Poder da caneta e representatividade: bastidores da escolha de uma lista tríplice feminina no TRE-CE

Desembargadores do TJCE escolhem três mulheres para vaga na Corte Eleitoral. Escolha final é do presidente Lula

Escrito por
Inácio Aguiar inacio.aguiar@svm.com.br
(Atualizado às 07:28)
Legenda: Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) aprovou lista tríplice para o TRE-CE na última quinta-feira (5)
Foto: Sara Parente/Ascom TJCE

Uma articulação de bastidores entre desembargadores do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), inclusive alguns que também atuam no Tribunal Regional Eleitoral (TRE-CE), resultou em um feito inédito no Judiciário cearense: pela primeira vez, a lista tríplice para escolha de um novo jurista titular da Corte Eleitoral é composta integralmente por mulheres.

A decisão, tomada na sessão do Pleno da última quinta-feira (4), foi costurada com base em dois entendimentos: o de restringir reconduções ao pleno da Corte e o de garantir representatividade feminina. 

Movimento por equidade 

A defesa da paridade de gênero foi o ponto alto da sessão. Desembargadores como Heráclito Vieira, presidente do TJCE, e Fernando Ximenes, decano da Corte, vocalizaram o incômodo com a baixa presença de mulheres no TRE-CE.  

Atualmente, apenas uma mulher, a desembargadora Maria Iraneide Moura Silva, que também preside o tribunal, ocupa assento entre os 14 membros da Corte, somando titulares e suplentes. Coube à própria Iraneide, inclusive, o discurso mais enfático pela formação de uma lista 100% feminina, em busca de equilíbrio institucional. 

As escolhidas e os números 

A movimentação teve efeito direto no resultado. A lista tríplice aprovada é formada pelas advogadas: 

  • Fernanda Dourado Aragão Sá Araújo Mota (31 votos);
  • Luciana Melo Madruga Fernandes Arruda (28 votos); e
  • Joyceane Bezerra de Menezes (27 votos).  

A disputa, no entanto, foi apertada. O advogado Wilker Macêdo Lima, atualmente suplente e no exercício da titularidade no TRE-CE, ficou de fora por apenas um voto (ele teve 26), o que gerou incômodo entre alguns membros da Corte, que veem a exclusão como desconsideração à experiência prática na função. 

Tensão entre representatividade e critérios técnicos 

A escolha exclusivamente feminina foi celebrada como uma vitória institucional para as mulheres, mas também acentuou divergências. A exclusão de nomes já atuantes na Corte em prol dos critérios de representatividade gera debate.  

Juristas ouvidos pela coluna sob reserva, disseram louvar a representatividade de gênero, mas ponderaram que o debate legítimo pela equidade não pode se sobrepor à valorização da atuação técnica na própria Corte. 

Critério novo, regra não escrita 

Outra articulação observada nos bastidores foi a consolidação de um entendimento informal entre os desembargadores: os juristas com mandato na Corte Eleitoral não devem mais ser reconduzidos, como era possível anteriormente.  

Essa diretriz, embora não oficializada em norma, começa a moldar as decisões internas e sinaliza uma reconfiguração na dinâmica da justiça eleitoral cearense. A ideia é que a regra passe a valer também para magistrados 

Composição dos TREs 

Os Tribunais Regionais Eleitorais são compostos por sete membros: dois desembargadores do TJ, dois juízes estaduais, um juiz federal e dois juristas indicados pela Presidência da República, a partir de lista tríplice elaborada pelos tribunais locais.  

Com a definição no TJCE, a lista seguirá agora para homologação no TSE e, posteriormente, será submetida ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que escolherá uma das indicadas para compor o colegiado do TRE-CE no biênio que contempla as eleições de 2026. 

Política também funciona no Judiciário 

A lista feminina encaminhada carrega um simbolismo importante. Mas evidencia também que o jogo de bastidores do Judiciário segue presente nas escolhas. É a política, por vezes pouco visível, que continua a todo vapor os tribunais.