TJCE quer juízes trabalhando presencialmente; magistrados questionam fiscalização e acionam CNJ

OAB Ceará diz que há carência de magistrados nas comarcas do Estado e ingressou no procedimento de controle administrativo formulado pela Associação Cearense de Magistrados

Legenda: O ofício do TJCE afirma que a corregedoria-geral iria intensificar a fiscalização da presença diária dos magistrados, "sob pena de apuração de responsabilidade disciplinar"
Foto: Divulgação

A corregedora-geral do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), desembargadora Maria Edna Martins, emitiu um ofício para "alertar" todos os magistrados do Estado sobre a "obrigação de comparecimento diário ao expediente forense presencial". O documento, divulgado na última sexta-feira (31), permite que o trabalho realizado nas comarcas possa ser feito em 3 dias úteis por semana para os juízes que "gozem de autorização de teletrabalho".

A desembargadora justificou "a necessidade de reforçar a obrigatoriedade da presença dos(as) magistrados(as) nas unidades judiciárias" a partir do "desenvolvimento de ações para a garantia do acesso à justiça e o fortalecimento da rotina de fiscalização do Balcão Virtual".

O balcão virtual é uma ferramenta online utilizada para videoconferências, acesso a informações e agendamento de audiências utilizada pelo Poder Judiciário.

O ofício do TJCE afirma ainda que a corregedoria-geral iria intensificar, a partir do último sábado (1º), a fiscalização da presença diária dos magistrados, "sob pena de apuração de responsabilidade disciplinar". 

A medida levou a Associação Cearense de Magistrados (ACM) a acionar o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por meio de um procedimento de controle administrativo. A ação alega que o ofício da corregedora-geral viola as prerrogativas dos magistrados cearenses, afrontando a autonomia e independência dos juízes, além de constituir um potencial assédio moral. 

Por isso, a ACM pede de forma imediata a "suspensão da fiscalização da presença e dos horários de comparecimento dos magistrados às unidades judiciárias competentes" por qualquer meio remoto e que o CNJ julgue pela revogação de medida de controle de presença.

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Forma de fiscalização é questionada

O juiz Cleber Castro, diretor da ACM, disse à coluna que a associação tem "a absoluta noção de responsabilidade e deveres funcionais dos juízes, dentre eles o de assiduidade. Isso ninguém discute". "Também não se discute o poder de fiscalização da nossa corregedoria", acrescentou.

Segundo o magistrado, o que motivou a ação apresentada ao CNJ "foi a forma como a corregedoria delimitou que passaria a fiscalizar, através do balção virtual, que é para o uso do cidadão e não para fiscalizar o juiz".

Cleber Castro afirma que se um servidor ligar para perguntar se o juiz está na comarca "cria uma situação de descredenciar o juiz". Segundo ele, o magistrado tem "autonomia funcional para dizer que horas pode atuar, porque ele é juiz 24 horas por dia". "É ultrajante para dignidade do juiz", acrescenta. O diretor defende ainda que há outros meios de saber se o juiz está cumprindo suas funções.

Eventualmente, quando o magistrado não está presente no fórum, ele trabalha muito mais em sua casa. Como os processos são virtuais, não é necessário que ele esteja lá todo dia"
Juiz Cleber Castro
Diretor da ACM

Há carência de magistrados nas comarcas do Estado, diz OAB Ceará

Segundo a OAB Ceará, há uma carência de magistrados nas comarcas do Estado, o que dificulta uma prestação jurisdicional célere e efetiva. Por isso, a Ordem dos Advogados cearense ingressou no processo apresentado pela ACM ao Conselho Nacional de Justiça para garantir a fiscalização do trabalho presencial dos juízes.

Segundo a entidade advocatícia, o ofício do TJCE se deu em consequência da repercussão de uma audiência da vice-presidente da OAB Ceará, Christiane Leitão, e do secretário-geral adjunto, Rafael Ponte, com o juiz auxiliar da corregedoria do CNJ, Cristiano de Castro Jarreta Coelho, realizada no dia 30 de maio.

Já na quarta-feira (5), o presidente da OAB Ceará, Erinaldo Dantas, encontrou-se em Brasília com o relator do processo, ministro Guilherme Caputo Bastos. Segundo Dantas, a presença física dos magistrados nas comarcas é "o mínimo que se espera de alguém que ganha R$ 30 mil por mês e passou em um concurso público, sabendo que iria trabalhar no interior do Estado. Se o CNJ der razão aos magistrados, isso terá repercussão em todo o Brasil, criando um perigoso precedente de desrespeito às obrigações judiciais", afirmou.