Caso de Santa Quitéria expõe urgência de leis contra a concentração de poder em famílias
Em prisão domiciliar por suspeita de favorecimento por facção, o prefeito eleito, Braguinha, foi substituído no comando da Cidade, pelo filho
A ocupação simultânea de cargos estratégicos no Executivo e no Legislativo por membros da mesma família é uma grave anomalia no sistema político brasileiro, que se expressa inclusive no Ceará. Apesar de a Constituição Federal estabelecer restrições quanto à inelegibilidade de cônjuges e parentes próximos do chefe do Executivo, a ausência de regras que impeçam a coincidência de mandatos em diferentes poderes abre espaço para a concentração de poder e para distorções administrativas. Essa lacuna jurídica compromete a alternância e a independência entre os poderes.
O caso de Santa Quitéria, na Região Norte do Estado, é emblemático. O prefeito José Braga Barrozo, o Braguinha, foi preso pela Polícia Federal momentos antes de sua posse, sob acusação de envolvimento com uma facção criminosa. Em uma situação que beira o absurdo e evidencia os problemas dessa sobreposição familiar, o cargo de prefeito foi imediatamente assumido pelo filho de Braguinha, Joel Barrozo, presidente da Câmara Municipal.
A sucessão no cargo gera preocupações similares ao nepotismo e compromete a capacidade do município de garantir governabilidade e transparência diante de um cenário conturbado.
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Recentemente, outro caso emblemático sobre a prática ocorreu em Iguatu, onde o afastamento do prefeito Ednaldo Lavor levou à assunção do cargo por sua esposa, Eliane Braz, que ocupava a presidência da Câmara. Assim como em Santa Quitéria, o poder político ficou concentrado em um único núcleo familiar, comprometendo a separação de funções e levantando dúvidas sobre o cumprimento dos ditames das decisões judiciais por conta dos vínculos familiares.
Falha estrutural
Esses exemplos refletem uma falha estrutural do sistema político brasileiro, que ainda permite a sobreposição de poderes por parentes, enfraquecendo os princípios republicanos. A repetição desse fenômeno evidencia que tais situações não são meros desvios pontuais, mas acabam sendo fruto de uma tática política praticada por poderosos de plantão.
A mudança dessa realidade exige uma alteração na lei que proíba explicitamente a coincidência de mandatos entre membros de uma mesma família nos diferentes poderes de governo em um mesmo município. O debate não é apenas jurídico, mas ético, e precisa ser tratado com a urgência que o caso de Santa Quitéria demonstra.