Poder da caneta e representatividade: bastidores da escolha de uma lista tríplice feminina no TRE-CE
Desembargadores do TJCE escolhem três mulheres para vaga na Corte Eleitoral. Escolha final é do presidente Lula
Uma articulação de bastidores entre desembargadores do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), inclusive alguns que também atuam no Tribunal Regional Eleitoral (TRE-CE), resultou em um feito inédito no Judiciário cearense: pela primeira vez, a lista tríplice para escolha de um novo jurista titular da Corte Eleitoral é composta integralmente por mulheres.
A decisão, tomada na sessão do Pleno da última quinta-feira (4), foi costurada com base em dois entendimentos: o de restringir reconduções ao pleno da Corte e o de garantir representatividade feminina.
Movimento por equidade
A defesa da paridade de gênero foi o ponto alto da sessão. Desembargadores como Heráclito Vieira, presidente do TJCE, e Fernando Ximenes, decano da Corte, vocalizaram o incômodo com a baixa presença de mulheres no TRE-CE.
Atualmente, apenas uma mulher, a desembargadora Maria Iraneide Moura Silva, que também preside o tribunal, ocupa assento entre os 14 membros da Corte, somando titulares e suplentes. Coube à própria Iraneide, inclusive, o discurso mais enfático pela formação de uma lista 100% feminina, em busca de equilíbrio institucional.
Outra liderança entre os desembargadores com atuação neste caso foi o ex-presidente da Corte, Abelardo Benevides.
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As escolhidas e os números
A movimentação teve efeito direto no resultado. A lista tríplice aprovada é formada pelas advogadas:
- Fernanda Dourado Aragão Sá Araújo Mota (31 votos);
- Luciana Melo Madruga Fernandes Arruda (28 votos); e
- Joyceane Bezerra de Menezes (27 votos).
A disputa, no entanto, foi apertada. O advogado Wilker Macêdo Lima, atualmente suplente e no exercício da titularidade no TRE-CE, ficou de fora por apenas um voto (ele teve 26), o que gerou incômodo entre alguns membros da Corte, que veem a exclusão como desconsideração à experiência prática na função.
Tensão entre representatividade e critérios técnicos
A escolha exclusivamente feminina foi celebrada como uma vitória institucional para as mulheres, mas também acentuou divergências. A exclusão de nomes já atuantes na Corte em prol dos critérios de representatividade gera debate.
Juristas ouvidos pela coluna sob reserva, disseram louvar a representatividade de gênero, mas ponderaram que o debate legítimo pela equidade não pode se sobrepor à valorização da atuação técnica na própria Corte.
Critério novo, regra não escrita
Outra articulação observada nos bastidores foi a consolidação de um entendimento informal entre os desembargadores: os juristas com mandato na Corte Eleitoral não devem mais ser reconduzidos, como era possível anteriormente.
Essa diretriz, embora não oficializada em norma, começa a moldar as decisões internas e sinaliza uma reconfiguração na dinâmica da justiça eleitoral cearense. A ideia é que a regra passe a valer também para magistrados
Composição dos TREs
Os Tribunais Regionais Eleitorais são compostos por sete membros: dois desembargadores do TJ, dois juízes estaduais, um juiz federal e dois juristas indicados pela Presidência da República, a partir de lista tríplice elaborada pelos tribunais locais.
Com a definição no TJCE, a lista seguirá agora para homologação no TSE e, posteriormente, será submetida ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que escolherá uma das indicadas para compor o colegiado do TRE-CE no biênio que contempla as eleições de 2026.
Política também funciona no Judiciário
A lista feminina encaminhada carrega um simbolismo importante. Mas evidencia também que o jogo de bastidores do Judiciário segue presente nas escolhas. É a política, por vezes pouco visível, que continua a todo vapor os tribunais.