Tarifaço: risco de perdas bilionárias põe o Ceará no topo do Nordeste; governo tenta reagir

Escritório do Banco do Nordeste afirma que, caso as tarifas percistam, prejuízo em 2026 pode passar de US$ 250 milhões

Escrito por
Inácio Aguiar inacio.aguiar@svm.com.br
(Atualizado às 10:20)
Legenda: Na semana passada, o governador teve reunião com o embaixador da China para tentar abrir novos mercados aos produtos brasileiros
Foto: Divulgação

A economia cearense está frente a um desafio bilionário. Desde 6 de agosto, está em vigor uma sobretaxa de até 50% aplicada pelos Estados Unidos a diversos produtos brasileiros, medida que, segundo o Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste (Etene), do Banco do Nordeste, pode tirar até US$ 108,8 milhões (cerca de R$ 600 milhões) das exportações do Estado já em 2025. O cenário fica ainda mais severo caso a tarifa se prolongue: as perdas projetadas para 2026 chegam a US$ 261 milhões, mais de R$ 1,4 bilhão. 

O Ceará figura entre os estados mais vulneráveis ao tarifaço pela forte dependência do mercado norte-americano. De janeiro de 2024 a junho de 2025, 47,9% de todas as exportações cearenses tiveram como destino os EUA, maior percentual entre estados do Nordeste. 

A lista de produtos afetados inclui pescados, frutas, ceras vegetais, como a carnaúba, calçados, couros, mel e lagosta. No caso das pás eólicas, mais de 99% têm os EUA como destino, o que reforça o peso da medida para os produtores cearenses. 

O Etene também alerta para efeitos secundários. A queda no Produto Interno Bruto (PIB) do Ceará pode chegar a 0,30 ponto percentual em 2025 (maior impacto entre os estados nordestinos) e a 0,67 ponto em 2026. Setores que empregam muita mão de obra, como fruticultura e calçados, tendem a sentir primeiro, com risco de aumento na taxa de desemprego e na inadimplência. 

Movimentos do governo

O governador Elmano de Freitas (PT) adotou reação em algumas frentes. Uma das estratégias é absorver no mercado interno parte da produção antes destinada à exportação. Uma providência é o próprio estado comprar parte da produção para alimentação escolar, por exemplo.  

Em outra frente, negociações já estão em curso com supermercados e atacadistas para priorizar produtos locais como pescados, castanha de caju, água de coco e mel. A Associação Cearense de Supermercados (Acesu) e a Federação da Agricultura e Pecuária do Ceará (Faec) participam das tratativas. A Faec lembra que o Estado perde R$ 4 bilhões por ano na comercialização de frutas, legumes e verduras vindos de fora, que representam cerca de 50% do consumo local. 

O Governo também avalia medidas como subsídios, crédito facilitado, apoio logístico e campanhas de valorização dos produtos cearenses. 

Aprovação legislativa em regime de urgência

Na Assembleia Legislativa, as medidas contra o tarifaço tramitaram em regime de urgência e foram aprovadas por unanimidade. Entre as ações autorizadas estão:

  1. Auxílio financeiro às empresas exportadoras;
  2. Aquisição de produtos para programas sociais como o Ceará Sem Fome e restaurantes universitários;
  3. Antecipação do pagamento de créditos de ICMS e ampliação de incentivos fiscais;
  4. Criação de um Comitê Estratégico para monitorar a execução das medidas. 

De olho no mercado da China 

O governo estadual também busca diversificar mercados. Em Brasília, Elmano se reuniu com o embaixador da China no Brasil, Zhu Qingqiao, para discutir a ampliação de relações comerciais e a abertura do mercado chinês para produtos cearenses afetados pelo tarifaço. 

A estratégia inclui ampliar rotas de navegação a partir do Complexo Industrial e Portuário do Pecém, com o objetivo de posicionar o Ceará como um hub logístico para a Ásia. 

Com estimativas de perdas que chegam à casa de bilhão, as ações combinam estímulo ao consumo interno, apoio fiscal, busca por novos parceiros internacionais e articulação com o governo federal para um plano de contingência completa a ofensiva.  

O teste, no entanto, será a velocidade de implementação e se o esforço será suficiente para amortecer o impacto da nova realidade do comércio internacional sobre a economia cearense.