A épica viagem de Tico, o peixe-boi que fugiu do Ceará e se aventurou nas águas profundas da América

Durante semanas, especialistas mergulharam numa frenética busca internacional para resgatar o animal, ameaçado de extinção. Tico foi encontrado vivo, depois de percorrer cinco estados brasileiros e quatro países

Escrito por
Beatriz Jucá ceara@svm.com.br
(Atualizado às 15:29)
Legenda: Ele ainda era um recém-nascido quando foi resgatado pela primeira vez, em 2014, depois de encalhar nas areias da Praia das Agulhas
Foto: Divulgação

Tico é um peixe-boi que fugiu do Ceará e embarcou em uma jornada sem fim pela América Latina, com sua vida em risco. Com 2,7 metros e 301 quilos, é bastante sensível a barulho e a mudanças de rotina. Talvez por isso ninguém esperasse que ele fosse se aventurar em uma viagem incomum que, mais tarde, mobilizaria equipes em uma agitada busca por ele em águas nacionais e internacionais. Tico viveu, nos últimos meses, uma aventura de cinema.

Ele ainda era um recém-nascido quando foi resgatado pela primeira vez, em 2014, depois de encalhar nas areias da Praia das Agulhas, no leste do Ceará. Foi cuidado e reabilitado durante sete anos, até ser novamente devolvido à natureza neste ano. Voltou ao seu habitat natural por uma praia de Icapuí, com uma pulseira de GPS acoplada em sua cauda.

Monitoramento
Legenda: Tico viveu, nos últimos meses, uma aventura de cinema
Foto: Divulgação

Mas Tico, provavelmente desorientado, abraçou o incomum. Sua espécie, atualmente em risco de extinção, costuma viver próximo à costa, alimentando-se de plantas desses locais. Ele não. Mergulhou nas águas profundas, o que levou seus cuidadores a temerem por sua sobrevivência.

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Antes dele, estudos mostravam que os peixes-boi costumavam nadar a menos de 15 quilômetros da costa. Mas Tico seguia movendo-se em ritmo frenético e começou a quebrar recordes. Nadou mais de 4.000 quilômetros desde o último dia 7 de julho.

“Quando ele saiu do Ceará, começou a se movimentar muito rápido e distante da costa”, conta a bióloga Camila de Carvalho, técnica de monitoramento da ONG Aquasis que participou da empreitada e chegou a viajar até o Caribe em busca do animal. 

Tico chegou a até 200 quilômetros da costa. Viajou por cinco estados brasileiros ao norte, pela Guiana Francesa, pelo Suriname, pela costa de Tobago (no Caribe). Os pesquisadores da ONG cearense Aquasis começaram a temer que os sinais que recebiam já não fossem do animal vivo, e sim do aparelho levado pelo mar.

Tico
Legenda: Estado de saúde de Tico foi motivo de preocupação para ambientalistas
Foto: Divulgação

Mas quando receberam um vídeo de um pescador caribenho que o mostrava vivo, tudo mudou. “Foi uma surpresa para todos. Ele parecia bem, não aparentava estar tão magro”, celebra Camila. 

O peixe-boi então abriu uma verdadeira saga de buscas internacionais. Durante semanas, especialistas de vários países viajaram em carro e aviões por vários países, apressados em pegar barcos e tentar chegar a tempo no local em que o GPS apontava que Tico estava. Tentavam mover-se mais rápido que o peixe-boi, muitas vezes sem sucesso.

Camila foi até Tobago e contou com instituições internacionais para seguir as buscas pelo Tico. “Nunca imaginei que eu fosse tão longe em busca de um peixe-boi”, conta Camila. Até então, o máximo que os animais liberados no Ceará haviam ido era até o Piauí.

Especialistas
Legenda: Especialistas de vários países viajaram em carro e aviões por vários países, apressados em pegar barcos e tentar chegar a tempo no local em que o GPS apontava que Tico estava
Foto: Divulgação

O ritmo de aventura a esta altura já era bem diferente do início de suas buscas no Ceará, quando a ONG Aquasis pedia nas redes sociais qualquer informação de quem o visse nas praias locais. Em vão. O peixe-boi nadava e seguia rumo às áreas profundas, avançando em áreas internacionais em sua jornada épica.

Depois de tanto nadar e frustrar os envolvidos em suas buscas, Tico foi, enfim, resgatado no início deste mês de setembro em águas venezuelanas, mais precisamente na ilha de La Blanquilla. Em seguida, foi levado a um santuário para animais marinhos na Ilha Margarita.

Agora, seus cuidadores da Aquasis tentam resolver as questões internacionais para trazê-lo de volta ao Brasil. Só querem que o peixe-boi que empreendeu a mais extraordinária jornada pelo mundo volte em segurança.

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