Silenciosa, mas rapidamente, a China avança sobre a América Latina: ontem, 15, em Chancay, 80 quilômetros ao Norte de Lima, capital do Peru, o presidente chinês Xi Jiping e sua colega peruana Dina Boluarte inauguraram a primeira etapa do que será um megaporto chinês que reduzirá em 20 dias a viagem das commodities latino-americanas, principalmente as brasileiras, até os portos de lá, e dos produtos manufaturados de lá para os países deste continente.
Produtores e exportadores brasileiros de soja, algodão e minério de ferro e industriais importadores da Zona Franca de Manaus estão eufóricos com o início das operações do porto de Chancay, previsto para até o fim deste mês de novembro. Seus custos de transporte serão reduzidos pela nova logística de transporte à sua disposição.
O governo chinês, por meio da sua gigante estatal China Ocean Shipping Company (Cosco), maior empresa de infraestrutura do mundo, investiu US$ 1,3 bilhão na construção da primeira fase do projeto, que, quando concluído, dentro de mais três anos, terá consumido US$ 3,6 bilhões (R$ 19,1 bilhões).
Antes disso, a Cosco criou a Cosco Shipping Ports, que comprou em 2019 a maioria do capital da empresa que, desde 2013, tentava construir o porto de Chancay. O projeto do porto sob a direção chinesa, cujas obras começaram em 2021, prevê, inicialmente, quatro atracadouros, que serão 15 quando tudo estiver terminado no fim de 2027.
A obra causou e ainda causa polêmica no Peru, principalmente na área ambiental. Há estudos que mostram que espécies marinhas da fauna e da flora, que existiam no mar de Chancay, migraram ou, simplesmente, já não existem mais.
Para o milenar povo chinês, tudo o que existe sob o sol pertence à China, que está prestes a retomar sua antiga posição de maior potência econômica do mundo.
O porto de Chancay deve ser visto como um importante movimento da estratégia de Xi Jiping, que, ao assumir o poder em 2012, substituindo Hu Jintao, criou a Rota da Seda, que já estendeu seus tentáculos à Europa, à qual está ligada não só por caminhos marítimas, mas ferroviárias.
Ontem, sexta-feira, pela manhã, o governo da China celebrou a partida do seu 100.00º (centésimo milésimo) trem de carga, que, como os 99.999 anteriores, está transportando milhares de contêineres cheios de produtos da indústria chinesa para os consumidores da Europa.
O trem partiu de Chongqing, no Sudeste da China, e seu destino é a cidade alemã de Duisburgo, aonde chegará após 10 dias de viagem.
Informações divulgadas pelo Global Times, um dos maiores jornais da China, revelam que a rede de trens de carga China-Europa já se expandiu para 227 cidades de 25 países europeus e para mais de 100 cidades de 11 países asiáticos.
A construção do porto de Chancay vem sendo acompanhada desde o início pelo governo dos EUA, que o enxerga para além de um investimento econômico estratégico. Para os norte-americanos, os chineses têm, igualmente, objetivos políticos estratégicos, e podem transformar Chancay não só na Cingapura da América Latina, mas também numa plataforma militar.
Com a chegada, de novo, de Donald Trump à Casa Branca em janeiro, os norte-americanos, provavelmente, adotarão uma posição mais dura em relação à presença chinesa na área de sua direta influência – a América Central e a América Latina.
Enquanto esse olhar geopolítico não se aprofunda, operadores portuários acreditam que em pouco tempo Chancay poderá tirar de Santos o posto de principal porto marítimo latino-americano, uma vez que o equipamento terá o que de mais moderno existe para a movimentação de contêineres. O custo do frete marítimo entre Chancay e os portos chineses cairá substancialmente.
No Brasil as empresas chinesas investem em vários setores da atividade econômica, principalmente em energia, incluindo a construção de Linhas de Transmissão, e em projetos de infraestrutura, com foco em ferrovias, portos e aeroportos, além das telecomunicações.
O Brasil é, hoje, disparadamente, o principal parceiro comercial da China na América Latina, lugar que já foi ocupado pelos EUA. Na vizinha Argentina isso também começa a acontecer: o Brasil pode perder para a China a posição de parceiro preferencial dos argentinos.
É bom prestar mais atenção à China e às suas relações com o continente latino-americano e aos seus investimentos neste continente, principalmente no Brasil.
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