Hospital que atendeu Bolsonaro e comitiva deve mostrar lista de quem tem coronavírus, decide juíza
Em caso de descumprimento, a magistrada fixou multa diária de R$ 50 mil, a ser aplicada ao diretor do hospital, por paciente cujos dados forem omitidos
A juíza Raquel Soares Chiarelli, da 4ª Vara da Justiça Federal em Brasília, determinou nesta sexta (20) que o Hospital das Forças Armadas (HFA) apresente ao Governo do Distrito Federal a lista de pacientes cujos testes para detectar o novo coronavírus deram positivo.
Integrantes da comitiva do presidente Jair Bolsonaro em viagem aos Estados Unidos, entre eles o próprio mandatário, fizeram exames por meio de amostras colhidas pela equipe do HFA, mas, segundo a Secretaria de Saúde do DF, a unidade vem sonegando dados sobre os resultados.
A decisão, de caráter liminar (provisória), se deu em ação ajuizada pelo Governo do DF. Em caso de descumprimento de sua ordem, a magistrada fixou multa diária de R$ 50 mil, a ser aplicada ao diretor do hospital, por paciente cujos dados forem omitidos.
"Já é notório que a devida identificação dos casos com sorologia positiva para o Covid-19 é fundamental para a definição de políticas públicas para o enfrentamento urgente e inadiável da pandemia, a fim de garantir a preservação do sistema de saúde e o atendimento da população, de modo que não se justifica, sob nenhuma perspectiva, a negativa da União em fornecer essas informações ao Distrito Federal, que tem competência constitucional para coordenar e executar as ações e serviços de vigilância epidemiológica em seu território", escreveu ela.
Bolsonaro e integrantes de sua equipe viajaram aos Estados Unidos no início deste mês para encontro com o presidente americano, Donald Trump. Até o momento, pelo menos 23 pessoas ligadas à comitiva receberam o diagnóstico da doença. Entre elas estão dois ministros: o general Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) e Bento Albuquerque (Minas e Energia).
Bolsonaro fez dois testes e informou que eles deram negativo para o novo coronavírus, mas, questionado pelo jornal Folha de S.Paulo, não apresentou os documentos com os resultados.
A postura de Bolsonaro destoa da de Trump. Quando realizou seu exame, o presidente dos Estados Unidos divulgou um memorando oficial assinado por seu médico atestando que a análise não havia detectado o Covid-19. A Folha de S.Paulo solicitou à Secom (Secretaria Especial de Comunicação da Presidência da República) cópia do exame nas duas oportunidades, mas não obteve resposta.
Bolsonaro lamentou nesta sexta-feira (20) estar afastado de Heleno, isolado por causa da doença. "Estou chateado, o maior conselheiro meu, general Heleno está em casa. Mas a gente supera isso aí. É melhor estar do meu lado do que falar pelo telefone. Estamos fazendo nossa parte." Um dia antes de seu teste ter dado positivo, Heleno se reuniu três vezes com o presidente, sem máscara de proteção. Heleno, um dos ministros mais próximos de Bolsonaro, tem 72 anos. Já Albuquerque tem 61. Por causa da idade, eles fazem parte do grupo de risco para a doença.
Em entrevista na frente do Palácio da Alvorada nesta sexta, Bolsonaro confirmou que apresentaram resultado positivo para Covid-19 os exames de seu ajudante de ordens, major Mauro Cid, do assessor internacional da Presidência, Filipe Martins, do diretor do Departamento de Segurança Presidencial, coronel Suarez, e do chefe do Cerimonial, Carlos França.
Na quarta-feira (18), o presidente disse a jornalistas que poderia realizar um novo teste. A expectativa é de que ele seja feito na próxima segunda-feira (23). Também receberam diagnóstico de Covid-19 o chefe da Secom, Fabio Wajngarten, e o número 2 do órgão, Samy Liberman. Ele compareceu ao Planalto na última semana, ao regressar da viagem aos Estados Unidos, o que gerou reclamação e desconforto de funcionários da Presidência. Questionada formalmente, a Secom não quis comentar o resultado do exame de Liberman.
Outros integrantes da comitiva que depois apresentaram resultado positivo para coronavírus foram o presidente da Federação das Indústrias de Minas Gerais, Flávio Roscoe, e o secretário especial de Comércio Exterior, Marcos Troyjo, bem como o presidente da CNI (Confederação Nacional da Indústria), Robson Braga de Andrade. O Gabinete de Segurança Institucional da Presidência havia informado no dia 15 que quatro membros da equipe que serviu de apoio à viagem de Bolsonaro a Miami estão infectadas.
No mesmo dia, o publicitário Sérgio Lima, responsável pela comunicação da Aliança pelo Brasil, partido que Bolsonaro quer criar, informou que está com o coronavírus. A reportagem confirmou que ele esteve com a comitiva presidencial nos EUA.
Divulgaram ainda resultados positivos para o coronavírus o senador Nelsinho Trad (PSD-MS), o diplomata Nestor Forster, indicado para o cargo de embaixador do Brasil em Washington, a advogada Karina Kufa, tesoureira da Aliança, e o deputado federal Daniel Freiras (PSL-SC).
Entre os anfitriões, o prefeito de Miami, Francis Suarez, anunciou no dia 13 ter recebido o diagnóstico. Ele participou de evento com Bolsonaro e sua comitiva no dia 9.
Bolsonaro também foi alvo de críticas por dizer, em uma entrevista à rádio Super Tupi, na terça-feira (17), que faria uma "festinha tradicional" para comemorar seus 65 anos neste sábado (21).
Uma das principais recomendações dos especialistas diante da crise sanitária é a redução do contato social. Após a repercussão negativa, o presidente anunciou que passará a data apenas na companhia da primeira-dama, Michelle Bolsonaro, de sua filha caçula, Laura, e de sua enteada Letícia.