Nos últimos meses, o futebol brasileiro presenciou um novo movimento no mercado: clubes de massa se transformaram em Sociedade Anônima do Futebol (SAF) e venderam ações para investidores externos. Foi assim, por exemplo, com Cruzeiro, Botafogo e Vasco. O modelo repassa o controle para um agente, mas recebe receita para quitar dívidas e formar os elencos.
Em dezembro, o Cruzeiro teve 90% das ações da SAF do time compradas pelo ex-jogador Ronaldo por 400 milhões. Em janeiro, o Botafogo firmou negociação nos mesmos moldes financeiros com o empresário norte-americano John Textor, enquanto o Vasco encaminhou o repasse de 70% para a holding 777 Partners, do EUA, por R$ 700 milhões, em decisão divulgada na segunda (21).
O principal interesse das equipes é o recebimento do aporte financeiro imediato ou dissolvido em anos. Em um cenário de dívidas altas, os clubes podem utilizar parte do valor da negociação para o pagamento de dívidas, mecanismo necessário na legislação dentro do novo mecanismo de gestão da SAF. Além de possibilitar a chegada de reforços de peso.
De modo simples, SAF é uma sigla para “Sociedade Anônima do Futebol”. Um modelo que foi criado na legislação brasileira em agosto de 2021, onde há permissão para clubes se transformarem em empresas, o que pode viabilizar a obtenção de investimento. Isso porque a maioria dos clubes do Brasil são “Instituições Sem Fins Lucrativos”, como os casos de Ceará e Fortaleza, por exemplo.
A decisão de migração de modelo é dos próprios clubes. Nos casos de sistemas sem fins lucrativos, a mudança exige uma mudança estatutária, o que necessita de aprovação no Conselho Deliberativo. O processo é seguido com a criação de uma empresa para ofertar “ações de futebol” no mercado.
Deste modo, o detentor da maior parte dos ativos se torna o sócio majoritário do clube, assumindo o controle das principais ações da agremiação, desde que cumpra pendências previstas na legislação. Assim, o rigor na fiscalização aumenta nos times, o que pode até decretar a falência de uma clube.
"A questão da SAF é uma questão jurídica que abriu essa janela para investidores dentro dos clubes. Dá uma segurança financeira e, por isso, o mercado está de olho. Hoje só entra nessa situação os clubes que estão endividados, que não tem fonte de receita para alavancar um projeto porque leva uns 10 anos para construir um projeto, e uma gestão acaba com tudo em um ou dois anos, se não existe controle fiscal, e a SAF foi um caminho que esses clubes encontraram no legislativo.
Hoje, o Ceará não se encaixa nisso, e ainda teria de passar por uma transformação junto ao Conselho Deliberativo do clube. Dificilmente, o nosso Conselho, com o clube saneado e em desenvolvimento, dentro da normalidade, iria aprovar uma mudança assim. Na questão estatutária, um clube bem ajustado pode se tornar uma SAF? Pode, mas para isso tem que passar pelo convencimento do Conselho e pela mudança do estatuto, mas é difícil porque se o clube está saneado, não vamos entregar o clube de bandeja para um investidor.
Claro que a gente não descarta jamais nada, porque não sabemos o dia seguinte, mas acho difícil de acontecer. Porque o investidor quer colocar dinheiro no clube, mas também ser majoritário nas ações, então se ganha dinheiro, mas perde a gestão. Esse é o problema da maioria das SAFs”.
"Eu acho que a SAF é um avanço para o futebol brasileiro. Eu defendo o livre mercado, em que as instituições podem fazer escolhas do melhor caminho a seguir, sem ser um único caminho. Vários clubes do Brasil são associativos, mas com a mudança da legislação, que tem se mostrado muito positiva, um acerto, começam a aparecer investidores internacionais para investir no futebol brasileiro e isso mostra como o futebol brasileiro é bem avaliado, agora com a possibilidade de maior segurança jurídica, o dinheiro começar a vir.
Os três clubes de maior impacto (no modelo da SAF), Cruzeiro, Vasco e Botafogo, são clubes que passaram por dificuldades e vão recuperar essa credibilidade no mercado com aporte financeiro e retomar o protagonismo, mas ainda não teve nenhum movimento desse em um clube que está organizado, para termos crescimento e expansão.
Também não houve nenhum ainda de adquirir ações minoritárias. Nos casos de Botafogo, Cruzeiro e Vasco são ações majoritárias e que, de fato, os investidores passam a ter um caminho do clube como um todo. É raro de acontecer nesse momento (a venda de ações minoritárias), mas é muito bom para o futebol brasileiro. O Fortaleza está atento a tudo isso, ciente do que ocorre no mercado".