Como lidar com o 'vômito emocional'

Há estratégias para oferecer apoio saudável e preservar o equilíbrio de quem cuida

Escrito por
Adalberto Barreto producaodiario@svm.com.br
Legenda: Essa sensação de impotência pode gerar uma autocobrança exagerada, resultando em frustração e desgaste emocional
Foto: Pexels

Ouvir o desabafo de um amigo é um gesto de empatia e solidariedade, mas é essencial estabelecer limites emocionais para evitar se envolver de maneira prejudicial. Quando a ajuda ultrapassa limites saudáveis, ela pode causar uma série de consequências negativas, tanto para quem oferece o apoio quanto para quem o recebe. Em primeiro lugar, o famoso “deixe comigo que eu resolvo”. Ao assumir responsabilidades que deveriam ser do outro, você pode acabar gerando sofrimento emocional para si, sobrecarregando-se com problemas que não são seus e que, muitas vezes, estão além de sua capacidade de resolver. Esse peso emocional pode levar ao desgaste, à frustração e até mesmo a sentimentos de inadequação ou sentimento de culpa.

O grande equívoco de quem ajuda é sentir-se responsável por aliviar completamente o sofrimento alheio, mesmo quando isso está fora do seu controle. Essa perspectiva nos lembra de que enfrentar dificuldades é parte essencial do desenvolvimento emocional e psicológico. Os desafios e tropeços ao longo do caminho servem como professores, nos ensinando lições valiosas e fortalecendo nosso caráter. Quando interferimos excessivamente, tentando suavizar o terreno para o outro, mesmo com as melhores intenções, podemos inadvertidamente interromper o aprendizado natural que vem da superação das adversidades.

Por vezes, o verdadeiro ato de apoio está em simplesmente estar presente, oferecendo um ombro acolhedor e uma escuta atenta, sem a necessidade de resolver ou consertar. Essa presença silenciosa permite que o outro se conecte com a própria força interior, descobrindo que é capaz de lidar com as dificuldades e crescer a partir delas. É nesse equilíbrio delicado entre estar ao lado e não intervir que reside a verdadeira arte de ajudar. Nos lembra o dito popular: “tudo que acontece de ruim é para melhorar a vida d’agente”.

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Essa sensação de impotência pode gerar uma autocobrança exagerada, resultando em frustração e desgaste emocional. Além disso, a dificuldade em estabelecer limites claros pode provocar a percepção de que dizer “não” ou recuar em certos momentos demonstra falta de empatia, quando, na realidade, cuidar de si é uma necessidade e não um ato de egoísmo. Esses sentimentos de culpa surgem, em especial, quando há um conflito entre o desejo de ajudar e a incapacidade de assumir mais do que é saudável ou possível. Sob a superfície da ajuda oferecida, muitas vezes reside um reflexo de nossas próprias questões internas.

Quando olhamos para o outro, percebemos nele um espelho, projetando nossos próprios dilemas, ansiedades e desejos de resolução. Sob o pretexto de querer resolver o problema alheio, podemos, na verdade, estar buscando uma forma de apaziguar as nossas inquietações. Esse ciclo de projeção pode ser perigoso, pois nos cega para a verdadeira necessidade do outro e nos prende a uma tentativa incessante de curar aquilo que ainda não enfrentamos em nós mesmos. É essencial, portanto, reconhecer quando nossas ações são impulsionadas mais pela nossa dor do que pela empatia genuína. Além disso, ao oferecer ajuda de maneira excessiva ou contínua, existe o risco de criar dependências emocionais.

A pessoa que recebe o apoio pode começar a acreditar que não consegue enfrentar seus desafios sem a sua intervenção, tornando-se dependente de você para tomar decisões ou lidar com dificuldades. Esse tipo de ajuda pode sufocar o crescimento pessoal de quem busca apoio. Quando você se antecipa em resolver os problemas do outro, sem permitir que ele enfrente suas próprias dificuldades, está, na prática, privando-o de oportunidades de aprendizado e fortalecimento emocional.

O ajudado perde a chance de desenvolver resiliência, autoconfiança e as habilidades necessárias para lidar com situações adversas no futuro. Respeitar limites, portanto, é essencial para a ajuda ser verdadeiramente benéfica. Oferecer apoio não significa assumir a carga do outro, mas sim criar um espaço onde ele possa se sentir compreendido e encorajado a encontrar suas próprias soluções. Dessa forma, evita-se o desgaste emocional, promove-se a independência e preserva-se a saúde mental, mútua envolvida. Outro cenário acontece quando você tenta ajudar pessoas que não pedem apoio.

A ajuda é imposta, sem considerar que a pessoa não pede e nem aceita sua ajuda. Insistir, impor só faz ampliar o conflito. Para evitar que isso aconteça, é importante compreender que ajudar não significa necessariamente resolver, mas sim apoiar para promover o fortalecimento emocional da outra pessoa. Esse equilíbrio exige autoconhecimento e a habilidade de dizer “não” quando necessário, sem culpa. Isso não diminui sua empatia, mas reforça a noção de que cada indivíduo é responsável por seus atos. Além disso, reconhecer sinais de desgaste emocional em si é fundamental. Manter-se atento aos próprios limites psicológicos e físicos permite oferecer apoio de maneira mais sustentável e eficaz. Lembre-se de que cuidar de si é um pré-requisito para cuidar dos outros de forma saudável.

Imagem de mulher sentada num sofá azul. Ela cobre o rosto com uma parte do braço. Na parede branco há um sol dourado
Legenda: Acolher um desabafo é um ato de generosidade e amizade, mas requer equilíbrio emocional
Foto: Pexels

Nessas circunstâncias, a intenção pode ser mal interpretada, e o resultado muitas vezes é um afastamento ou resistência. A chave para evitar essas armadilhas é manter o equilíbrio: oferecer apoio sem se esquecer de preservar sua própria saúde emocional e permitir que o outro tenha espaço para crescer e assumir a responsabilidade por suas escolhas. Como ouvinte, sua função é oferecer um espaço seguro para que o outro expresse seus sentimentos. No entanto, isso não significa absorver ou carregar o peso emocional do que está sendo compartilhado. É importante lembrar que você não é responsável por resolver os problemas do amigo, mas pode ajudá-lo a sentir-se compreendido e apoiado.

Aqui estão algumas pistas úteis para acolher o sofrimento alheio com equilíbrio e sabedoria, sem sofrer com o sofrimento do outro: reconheça seus limites: não é sua obrigação carregar a dor do outro; você pode ser solidário sem internalizar o sofrimento. Não seja uma esponja que suga a lama do outro. Envolva-se com empatia, mas mantenha-se consciente de que a experiência pertence ao outro, não a você. Seja presente: dê atenção plena ao que está sendo dito, sem se apressar a formular respostas ou soluções. Como diz Cora Coralina: “Muitas vezes basta ser: colo que acolhe, braço que envolve, palavra que conforta, silêncio que respeita, alegria que contagia, lágrima que corre, olhar que acaricia, desejo que sacia, amor que promove”.

Valide os sentimentos: Use frases como “Entendo como isso deve ser difícil para você” ou “É compreensível sentir-se assim”. Isso demonstra apoio sem assumir responsabilidade. Ressalte, se possível, o esforço feito por ele, a força e a vontade de superação. Por exemplo, uma pergunta do tipo: “De onde vem a tua força interior que te mantém combativo e determinado? Pratique a auto-observação: monitore suas próprias emoções enquanto ouve. Todo diálogo é um diálogo cruzado. Ouço o outro e me ouço também. A palavra do outro desperta memórias pessoais. No diálogo com o outro, escuto o outro e me escuto.

Evite absorver as emoções do outro. Se perceber que está sendo tomado pela tristeza ou ansiedade, respire fundo e recupere o foco. Quando o desabafo é intenso e desordenado, pode ser desafiador permanecer centrado. Veja como agir diante desse cenário: Mantenha-se calmo. Não reaja imediatamente. Respire fundo e mantenha o tom de voz calmo. Isso ajuda a equilibrar a situação.

Deixe o outro falar: Muitas vezes, a pessoa só precisa colocar para fora o que sente, sem esperar conselhos imediatos. Quantas vezes ouvi de pessoas que apenas escutei atentamente, um agradecimento por ajudá-las. E, apenas fui uma presença ativa e acolhedora. Seja mais interrogativo do que afirmativo. Faça perguntas para refletir, dar sentido ao que está acontecendo, perceber as conexões diversas. Por exemplo: “Como você está se sentindo agora?” “O que você acha que poderia te ajudar nesse momento? “Quer apenas desabafar ou prefere que eu dê alguma sugestão?”.

Procure evitar perguntas que geram culpa do tipo: “Por que você fez isso?” (Pode soar acusatório.) “Você não acha que está exagerando?” (Invalida os sentimentos do outro.) “Como você vai resolver isso?” (Pode aumentar a pressão.) Se perceber que o desabafo está além do que você pode acolher, incentive a busca por outras formas de suporte, como terapia ou grupos de apoio. Após ouvir o desabafo, é importante cuidar de si, para que o processo não tenha um impacto negativo em sua saúde mental, preservando o seu equilíbrio emocional.

Pratique técnicas de relaxamento, como meditação ou respiração profunda. Compartilhe seus próprios sentimentos com alguém de confiança, se necessário. Engaje-se em atividades que promovam bem-estar, como exercícios físicos ou atividades de lazer criativos. Acolher um desabafo é um ato de generosidade e amizade, mas requer equilíbrio emocional. Ao estabelecer limites, praticar a escuta ativa e evitar a absorção do sofrimento alheio, você pode oferecer apoio genuíno sem comprometer sua própria saúde mental. Lembre-se: auxiliar o outro também significa respeitar suas próprias necessidades emocionais.

*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.