No primeiro domingo de provas do Enem em 2021, o Brasil contabilizava 518 mortes por Covid-19 em apenas 24 horas. Na véspera do segundo domingo (24) de exames, o País contabilizou 1.202 mortes em apenas um dia. É um quadro evolutivo de mal a pior. Mesmo assim, o Ministério da Educação não só manteve a data como reafirmou diversas vezes que não suspenderia o Exame Nacional do Ensino Médio, apesar de todos os riscos que as inevitáveis aglomerações antes, durante e após a prova poderiam gerar. Os mais de 50% de abstenção no primeiro dia e os do segundo dia, que não deve ter disparidade em relação ao anterior, só revelam como o "Enem da pandemia" aprofunda o fosso da desigualdade no País.
Não bastasse a dificuldade dos estudantes de baixa renda no acesso remoto à educação nos últimos 11 ou 12 meses, além da carência de infraestrutura para os estudos na própria casa, por exemplo, é notório que o grupo de estudantes brasileiros mais "privilegiados" reúne condições que poderiam criar menor resistência ao dia da prova, senão vejamos: quem não precisou ir nem voltar de transporte coletivo, e tinha um carro particular à disposição, reduziu as chances de aglomeração. Quem volta da prova e tem na própria casa um quarto exclusivo, por exemplo, tem menos chances de expor parentes aos possíveis riscos de ter trazido o vírus para o lar. Nada disso impede a contaminação, tamanha é a seriedade da pandemia, mas é fato que, quanto maiores os riscos, também maior impacto emocional e social o "medo" de fazer o Enem gera.
É muito comum aos estudantes a insegurança de não se sentirem preparados para a prova, sendo a ansiedade uma tradicional companheira de todo aquele que se submete ao exame, mas este período de pandemia potencializou tudo.
Quando estudantes alegaram que não fariam a prova porque moram com familiares pertencentes a grupos de risco, por exemplo, colocaram em primeiro lugar a saúde de todos - uma verdadeira aula para o Ministério da Educação, que, assim como outras pastas do Governo Federal, minimiza os impactos da pandemia nas famílias brasileiras.
"Tomamos todos os cuidados de biossegurança possíveis", afirmou o ministro da Educação Milton Ribeiro, para justificar que as datas seriam mantidas. Apoiou-se num lema frágil, mas adotado por todo aquele que promove aglomeração, a de estar tomando todas as "medidas de segurança". Ainda que fosse mantido, o que não ocorreu no último domingo de provas, o distanciamento social, somado ao uso de máscara e álcool em gel, não pode ser passaporte para a retomada de uma certa rotina. Tais medidas são o que nos resta enquanto temos que exercer atividades sociais e, não havendo alternativas terapêuticas contra a Covid, esperamos pelas doses da vacina e sua necessária universalização.
Os novos números das abstenções do segundo domingo de provas serão notícia dos próximos dias. No entanto, a estatística dos novos casos confirmados de Covid-19 não virá, mas estará subentendida nos dados gerais de casos nas próximas duas ou três semanas. É só mais uma tragédia anunciada, como foram as aglomerações de Natal e Réveillon para os leitos hospitalares em janeiro. O País segue pagando caro.