Ídolos passam por frustrações? Sim, fazem parte do processo natural dessa construção. Identidade com um clube também ganha esses moldes. Nos anos em que o Fortaleza passou na Série C, grandes times foram formados, atletas consagrados marcaram história, foram líderes dentro e fora de campo, criaram laços e identificação. Até títulos conquistaram, mas sempre que 'batia na trave', geralmente havia reformulação de elenco para os anos seguintes. Ricardo Berna é um desses atletas marcantes, mas não o suficiente para a consolidação da imagem de ídolo. Ele foi entrevistado no podcast Bate-papo com os Craques.
"Pra mim, foi bem turbulento. Quando eu cheguei, fiquei com muita confiança de que iríamos ter um bom trabalho para obter êxito. Lembro que na minha entrevista de apresentação eu falei sobre o Fortaleza estar na Série A no seu ano de centenário, todos olharam pra mim espantados, porque era algo distante. No momento decisivo (em 2016), perdemos o treinador, foi lamentável porque a gente vinha em uma crescente, chegamos a uma decisão inteira, confiantes e tudo a favor. E aquilo ali foi decisivo que decretou o nosso destino no campeonato", revela Berna.
De origem humilde, Berna teve alguns caminhos curiosos na formação como profissional. Iniciou a carreira no Corinthians, ganhou certo destaque e logo, foi para o Japão. Passou um ano fora e não quis retornar para o país asiático por um sonho que teve.
"Eu tinha 14 anos quando fui para o Japão e aprendi muito na questão cultural e intelectual. Quando retornei, minha mãe não me reconheceu porque me desenvolvi fisicamente e ganhei 12 quilos de massa magra. Eu vim de férias para retornar ao Japão e iria ficar mais três anos, porém, eu tive dois sonhos consecutivos na semana que iria voltar, onde sonhei que o avião caía. Então não retornei", conta.
Após os títulos no Fluminense, veio ao Nordeste pela primeira vez para atuar no Náutico, onde se destacou. E tinha um acordo para jogar no Ceará, caso o alvinegro conseguisse o acesso à Série A.
"O primeiro convite que surgiu foi do Ceará, estive em um jantar onde estavam todos os conselheiros e o presidente do clube. Deixei tudo acertado. Caso eles subissem para Série A eu seria contratado pelo clube, mas infelizmente eles não conseguiram o acesso e eu fiquei a ver navios, porque o contrato foi desfeito. Fiquei um ano sem jogar futebol depois de um embate judicial com o Náutico e, ao fim de 2014, depois de fazer alguns cursos e estudar, acabei amadurecendo em alguns aspectos e resolvi (voltar a) jogar futebol, porque entendi que meu ciclo não tinha terminado".
Berna iria ser contratado no início de 2015, mas o negócio não aconteceu. Então Berna decidiu se aposentar, mas antes, ligou para o treinador do Macaé, um amigo pessoal, para parabenizar pelo acesso do clube carioca e revelou que estava se aposentando, então surgiu convite para jogar pelo Macaé, após o negócio com o Fortaleza não ter acontecido.
"Foi a segunda vez que minha negociação tinha sido feita por um empresário. No fim de 2014, ele teria acertado com Júlio Manso e Marcelo Paz. Até com Marcelo Chamusca eu já tinha conversado e ele me passou todas as referências, tinha acertado três anos de contrato e o 'bigode', presidente (Jorge Mota), tinha acertado com outro goleiro (Deola), então tiveram que desfazer o contrato comigo. O Júlio e o Paz conversaram comigo, meio sem jeito, mas entendi naquele momento.
Em 2015, o Macaé comunicou que não teria como pagar o salário do Berna, então me desliguei, sem rumo e sem clube. Mas rapidamente, o Fortaleza surge com contrato e acerta com o goleiro.
No dia seguinte tinham dois clubes, o primeiro foi o Fortaleza que tinha me mandado um pré-contrato quando soube do meu desligamento e o segundo foi o Vasco, o Celso Roth tinha afastado o Martín Silva e pediu a minha contratação, fez um convite através de um empresário. Porém, acabei escolhendo ir para o Fortaleza.
Parecia ser um ano diferente para o Fortaleza. Apósb, tricolor fez uma campanha histórica na Copa do Brasil, além da campanha destacada na Série C. Mais uma vez, na beira do acesso, sendo o melhor time da competição. Mas o treinador resolve sair do clube para o Figueirense antes do mata-mata.
"Eu estava na padaria tomando meu café da manhã, era um dia de folga. Quando eu abri o noticiário, vi a saída do Marquinhos, achei que era o tal do fake, para mim era inacreditável, então ignorei porque faltava uma semana para decisão. Eu olhei para o lado e perguntei às pessoas, todos me falando que era verdade, então passei a acessar todos os noticiários. Liguei para o Jorge Mota e perguntei sobre a saída do Marquinhos Santos, perguntei se tinha acontecido alguma coisa para a saída dele, em seguida ele falou o seguinte: 'ele é louco! Ele é louco em fazer um negócio desse'. Depois de falar com o presidente, tomei a liberdade de ligar para ele, então precisava entender. O Marquinhos Santos disse que era uma proposta irrecusável e era um sonho de carreira treinar uma Série A", relatou.
Naturalmente a quebra de trabalho abalou o elenco faltando uma semana para o mata-mata da Série C
"Não tinha mais o que fazer. Desejei que ele fosse muito feliz, mas com aperto muito grande no peito e sabíamos que iríamos remar muito forte por tudo que viria, a repercussão, a onda de notícias ou quem iria assumir. Foi nesse ponto o grande ajuste que poderia ter sido feito de uma maneira melhor, porque o treinador que chegou (Hemerson Maria), chegou vaidoso, querendo colocar o dedo dele no trabalho para a decisão, quando era só dar sequência ao que vinha sendo feito e que tinha sido construído. Ele mexeu bastante na equipe, então acabou desestruturando e não tivemos o poder de reação necessário, "completa Berna.