Hidrogênio Verde: Fortescue reafirma que fará seu projeto no Pecém

Empresa desenvolve instalação integrada de H2V e amônia capaz de produzir 175 mil toneladas de hidrogênio por ano (equivalente a 0,9 milhão de toneladas de amônia), com investimento de R$ 20 bilhões.

Escrito por
Egídio Serpa egidio.serpa@svm.com.br
(Atualizado às 05:56)
Legenda: Foto da planta de H2V da EDP no Complexo do Pecém, onde a Fortescue implantará uma grande planta para produzir hidrogênio verde
Foto: EDP / Divulgação

Em nota transmitida ontem, segunda-feira, 27, a esta coluna, a australiana Fortescue – primeira empresa a celebrar Memorando de Entendimento com o Governo do Ceará para implantar uma unidade industrial de produção de Hidrogênio Verde no Complexo do Pecém – reafirma seu compromisso com a implementação do empreendimento.  A nota acrescenta:

“A empresa australiana está desenvolvendo uma instalação integrada de hidrogênio verde e amônia no local, capaz de produzir 175 mil toneladas de hidrogênio por ano (equivalente a 0,9 milhão de toneladas de amônia), com investimento total de cerca de R$ 20 bilhões. Uma vez em operação, cada tonelada de hidrogênio verde produzida evitará uma emissão de aproximadamente 12 toneladas de CO2.

“Hoje, o projeto encontra-se na etapa de viabilidade e a companhia ressalta que não houve nenhuma alteração no planejamento. Pelo contrário, nas próximas semanas, os principais executivos da empresa na América Latina farão uma visita às localidades que receberão o complexo industrial, como parte do cronograma de trabalho.”

A nota de posicionamento da Fortescue acentua:

“Vale relembrar que, em outubro, o governo brasileiro selecionou a planta da companhia para Plataforma de Investimentos em Transformação Climática e Ecológica do Brasil (BIP), que vai conectar empreendimentos relacionados à transição energética com fontes de financiamento. No mesmo mês, o Conselho Nacional das Zonas de Processamento de Exportação (CZPE) aprovou o projeto da Fortescue no Setor 2 da Zona de Processamento de Exportação (ZPE) do Complexo do Pecém.

“Sobre a questão do custo do H2V brasileiro, é importante reforçar que a produção de hidrogênio verde se trata de uma tecnologia nova e, portanto, carece de investimentos para que tenha escala e, consequentemente, redução gradual da curva de aprendizagem e custos.

“E lembremos que essa não é uma particularidade do H2V. Para que indústrias consolidadas como eólica, solar, álcool e até petróleo pudessem se desenvolver e serem competitivas, foi necessário implementar programas de incentivo e investimentos ao longo de décadas. A boa notícia é que em lugares com energia renovável de alta qualidade, como no Brasil, estudos internacionais projetam que o H2V chegará ao mesmo preço do hidrogênio de origem fóssil (cinza) já em 2030.

“O projeto da Fortescue no Brasil é estruturante e contribuirá para a neoindustrialização verde não só no país, como no mundo”, conclui a nota da empresa australiana.

O posicionamento da Fortescue veio por causa do que esta coluna publicou ontem, salientando a opinião do CEO da empresa, Mark Hutchinson, e do seu Chairman Global, Andrew Forrest, que é, digamos assim, o dono da companhiao. Ambos falaram no âmbito do Fórum Econômico de Davos, na Suíça.

O primeiro pôs em dúvida a viabilidade dos projetos de produção de hidrogênio verde no Brasil, que deverão atrasar por força dos altos custo de produção. Forrest, por sua vez – ao lado de grandes líderes, incluindo Al Gore, ex-vice-presidente dos Estados Unidos; Karen Fang; John Kerry, ex-secretário de Estado norte-americano; Tzeporah Berman, Jaime de Bourbon de Parme e Laurence Tubiana – fez um apelo aos líderes econômicos globais para identificar caminhos práticos para a rápida descarbonização do planeta, ressaltando que eliminar as emissões é um negócio inteligente, além de ser o caminho certo para um crescimento econômico mais forte.

Referindo-se à atuação da Fortescue no seu país de origem, no qual tem sua sede, Andrew Forrest anunciou que “o objetivo ambicioso de zerar as emissões será alcançado sem depender de compensações de carbono ou tecnologias de captura e armazenamento e representará um investimento de US$ 6,5 bilhões para descarbonizar totalmente nossas atividades na Austrália”.

Durante o dia de ontem, a coluna recebeu vários comentários de leitores – empresários e executivos a maioria – que emitiram distintas opiniões. Um desses leitores encaminhou o artigo que, em 2023, logo após o anúncio da instalação do Hub do Hidrogênio Verde no Pecém, escreveu e publicou Marcos Holanda, ex-presidente do BNB, PHD em Economia, professor Titular da UFC e fundador do Ipece.

Nesse artigo, Holanda foi objetivo – escreveu um texto que parece tão atualizado hoje quanto há dois anos. Ele disse:

“No ciclo de produção, transporte e geração de cada 100 unidades de energia renovável utilizada na produção do hidrogênio somente 30 chegam ao consumidor final. Esse parâmetro de ineficiência energética torna seu custo proibitivo. Equivale, por exemplo, a um barril de petróleo custando, no mínimo, US$ 250.

“No mercado, fala-se que usar hidrogênio verde é como queimar bolsas Louis Vuitton para obter energia. A preços de hoje o kg do hidrogênio verde custa entre US$ 6 e US$ 10, enquanto o do hidrogênio azul (produzido a partir de gás natural) custa US$ 2. Quem vai demandar a mesma matéria prima custando até 5 vezes mais? O agricultor vai aceitar comprar fertilizante de amônia verde custando cinco vezes mais que a amônia azul?

“Só existe uma maneira de gerar demanda: elevadíssimos subsídios do governo. Mesmo com os subsídios que hoje são ofertados, dois terços dos projetos anunciados no mundo até 2030 não têm demanda (de uma produção de 14 milhões de toneladas anunciadas só existe demanda para 4,3 milhões). Notícia no site Hydrogeninsight mostra que existem hoje no mundo mais de 680 projetos de hidrogênio limpo de potência superior a 1MW, com investimentos programados de US$ 240 bilhões até 2030. No entanto apenas US$ 22 bilhões desse total estão em estágio de decisão final e identificação de fontes de financiamento.”

Holanda acrescenta algo muito interessante:

“Por que então tantos memorandos de investimentos estão sendo assinados no Ceará? O custo de assinar um memorando é zero, há a procura por garantir incentivos ficais, dinheiro barato do BNB, pesado lobby da indústria de infraestrutura de óleo e gás e ‘Greenwashing’ que é o uso do hidrogênio verde para garantir o mercado de hidrogênio azul e cinza.”

Neste momento, esta coluna observa uma expectativa crescente em relação ao futuro do H2V, principalmente depois que o presidente Donald Trump anunciou desprezo às energias renováveis e lançou foco na perfuração de novos poços de petróleo, alegrando a indústria petrolífera dos EUA, que financiou sua campanha.

Mas esta coluna – agora diante da nota esclarecedora e comprometida da Fortescue com seu anunciado e confirmado empreendimento no Complexo do Pecém – renova a esperança de que produzir hidrogênio verde no Ceará será um investimento de retorno garantido. Esta esperança é a mesma do governador Elmano de Freitas, do presidente da Fiec, Ricardo Cavalcante, e do universo acadêmico cearense.

Afinal, todos desejamos o desenvolvimento econômico e social do Ceará.

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