Brasil x EUA: a crise, que era econômica, agora é política

Lula critica Trump, que manda carta elogiando Bolsonaro e esclarecendo: sua política tarifária é forma de pressionar o governo brasileiro

Escrito por
Egídio Serpa egidio.serpa@svm.com.br
(Atualizado às 06:37)
Legenda: Lula e Trump escalaram a crise que era comercial e virou política, preocupando o empresariados do Brasil e dos EUA
Foto: Ricardo Stuckert /PR e Shutterstock /Joshua Sukoff
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Ontem, pouco depois das 19 horas, o mercado financeiro e o mundo da política foram surpreendidos com a divulgação de uma carta que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, transmitiu ao ex-presidente Jair Bolsonaro, na qual ele, intrometendo-se na vida nacional brasileira, diz, logo no primeiro parágrafo, o seguinte: 

“Tenho visto o tratamento terrível que você está recebendo pelas mãos de um sistema injusto que se voltou contra você. Este julgamento deve acabar imediatamente! Não me surpreende vê-lo liderando nas pesquisas; você foi um líder altamente respeitado e forte que serviu bem ao seu país. Tenho manifestado fortemente minha desaprovação, tanto publicamente quanto por meio da nossa política tarifária. (...) É minha sincera esperança que o Governo do Brasil mude de rumo, pare de atacar os opositores políticos e acabe com esse regime ridículo de censura. Estarei observando de perto".

Foi a resposta de Trump à entrevista que, mais cedo, o presidente Lula concedera à jornalista Cristiane Amanpour, âncora da rede de televisão norte-americana CNN Internacional. Nessa entrevista, Lula disse, entre outras coisas, o seguinte: 

“Nós não podemos ter o presidente Trump esquecendo que ele foi eleito para governar os Estados Unidos, e não para ser o imperador do mundo. Seria muito melhor estabelecer uma negociação primeiro, e depois alcançar um acordo possível, porque nós somos dois países que temos boas relações por 200 anos”.  

Lula também se referiu a Jair Bolsonaro, dizendo o seguinte: 

“Ele não está sendo julgado pessoalmente, ele está sendo julgado pelos atos que tentou organizar um golpe de Estado. Ele ameaçou, secretamente, a morte, planejou a morte do vice-presidente, a minha e a de um ministro do Supremo Tribunal Federal”. E ainda acrescentou que Bolsonaro deverá ser condenado à prisão pelo Suprema Corte brasileira. 

Imediatamente depois, a porta-voz da Casa Branca, Karoline Leavitt,  respondeu às críticas feitas pelo presidente Lula à posição dos Estados Unidos na escalada da guerra tarifária contra o Brasil. Segundo Leavitt, o presidente Donald Trump “não está tentando ser o imperador do mundo, mas sim exercer sua autoridade como líder de uma potência global”. 

Ontem à noite, aqui no Brasil, em cadeia nacional de rádio e televisão, o presidente Lula chamou alguns aliados de Bolsonaro de “traidores da pátria”. Pela manhã, Lula discursou no Congresso Nacional da UNE, em Goiânia, e disse que vai taxar as bigtechs, ou seja, as empresas de tecnologia norte-americanas que atuam no Brasil, como a Alphabet, dona do Google, a Apple, a Amazon, a Microsoft e a Meta, dona do WattsApp. 

Resumindo: Donald Trump e Luiz Inácio Lula da Silva escalaram a crise que era comercial e agora virou crise política e diplomática entre o Brasil e os Estados Unidos. Pelo que se depreende da leitura da carta de Trump e dos pronunciamentos de Lula, a questão agravou-se, e agora o empresariado brasileiro está ainda mais preocupado com o rumo que tomará a questão, uma vez que há nenhum sinal do governo norte-americano de que vá suspender ou prorrogar o início da vigência da tarifa de 50% imposta aos produtos brasileiros exportados para os Estados Unidos.  

E mais: não há conversas entre os dois lados, algo inimaginável, tendo em vista que ambos os países têm diplomacia de alto nível capaz de encaminhar uma solução negociada para o problema. 

Ainda ontem, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em entrevista à Agência Estado, disse que a taxa de 50% imposta ao Brasil “não faz sentido econômico” para os Estados Unidos. Haddad perguntou:

“Qual é o sentido de taxar suco de fruta, café e carne? São coisas que vão encarecer o café da manhã do americano.” 

Observa-se, claramente, que Donald Trump está usando sua política tarifária com o objetivo político de interferir em um assunto interno do Brasil, que é o julgamento do ex-presidente Bolsonaro, cujo filho, deputado Eduardo Bolsonaro, que está morando nos Estados Unidos, tem estreita ligação com Trump, a tal ponto que circula com desembaraço pelo Departamento de Estado norte-americano.

Os últimos pronunciamentos do presidente Trump foram influenciados por Eduardo Bolsonaro, que pretende, com isso, obter a anistia do pai e dos demais acusados de tramar um golpe de estado no Brasil, em fevereiro de 2023. 

Todas as atenções do empresariado e do mundo político brasileiros estão agora voltadas para o tempo que falta para o início da vigência da nova tarifa de 50% imposta por Trump aos produtos brasileiros exportados para os EUA. Essa preocupação é também dos empresários norte-americanos, que aguardam o que acontecerá se essa tarifa for mesmo implementada a partir do próximo dia primeiro de agosto.

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