De acordo com o dicionário da Língua Portuguesa Michaelis, a palavra bairro designa cada uma das partes em que se divide uma cidade; porção de território de uma povoação; arraial, povoado; área urbana onde moram indivíduos de uma mesma classe social. O que de fato é o bairro? Corresponde tão somente a uma referência de localização na cidade? Ou é algo mais?
Em uma das suas raízes etimológicas, nos registros do site origem da palavra, o vocábulo bairro aproxima-se de “lograr”, com sentido de desfrutar, saborear e obter o desejado. Muito além de uma palavra, ou um polígono tracejado num mapa urbano, o bairro representa a vida cotidiana, pintada pelas relações de identificação, diferença, conflito, vizinhança e convivência social.
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Para qualificá-los, os adjetivos são usados em abundância. Há os bairros centrais e os periféricos, os pobres e os ricos, os violentos e os vigiados. No popular, dizem até que existem os bairros nobres; eu estou a procurar tal nobreza para justificar o título.
Com diferentes origens, podem derivar de ocupações espontâneas ou resultar de planos de expansão imobiliária. Pelo longo tempo, repletos de monumentos, alguns têm muitas histórias a contar; outros, de tão recentes, são desconhecidos, exceto por seus moradores.
Existem aqueles onde as décadas passam lentamente e as paisagens não mudam; noutros, a casa que estava ali hoje, amanhã deu lugar a um arranha-céu. O cronista Rubem Braga, em 1957, escreveu uma lírica crônica chamada As Pitangueiras d’antanho. Nela, a velha senhora, moradora de Copacabana, onde sempre viveu, estranhava as mudanças no seu bairro, principalmente, o sumiço das árvores recobertas de pitangas. A senhora dizia: “tudo acabou: as casas, os jardins, as árvores. É como se eu não tivesse tido infância...”
Naquilo que já tínhamos dito, o caso da personagem de Rubens Braga constrói a ideia de bairro a partir do intenso fluxo das memórias. O bairro encarna a ideia de lugar, de marco significativo para a construção da história de vida de seus moradores e, por isso, as transformações registradas causam sensação de estranhamento.
Mesmo em cidades cada vez mais gigantes e estendidas, atravessadas por vias de tráfego, o bairro também pode significar uma organização territorial e comunitária. O efeito vizinhança e a construção de histórias coletivas, como a solução de problemas e a ajuda mútua, permite a coesão social, possibilita a organização política e, porque não, vira espaço para festivais culturais, cívicos e religiosos.
Por fim, o bairro pode vir a ser área de planejamento urbano. Essa diretriz de planificação, inclusive, consta em vários planos diretores de cidades cearenses, como é o caso de Fortaleza.
Imaginem como seriam potentes programas e projetos capazes de articular, num mesmo bairro, as funções das escolas, dos postos de saúde, do centro cultural, do posto de policiamento e das associações de moradores? Este não seria o caminho para reverter o problema da violência urbana e da ação dos grupos criminosos?
Na capital, em sua enormidade, há 121 bairros. Pela quantidade e diversidade, é óbvio que a metrópole reúne todos os exemplos e situações mencionadas neste texto. Vejo com bons olhos as iniciativas públicas que reconhecem a relevância dos bairros e organizam os serviços públicos a partir desta premissa.