Indústria cearense assustada com a ousadia das facções

A ação do crime organizado no Porto do Pecém, o crescimento da violência na Grande Fortaleza, que é um problema nacional, e a inacabável duplicação do Anel Viário são gargalos que complicam a vida do industrial

Escrito por
Egídio Serpa egidio.serpa@svm.com.br
(Atualizado às 11:09)
Legenda: Equipamentos de provedora de internet no Complexo do Pecém destruído por facções do crime organizado. Polícia tenta identificar autores.
Foto: SVM

Empresários cearenses da indústria retomaram ontem a produção de suas empresas, que se manteve desligada, com as exceções conhecidas, ao longo da recente festa da carne – o carnaval. E se depararam com gargalos insolúveis que tornam difícil e complicada a atividade econômica estadual, agora agravada por uma assustadora novidade: a ação das facções do crime organizado, que passaram a destruir – no meio da rua, a céu aberto – o aparato tecnológico das empresas provedoras de internet, sem o qual tudo se desliga.

Na semana passada, uma dessas facções danificou equipamentos da provedora de internet que conecta ao mundo o Porto do Pecém, o maior e mais importante terminal marítimo do Ceará, atingindo, também, o sistema digital operado pelos organismos dos governos federal e estadual responsáveis, ali, pela fiscalização sanitária, tributária e de segurança pública.

Esse mesmo “apagão”, praticado no coração da logística de transporte do Ceará e encarado como uma ousada atitude dos criminosos, tirou do ar as telecomunicações das empresas do Complexo Industrial e Portuário do Pecém.

“A insegurança pública é um dos gargalos que desafiam os agentes econômicos no Ceará e, de resto, em todo o país”, lamentou um industrial com gabinete de trabalho no Pecém. Ele tem razão: como produzir, na indústria ou noutro ramo da economia, sob ameaças de grupos criminosos, que agem à luz do dia e na certeza de que o aparato policial estatal não é capaz de barrar suas ações cada vez mais atrevidas?

Pela gravidade do tema, esta coluna procurou o governo do Estado, que, pela voz do secretário de sua Casa Civil, jornalista Chagas Vieira, se pronunciou nos seguintes termos:

“Essa questão da violência atinge todo o país (em alguns locais muito mais agravada) e não será impeditiva para o desenvolvimento das atividades econômicas em nosso estado. O Ceará tem crescido mais que a média do país, e os números do estado melhoram cada vez mais. O governo do Ceará tem trabalhado fortemente nesse enfrentamento ao crime, com o reforço da tropa e equipamentos e, principalmente, no setor de inteligência. Só no governo Elmano, são mais de 6 mil policiais já contratados ou em processo de contratação. O governo também tem mantido permanente contato e parcerias com o Judiciário, o MP e solicitado ao governo federal um pacto nacional contra o crime, com o envolvimento também do STF e Congresso Nacional. No caso específico do ocorrido no Pecém, os bandidos estão sendo identificados e serão presos em breve. O governo do estado atuará cada vez com mais força no combate a esses grupos.”

Mas tão importante quanto este incomum gargalo da segurança pública, sobressai-se fortemente o gargalo da carência de mão de obra qualificada para atender a indústria.

Um empresário da metalurgia disse ontem à coluna que, há quase um ano, faltam operadores de máquinas do tipo CNC (Controle Numérico Computadorizado), equipamento utilizado para controlar ferramentas e máquinas de forma automatizada por meio de comandos pré-programados por computador. Essas máquinas executam operações com precisão suíça como cortes, perfurações, usinagens e moldagens em diferentes materiais, como metal, plástico e madeira.

“Elas têm a vantagem de aumentar a produtividade, reduzir erros humanos e permitir a produção de peças complexas com alta precisão”, explica o industrial.

Há outro antigo gargalo que prejudica não só a operação da indústria, mas, também, da agropecuária, principalmente de sua fruticultura: a inacabável duplicação do IV Anel Viário de Fortaleza – rodovia importantíssima para o ir-e-vir de mercadorias que demandam os portos do Pecém e Mucuripe. Faltam, também, no mesmo Anel Viário, a duplicação do viaduto sobre a BR-116 e de suas alças de acesso, que igualmente são o caminho de matérias-primas e insumos destinados às fábricas do Distrito Industrial de Maracanaú.

“Transitar ali, nos horários de pico, é um exercício de paciência e uma injeção de prejuízo na contabilidade das empresas”, acentuou o mesmo industrial. O governador Elmano de Freitas e o secretário do Desenvolvimento Econômico, Domingos Filho, estão cientes do problema e prometem resolvê-lo com a ajuda do governo federal.

Não apenas o industrial da indústria metalúrgica, mas seus colegas do agro reclamam de outro gargalo, antigo e ainda não resolvido: as constantes quedas de tensão da rede de energia elétrica, paralisando a atividade econômica na cidade e no campo, com prejuízos pela queima de máquinas e equipamentos.

As fontes reconhecem que o problema “já foi pior” e ressaltam que, sob a direção do seu atual presidente José Nunes, a Enel Ceará investe na melhoria do serviço, por meio de novas subestações. A Fiec e a Enel criaram um grupo de trabalho por meio do qual vêm minimizando a ocorrência desses eventos.

Todavia, há mais um novo gargalo no rol de reclamações do empresariado. Um empresário da indústria de alimentos pede a palavra para expor o seguinte:

“Colegas meus com fábricas em bairros de Fortaleza têm sofrido pressão para mudar de endereço. Algumas dessas unidades industriais implantaram-se muito antes da chegada das moradias nessas áreas suburbanas de Fortaleza. Entendo que a PMF deve levar em conta – ao analisar os aspectos sociais, econômicos e ambientais para a renovação do alvará de funcionamento da fábrica – a questão da longevidade de sua presença na área, que antecedeu ao crescimento urbano. Temos de levar em conta que é complicado transferir uma indústria de um bairro para o outro, assim como é muito mais difícil mudá-la de um lugar densamente povoado para uma área do Distrito Industrial. Este é outro gargalo que dificulta a atividade empresarial aqui.”

Bem, está começando o tempo da Quaresma – são 40 dias para a reflexão, o jejum e abstinência, como ensina a Igreja Católica – que deve ser aproveitado para orações a Deus no sentido de que ilumine os governantes na adoção das melhores soluções para os grandes problemas que afetam a economia estadual.

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