Em Salvador, no meio da macetagem de Ivete Sangalo, apareceu a cantora Baby do Brasil, direto do camarote falando às pipocas, anunciando o apocalipse. E estimou: entre 5 e 10 anos.
Nada disso me surpreende, afinal, já cobri a prisão de Maria Raio-X (que Deus a tenha em bom lugar após empurrar para longe o tsunami que engoliria Fortaleza) e até bati papo com o último penintente Aves de Jesus, que quase nunca recebe ninguém.
Porém, a fala da diva rock-gospel serviu de abre-alas para o que seria a conclusão deste Carnaval. Foi o da folia religiosa ou da fé que virou samba.
No Brasil, religião e carnaval misturam-se, sim. Porque ambos foram aprimorados na nossa cultura. E este país não se compara a nenhum outro. É imenso, biodiverso, colonizado, recolonizado e ainda sangra, porque abertas estão nossas veias de recursos naturais, já ensinou Eduardo Galeado.
A aventura brasileira é a síntese e análise deste Sul Global tão humilhado, mas que começa a ser exaltado. Vide Brics.
O próprio Padre Cícero é um exemplo. E não falo nem do francês que desdenhou do sangue precioso vertendo da boca santa da Beata sertaneja. Falo de outro fato histórico lembrado pela doutora Fátima Pinho.
A historiadora trouxe a público trecho da sua tese em que mostra como em 1914 São Cícero foi figurado no mesmo carnaval do Rio de Janeiro. O boneco gigante aparecia com faca nos dentes, chamavam-no de padre pintado pelo diabo. 110 anos depois, o Padim sambou na cara de todos, todas e todes.
O servo de Deus Padre Cícero Romão Batista foi a história que faltava para que a escola de samba Unidos de Padre Miguel finalmente voltasse ao grupo das melhores do carnaval do Rio de Janeiro. Logo a UPM, considerada o Vasco da segunda divisão do carnaval carioca.
Às vésperas dos 180 anos de nascimento e 90 de morte, o menino do Cariri que virou o redentor do Sertão parece ter em 2024 a data de mais uma da sua lista de consagrações. Sabe por quê?
Porque ele sempre esteve ao lado de quem mais precisou. Quem protegeu aquela gente do Caldeirão, escorraçada após a morte do Padim?
O próprio. E, como dizia o saudoso Antônio Bispo dos Santos, o Nêgo Bispo, houve Canudos, houve Caldeirão, o trabalho coletivo é a maior força anticolonizadora.
Os humilhados serão exaltados e de forma apoteótica. Eu creio.
Inclusive Iemanjá, que anda sendo censurada em canções, divindade da fé de raiz africana, voltará do fundo do mar com muita força. É meu palpite para 2025.
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