Governo Lula: quem sou eu, de onde venho, para onde vou?
Há uma crise na sua relação com o mercado e com o Congresso, mas há boas saídas que exigem decisões de estadista

Não confunda o Deus da crença com o Cristo da fé! Para os que acreditam naquele, hoje, sexta-feira, 13, é um dia em que os azares acontecem. Para os féis cristãos, porém, esta é uma data muito propícia à renovação dessa fidelidade.
Elaborado o introito acima e indo diretamente ao que de fato interessa, o governo do presidente Lula – incluindo seus ministérios da área da economia que pelejam contra os da área política – deve estar a perguntar-se: quem sou eu, de onde venho, para onde vou?
Lula nasceu no meio do povo mais pobre. Líder metalúrgico, voz potente contra o regime militar, ele se tornou, no fim dos anos 60 do século passado, o queridinho da mídia, do mundo sindical, dos intelectuais e da chamada igreja progressista, sob cujo pálio propagou suas ideias e sua ideologia. Tornou-se o rosto brasileiro mais conhecido no exterior, depois de Pelé. E, após algumas frustradas tentativas, elegeu-se presidente da República. E reelegeu-se. Agora, cumpre seu terceiro mandato cercado de graves dificuldades políticas, econômicas, financeiras e sociais, que só fazem crescer.
Neste momento, as contas públicas – deficitárias há 11 anos – exigem providências muito duras para ajustar-se. Seu ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e sua ministra do Planejamento, Simone Tebet, tentaram aumentar a alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), mas o Parlamento e o invisível e sempre presente mercado reagiram.
“Aumento de impostos, não”, advertiram os líderes dos partidos da base governamental e a liderança empresarial, na opinião dos quais o governo precisa, urgentemente, de reduzir suas despesas, que se mantêm em aclive.
O estado brasileiro é mastodôntico, custa caro, gasta muito e gasta mal, é ineficiente, entrega serviços de péssima qualidade – é só ver o que se passa na saúde, na educação, na segurança pública e na infraestrutura. Para sustentar esse estado e os privilégios da casta que se apossou dos três poderes da República – Executivo, Legislativo e Judiciário – o governo só enxerga uma saída: o do aumento de sua receita, que já é extraordinariamente elevada. Cortar despesas – mesmo aquelas que, por meio de penduricalhos, multiplicam por três os vencimentos de magistrados e procuradores federais e estaduais, causam ojeriza à população – nem pensar. Parece haver um pacto político para permitir essas desigualdades e para manter o “status quo”.
Na quarta-feira, o governo editou uma Medida Provisória que, sem cortar seus gastos, elevará – a partir de janeiro de 2026, um ano eleitoral – a alíquota do Imposto de Renda de áreas sensíveis do setor financeiro. Por exemplo: pagarão o IR as Letras de Crédito da Agropecuária (LCA) e as Letras de Crédito Imobiliárias (LCI) , uma das principais e mais utilizadas ferramentas de financiamento do agronegócio e da indústria da construção civil, hoje isentas desse tributo.
Os que produzem e trabalham no campo – onde está a locomotiva que puxa o trem da economia brasileira, a maior e mais moderna do mundo – protestam. A Frente Parlamentar da Agropecuária, com mais de 200 deputados e senadores, já anunciou que votará contra. E a direção do União Brasil e do PP, partidos da base política de Lula no Congresso, promete a mesma posição, o que ameaça a aprovação da MP.
O governo tem à sua disposição uma montanha de dinheiro de mais de R$ 600 bilhões que não entra na sua receita porque se referem a renúncias fiscais, incluindo a que beneficia, há 50 anos, a Zona Franca de Manaus e o agro e a indústria do Nordeste e do Norte de Minas e do Norte do Espírito Santo. Por que não reduzir o tamanho dessa renúncia para permitir o reajuste fiscal? Porque será mexer em um vespeiro que tem siglas poderosas, como CNI, CNA, CNT, CNC e Febraban.
Mas o governo pode, ainda, encaminhar ao Parlamento projetos-de-lei estruturantes, como o da Reforma Administrativa, por meio da qual redesenhará toda a gigantesca, arcaica, viciada e corrupta estrutura do serviço público. Será uma decisão política que só os estadistas ousam adotar.
A austeridade – acreditem – produz popularidade, mas para alcançá-la é exigida muita coragem dos que governam. No caso do Brasil, além da coragem, exige-se que verdadeiros sejam os números, as estatísticas e todas as informações oficiais.
Esse conjunto de medidas causará, no curto prazo, a reversão do quadro de crise, a começar pela retomada da popularidade. Haverá um custo, que será, nas ruas, o imediato protesto dos setores prejudicados pelas medidas, mas isto durará pouco. O produto dessa mudança, todavia, garantirá a eleição ou a reeleição de quem vier a liderá-la.
A próxima semana será de embates nas duas casas do Congresso Nacional, nas quais serão reverberados as opiniões e os comentários dos economistas, dos analistas e dos operadores do mercado.
Não se enganem: o Parlamento brasileiro tem os mesmos defeitos e virtudes dos seus congêneres dos EUA e da Europa. Aqui como lá, os lobbies agem sem a menor cerimônia.
NA PECNORDESTE, UM QUEIJO COM “TERROIR” CEARENSE
Na recente Pecnordeste, maior feira indoor da agropecuária brasileira, um dos estandes mais visitados foi o da Fazenda Santa Mônica, de Quixeramobim, onde o casal de empresários Valéria e Cândido Quinderé produz queijos especiais maturados por até seis meses.
O presidente da Fiec, Ricardo Cavalcante, e o da Faec, Amílcar Silveira, visitaram-no, e surpreenderam-se com a alta qualidade dos queijos e, mais ainda, com a original e inovadora explicação técnica que o casal Quinderé lhes transmitiu sobre a origem dos seus produtos. Esta coluna, testemunha da visita, anotou os argumentos, que são os seguintes:
“Poderíamos dizer que o nosso queijo apresenta um ‘terroir’ exclusivo, resultado da combinação de um microclima dos trópicos com o buquê da flora Catingueira e notas de um solo rico em dolomitas e magnetitas. Ou, também, poderíamos afirmar que, a partir das terras banhadas pelos rios Jaguaribe e Banabuiú, onde outrora viviam os índios Quixarás, foi encontrada uma botija com receita secular de um queijo perdido.”
Tem mais:
“Mas, melhor do que contar história, é fazer história. E a nossa é a história de uma família que, de geração em geração, aprendeu a tirar leite de pedra. Literalmente! Uma história de arte, empreendedorismo e muita fé. A história de um casal que criou um queijo com padrão internacional, que poderia ter sido feito nos lugares mais refinados do mundo, mas que carrega o sotaque da gente.
“Porque, se o Gouda é holandês, se o Provolone é italiano, se o Gruyère é suíço e o Cheddar é inglês, o Nossa Santa é daqui mesmo, do Sertão Central do Ceará. De Quixeramobim, da Fazenda Santa Mônica. Qual o tipo? Do tipo Nossa Santa”.
Explicação mais inovadora, impossível.
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