Até um ano atrás, o ciclo carnavalesco de Fortaleza vinha consolidando a Capital cearense como referência do período festivo. A sequência de eventos dos blocos de Pré-Carnaval e depois os quatro dias tradicionais de festa tornaram o ciclo um norte de inclusão da programação da cidade: tanto a população fortalezense como os turistas no município na época (início da baixa estação) passaram a usufruir os festejos.
A consolidação não aconteceu da noite para o dia, e atravessou as gestões de Luizianne Lins (2005-2008; 2009-2012) e de Roberto Cláudio (2013-2016; 2017-2020) à frente do Paço Municipal. Agora, Sarto Nogueira encara, logo no início de sua gestão, o desafio de encontrar uma solução para o que será possível fazer com o projeto, diante de tantas restrições provocadas pela pandemia do coronavírus. Elpídio Nogueira, irmão do prefeito e novo titular da Secretaria da Cultura de Fortaleza (Secultfor), já sinalizou que essa solução está aberta à discussão, e a Prefeitura deve se reunir com os setores normalmente interessados na realização do Carnaval.
No entanto, embora a possibilidade já se encontre no âmbito da discussão, vale perguntar: há um Carnaval “possível” sem a formação de aglomerações? O governador Camilo Santana já suspendeu, em todo o Estado, a realização de quaisquer festas ou eventos comemorativos de Carnaval, em ambientes abertos ou fechados, promovidos por iniciativa pública ou particular.
A recomendação de não aglomerar segue viva e os números mais recentes do contágio do vírus e de óbitos no Ceará alertam sobre a necessidade de respeitar o protocolo de prevenção, indicado desde março de 2020.
Em dezembro passado, a Secretaria da Saúde do Estado confirmou 278 mortes provocadas pela doença no Ceará. O aumento foi de 12% em relação a novembro (com 248 óbitos). O número está longe do patamar alcançado no ápice da crise, quando foram registrados 3.853 falecimentos, em maio de 2020. Porém, não cabe à população “permitir a piora” baseada nos piores números do passado recente, tendo em vista que cada vida merece o respeito da comunidade.
Prevenir-se está no imperativo dos dias que correm, embora a sensação da virada do ano talvez turve a visão dos mais desatentos. O Ceará alcançou a triste marca de mais de 10 mil mortes com a disseminação do vírus no Estado. A gravidade da situação, no entanto, parece que é insuficiente para sensibilizar boa parte da população. Somente em Fortaleza, Juazeiro do Norte e Sobral, três das maiores cidades cearenses, a Polícia Militar registrou 291 ocorrências de aglomerações durante o feriado do Réveillon. Ou seja, ocasiões que desrespeitaram o decreto estadual, cujo texto permitia a reunião de até 15 pessoas.
Diante do cenário, o poder público tem um desafio que se comprova no decorrer desses meses de pandemia: o costume da população é demasiadamente social e desafia a morte - pois quem se aglomera expõe, primeiro, a própria saúde. Difícil imaginar que os eventos carnavalescos em 2021 aconteçam, com a chancela das autoridades públicas, para além das programações virtuais. E convém registrar um apelo para quem ainda pensa em realizar festas, clandestinamente: vale festejar ao custo da própria vida ou de alguém próximo?