O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, renunciou ao posto de líder do Partido Conservador nesta quinta-feira (7), mas continua como chefe do governo do país até que seu sucessor seja apontado.
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“Estou triste por deixar o melhor trabalho do mundo”, disse Johnson no pronunciamento à porta do número 10 de Downing Street, a residência oficial do primeiro-ministro.
Que ninguém ponha em causa os sentimentos do premiê, mas o que fica do discurso é a certeza de que Johnson é um populista derrotado que mente quando lhe convém.
“A razão pela qual lutei tão duro para continuar é porque achei que fosse meu trabalho, meu dever, minha obrigação, continuar a fazer o que prometi em 2019. Estou imensamente orgulhoso do que atingimos com esse governo”, disse o primeiro-ministro, assumindo um papel de vítima alheia aos sucessivos escândalos de seu governo.
Não houve qualquer referência aos caos político dos últimos dias, que culminou hoje.
A situação foi originada por um escândalo sexual. Em fevereiro deste ano, Johnson nomeou para vice-chefe da bancada do Partido Conservador no parlamento o então deputado Chris Pincher. No final do mês de junho, a imprensa britânica revelou a existência de denúncias contra Pincher por abuso sexual.
Na semana passada, o governo declarou que Boris Johnson não sabia dos casos, mas o discurso foi mudando consoante novas revelações surgiam na imprensa. Por fim, o premiê admitiu que "houve uma reclamação que foi trazida à minha atenção especificamente há muito tempo".
Johnson cedeu, declarou ter sido um erro nomear Pincher para a função e pediu desculpas à população.
A crise é instaurada não pelo fato de haver um membro do governo envolvido em escândalos sexuais, mas pela falta de confiança na palavra do premiê. Afinal, ainda é possível acreditar no que Boris Johnson diz?
Durante os últimos meses, acompanhamos a evolução do #partygate, as revelações de que vários encontros foram realizados na casa do premiê durante o severo lockdown instalado do Reino Unido por causa da pandemia.
Enquanto ninguém podia se despedir dos seus entes queridos vítimas da covid-19, Johnson e membros do governo estavam juntos bebendo vinho nos jardins de Downing Street.
Primeiro, ele negou. Com o surgimento de provas - convite enviado por um assessor, fotos - admitiu que errou e… pediu desculpas.
Um dos primeiros escândalos a dar repercussão foi a denúncia de que uma reforma da residência do primeiro-ministro foi paga por um doador do Partido Conservador.
A investigação de corrupção resultou em uma multa de mais de 17 mil libras ao partido pela Comissão Eleitoral porque Johnson não declarou o valor doado para a obra.
E agora, o que acontece no Reino Unido?
Boris Johnson disse que continua servindo ao país até que o Partido Conservador aponte o novo líder, que assumirá, então, como primeiro-ministro. Isso só deve ocorrer no outono europeu, em meados de setembro.
Com a crise, mais de 50 membros do governo pediram demissão em apenas dois dias, entre ministros de muita relevância e funcionários administrativos. As justificativas são as mesmas: não podemos continuar seguindo essa liderança.
Como vai continuar como premiê, Johnson precisa lidar com os cargos vazios e com a desconfiança geral. Dentro do próprio Partido Conservador existe a possibilidade de acelerar o processo para escolha do novo líder ou de apontar o vice-primeiro-ministro, Dominic Raab, como o chefe durante o período de transição, mas não existem precedentes para essa solução.
Para a oposição, caso os conservadores não “se livrem logo” de Johnson será convocado um voto de não confiança para retirá-lo do cargo, escreveu o líder trabalhista Keir Starmer em seu twitter.
Quem assumir no lugar de Boris Johnson segue como primeiro-ministro até dezembro de 2024, quando devem ser realizadas as próximas eleições gerais para o parlamento britânico, e vai ter que manejar as dificuldades que o Reino Unido enfrenta atualmente.
Aumento do custo de vida, alta inflação, greve de trabalhadores, permanência da Escócia, tratado com a Irlanda do Norte pelo Brexit, são algumas das questões internas, para além do cenário internacional, como a guerra na Ucrânia.
“Meus amigos, na política ninguém é remotamente indispensável”, disse Boris Johnson, num único ato de manutenção da verdade, e a hora da dispensa para Bojo chegou.
*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião da autora.