelece, atrai investimento – que é o Redata. O Brasil tem energia abundante ...’   

“O Brasil não precisa das isenções do Redata lá fora, e sim da direção do PBIA aqui dentro — uma política de soberania digital e desenvolvimento nacional.   

“Ainda há tempo, Haddad: convoque as universidades, institutos de pesquisa e empresas brasileiras a colaborarem, como no bem-sucedido Sistema Brasileiro de TV Digital do primeiro governo Lula (2003).   

“Porque, no fundo, o que está em jogo é o direito de escrevermos nossa história com as próprias mãos. É sobre ter o próprio código, o próprio pão, a própria voz... sem tradução, sem permissão, sem pedir desculpas.” 

Veja também