Economia do Mar: Ceará tem vocação marítima; falta estratégia marítima
É o que diz o economista Marcos Holanda, ex-presidente do BNB, para quem o potencial da economia do mar no Ceará é real e para o presente
Dedicado estudioso do desenvolvimento econômico, social e cultural do Ceará, o professor Marcos Holanda, engenheiro e PhD em economia, faz, a pedido desta coluna, um mergulho no gigantesco potencial que os quase 600 km de litoral de que dispõe o estado para incrementar sua economia.
Ele lembra que o mar cobre mais de 70% da superfície do planeta e movimenta algo entre US$ 3 trilhões e US$ 6 trilhões por ano. Se fosse um país, os oceanos seriam a quinta maior economia do mundo. Apesar dessa realidade, eles ainda são vistos predominantemente como paisagem, não como estrutura econômica.
“O Ceará vive esse paradoxo: tem vocação marítima, mas carece de estratégia marítima”, ele sentencia. E expõe sua opinião:
“Talvez o ponto de partida seja reconhecer que a economia do mar tem duas dimensões distintas, embora interligadas. Podemos chamá-las de economia azul escura e economia azul clara”, diz ele, acrescentando uma explicação:
“A economia azul escura é a que mais pesa no PIB. Nela estão o petróleo e gás, a pesca industrial, o transporte marítimo, a extração de minerais e os portos. Segundo estimativas da Marinha do Brasil, essas atividades movimentam cerca de R$ 2 trilhões por ano, algo como 19% do PIB do país. É o lado robusto, mas também o mais vulnerável aos ciclos de preço e à pressão ambiental.”
A partir de agora, Marcos Holanda agrega a polêmica aos seus argumentos:
“O Ceará tem potencial na pesca, eventualmente na produção de petróleo da margem equatorial e principalmente na transformação do porto do Pecém em um hub de graneis sólidos e líquidos. O problema aqui é que essas atividades agregam pouco valor a economia local. Podem gerar altos valores de exportação, mas não de PIB. O petróleo e gás natural garantem receita e soberania energética, mas é um modelo fóssil num momento em que o mundo discute transição energética. O transporte marítimo depende de navios e seguros estrangeiros. Já a pesca enfrenta desafios de sustentabilidade e informalidade. A economia azul escura é poderosa, mas carrega a velha tensão entre crescimento e conservação.”
Ele avança:
“Do outro lado, há a economia azul clara — menos medida, mais difusa, mas com enorme potencial de geração de renda, inovação e qualidade de vida. Nela estão os esportes náuticos, o turismo costeiro, as segundas residências, a gastronomia marinha, o patrimônio cultural das cidades litorâneas e as novas atividades criativas ligadas ao mar.
“O Ceará com seus 573 quilômetros de costa, tem todos os ingredientes para transformar o litoral em um vetor de desenvolvimento. O turismo náutico e a vida costeira podem gerar empregos formais, atrair investimentos e promover inclusão produtiva.”
Marcos Holanda sugere:
“Precisamos de um calendário de esportes náuticos inserido na programação internacional, infraestrutura náutica, marinas públicas, saneamento e ordenamento urbano das zonas costeiras. O estado deve consolidar-se como destino de turismo de alta renda e polo de gastronomia diferenciada.
‘É no mercado de segunda residência onde vejo o maior potencial do estado. O tamanho da população rica que demanda qualidade de vida só aumenta. Uma segunda residência virou um consumo padrão. Nesse mercado competimos com o mundo todo na oferta de praias belas, sol, gastronomia, lazer. Temos, no entanto, um diferencial cada vez mais importante no mundo de hoje onde somos quase que monopolistas. Somos um litoral livre de eventos climáticos extremos como tempestades, furacões, terremotos. Imaginem o estrago no mercado se segunda residência da Jamaica que semana passada foi devastada por um furacão. O caribe, México, sul dos Estados Unidos, leste asiático, todos tem clima de alto risco que encarece cada vez mais a construção e manutenção de residências. Temos que explorar de forma agressiva e profissional essa nossa vantagem comparativa.’
Ele conclui:
“O potencial da economia do mar no Ceará é real e para o presente. Muito se fala da economia verde, mas a economia azul também existe e precisa unir as duas cores — a força produtiva da azul escura com a vitalidade criativa da azul clara.”
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