Concorrente de 'Ainda Estou Aqui' no Oscar, 'Emilia Pérez' é raso em tudo que se propõe; veja resenha

Longa estreia nos cinemas brasileiros no próximo dia 6 de fevereiro

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Redação producaodiario@svm.com.br
(Atualizado às 10:36)
Legenda: 'Emilia Pérez' receber 13 indicações ao Oscar 2025
Foto: divulgação/Paris Filmes

Antes mesmo do anúncio dos indicados ao Oscar 2025, 'Emilia Pérez', do diretor Jacques Audiard, já despontava como um dos destaques da temporada. Definido como subversivo e até mesmo bastante original, o longa foi abraçado pela crítica internacional, o que, no entanto, não parece ter ocorrido de forma semelhante com a audiência, principalmente a mexicana. Algumas semanas restam na corrida até a grande premiação da Academia e tudo pode mudar, mas o que justifica o número expressivo de indicações do filme? Das 13 recebidas, todas foram de fato merecidas?

Legenda: Karla Sofía é bastante magnética como Emilia, mas roteiro não ajuda personagem
Foto: divulgação

Raso em praticamente tudo ao que se propõe, 'Emilia Pérez' falha na primeira premissa: a de ser um musical. Além disso, aborda a transição de gênero como algo completamente maniqueísta e, nesse mesmo caminho, também minimiza o problema sério dos desaparecimentos em solo mexicano, assim como a violência massiva no país por conta do domínio dos cartéis do tráfico. 

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A história percorre, de início, o drama de Rita, uma advogada frustrada na profissão que é procurada, logo no primeiro ato, por Manitas, um dos maiores traficantes do México, para uma missão capaz de deixá-la rica. Manitas deseja abandonar o crime para se submeter a uma redesignação sexual e mudança de identidade, em um plano complexo e cheio de riscos.

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Talvez, inclusive, esse seja o maior ato de coragem da produção. Não há tanta demora para apontar o principal discurso narrativo da obra. 'Emilia Pérez' leva a trama para o centro dessa trajetória sem muitas delongas, levando o espectador a crer na possibilidade de acompanhar a evolução dessa personagem, bem como a todas as outras tramas que a cercam. O que acontece, entretanto, é algo bem distante disso.

Músicas fracas e atuações sem tanto brilho

As músicas, mais uma vez repito, são fraquíssimas para sustentar o gênero em que 'Emilia Pérez' busca se encaixar. Vazias de sentido, elas não encaixam ritmo e letra, parecem sempre desafinadas, não acrescentam à história. Como um musical não-diegético, daqueles em que as músicas sobrepõem até mesmo a trama, talvez se esperasse um tom diferente, o que não é alcançado em nenhum nível.

Até mesmo 'El Mal', indicada à categoria de 'Melhor Canção Original' no Oscar, parece apenas uma crítica mal feita. É justamente assim que o longa se apresenta, como algo perdido nesse caminho torto de se levar tão a sério. Uma pena. 

Cena de Emilia Pérez
Legenda: Junto de Karla Sofía, Zoe também é destaque, ainda que não apareça tão bem quando o filme lhe entrega a função de cantar
Foto: divulgação

Quanto às atuações, aplausos claros a Zoë Saldaña e Karla Sofía Gascón cabe ressaltar. A conexão entre as duas atrizes é capaz de salvar um tanto da relação entre Rita e Emilia. É nelas onde pouco que o filme é capaz de entregar se sustenta. Os diálogos travados por ambas expõem mais do que o próprio filme busca dizer e são, entre tantos erros, uns dos pontos altos, ainda que elas não surjam tão bem quando o musical as exige.

Selena é sem comentários. Ainda que salve um pouco da música quando as canta, surge completamente fora de tom como Jessi, ex-mulher de Manitas. O sotaque da atriz é tão errático que cai na esfera do humor, daqueles em que a vergonha alheia se sobressai. Se cabe algum elogio à cantora pop, ela brilha um pouco no último ato, ainda que de forma um tanto previsível. 

Selena Gomez em Emilia Pérez
Legenda: Selena tenta, mas o sotaque que é capaz de fornecer chega a ser constrangedor
Foto: divulgação/Paris Filmes

Vários nadas em um só

No fim das contas, a história se segura desesperadamente em um enorme vazio. Esvaziado de sentidos, de personalidades. A melhor das histórias, a da própria Emilia, não tem o desenvolvimento merecido. Ao espectador resta colher pequenas sobras para formar a figura da mulher, inclusive até desrespeitada dentro da própria redesignação sexual. Proposta a ser, talvez, uma história de redenção, a narrativa consegue ser apenas uma sucessão de acontecimentos, muitos deles sem qualquer impacto.

Até agora, busco sentido para o favoritismo de 'Emilia Pérez'. Apesar disso, fico com as enormes críticas verbalizadas por muitos mexicanos e por várias pessoas trans. Caso leve algumas das estatuetas, não ficarei surpresa, mas completamente embasbacada com a validação do que é mostrado em tela. Como já disse, uma grande pena. 

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